Mostrar mensagens com a etiqueta gato. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta gato. Mostrar todas as mensagens

sábado, 24 de agosto de 2019

Seis Anos com Thomas




Seis anos. 

Seis deliciosos anos, com ele participando da minha vida.

Quando ele veio e estacionou na minha sala, naquele dia 24 de Agosto, eu não pensei que aquela criatura tão assustada e tão assombrada pelo stress, causado por maus tratos, fosse adaptar-se dentro da minha vida como o fez. 

A primeira mudança que nós dois fizemos, foi usar um nome mais decente que o que ele tinha, e com o qual adaptou-se bem e aprendeu a responder, quando eu chamo ou converso com ele.

Hoje eu sei que fiz a escolha certa, quando o adoptei e que ele parece feliz, bem adaptado, mais tranquilo e mais saudável. 

Claro que ele é um gato bastante mimado, com suas muitas manias, suas maneiras estabanadas de correr pela casa, de pedir as coisas, de saltar sobre o sofá, para espiar pela janela, ou de dar aqueles miados muito baixinhos, quase tímidos, para chamar a minha atenção. 

Aqueles olhos muito verdes parecem faróis. Na verdade, são dois verdadeiros faróis, que me iluminam os dias. Chegar à casa e vê-lo à porta, deitar-se no tapete, completamente à vontade e esperar por chamegos e carícias, é uma grande alegria, depois de um dia cheio. É como se todos os problemas do mundo acabassem ali, na simplicidade terna daquele momento.

Eu poderia usar muitas centenas de palavras para falar sobre ele, mas resolvi somente fazer este pequeno texto, para celebrar esta data. 

Longa vida, Thomas! Que continues a me fazer assim feliz, por muito tempo ainda!

domingo, 3 de abril de 2016

Cantigas de Roda… (Parte 1)



Que olhos lindos

Que olhos lindos tem a Rosa

Que ainda hoje

Ainda hoje eu reparei

Se eu reparasse,

Se eu reparasse há mais tempo

Eu não amava,

Eu não amava quem amei…



As crianças brincavam de mãos dadas, formando um círculo, que movia-se em sentido horário. Eu observava, de longe, os movimentos, a cantiga, as risadas e a folia imensa e ingénua que elas faziam. A menina Rosa, uma loirinha de cabelos cacheados, tinha as faces afogueadas, tanto por uma certa porção de timidez, quanto pelo calor que fazia, naquela manhã de verão. O pátio, diferentemente do que eu havia idealizado e concebido no projeto original, era rodeado de grandes árvores, cujas amplas e frondosas copas delineavam desenhos abstratos de luz e sombra, no chão coberto com uma espessa camada de areia fina e solta. O propósito, naturalmente, era ser, o mais possível, à prova de machucados nas crianças… à toda prova de crianças, para bem dizer a verdade. Reconheci que o resultado ficou muito melhor que eu imaginara, quando o projetei. Da minha janela, via-se, claramente, as atividades no grande pátio.

As professoras acompanhavam, com olhos atentos, os movimentos de todos, sempre prontas a correr, se necessário fosse, para resolver alguma disputa ou socorrer alguma emergência. Pensei que haviam criado um bom clima naqueles miúdos, que não pareciam carregar nenhum preconceito quanto à brincadeira de roda. Naquela idade era mais fácil controlarem ou contornarem os preconceitos que vão-se formando com o tempo, por influência da sociedade ou das famílias. Aquela brincadeira de meninos e meninas, sem tempo ou possibilidade de levantar suspeições machistas ou feministas agradava-me de todo. 

Eu sentia orgulho daquilo que havíamos conseguido na escola. Não éramos nada especiais, apenas tentávamos ser o mais livres de preconceitos que pudéssemos, para criar crianças saudáveis e ilimitadas em criatividade. O colégio seguia uma linha experimental de educação, onde a liberdade de expressão era estimulada ao limite. 

As aulas, no verão e com bom tempo, eram dadas ao ar livre, em baixo das árvores, assim como as refeições, que eram partilhadas igualmente e com a participação de todos, tanto na organização quanto na distribuição e posterior limpeza do local. A ideia havia sido inspirada em um modelo japonês e até então não havíamos tido quaisquer problemas ou restrições dos pais ou das crianças. Nenhuma forma de expressão era retida, desde que fosse para criação e o progresso de uma mentalidade avançada em termos sociais e artísticos. O respeito e aceitação que as crianças sentiam pelos colegas e pelos mestres era destacável e evidente. 


Salada, saladinha bem temperadinha

Com sal, pimenta

Vinagre e etc.


No terreno atrás do prédio principal da escola tínhamos algumas árvores frutíferas plantadas. Além das nossas atividades normais, estimulávamos o contato com a natureza, através do cultivo de uma pequena horta, que servia de fornecedor para parte das refeições das crianças, com alguns legumes e vegetais para saladas, a maioria de fácil lavoura e que cobriam uma boa parte dos custos que poderiam haver, se não as tivéssemos. Ainda criávamos algumas galinhas, que nos forneciam ovos e das quais também aproveitávamos o estrume, para adubar a terra. 

Também estimulávamos o contato com os animais, especialmente os de estimação, que promoviam um clima de carinho, respeito e segurança, livrando as crianças de medos infundados e dando-lhes maior confiança. Em conjunto com uma entidade que recolhia animais de rua e uma clínica veterinária, acolhíamos os animaizinhos e promovíamos a reintegração dos mesmos em lares permanentes. Os animais adultos eram mais difíceis de ser recolocados, mas aquilo não nos constituía problema, pois a escola mantinha-os abrigados e com boa saúde. Eles acabavam por fazer parte do sistema e da educação das crianças. 

Um deles, Ginger, um gato ruivo de idade avançada, que estava sempre por perto, como se vigiasse e assegurasse que tudo estivesse bem no ambiente, vivia connosco desde sempre. As crianças aprenderam a lidar com ele e com seu comportamento, observando e interpretando, com acuidade, os sinais que enviava. Ginger era sociável e calmo, sendo respeitado e acarinhado como parte da classe, que ele tomava como sua propriedade e território. 

Eu estava contente e satisfeito com o sucesso que vínhamos conseguindo com aquele grupo de crianças. Éramos vistos como projeto piloto de escola e de sistema de educação. Apesar de não estarmos localizados em uma área essencialmente urbana, sobretudo pela necessidade de espaço na propriedade, para nossos projetos paralelos, tínhamos alunos de várias localidades da região, com idades entre 3 e 8 anos. 

Fora da escola ainda fazíamos excursões programadas às galerias de arte e museus, sempre que haviam exposições que valessem a pena e, ainda, à Biblioteca Pública Municipal. 

Em época próxima do verão, com bom tempo, levávamos os pequenos à uma praia que havia muito próxima e que era demarcada por rochedos em ambos os lados. Era uma área muito particular e por ter os limites muito bem delineados, era-nos fácil controlar os movimentos de todos. Nestas curtas excursões, era permitido levar os animaizinhos para brincar com as crianças. Ginger era um passageiro frequente e estava sempre por perto das crianças, que o respeitavam e traziam-lhe brinquedos e comida. O atento felino recebia de bom grado aqueles presentes e participava, como podia, dos folguedos.


Caranguejo não é peixe, 

Caranguejo peixe é; 

Caranguejo só é peixe 

Na enchente da maré. 

Ora, palma, palma, palma 

Ora, pé, pé, pé 

Ora, roda, roda, roda, 

Caranguejo peixe é…


Eu estava sentado na areia a observar o grupo de miúdos, que brincava de roda e divertia-se a jogar-se na areia fofa e branca, quando a cantiga terminava. As gargalhadas soltas e espontâneas faziam-me rir, satisfeito, do que havia conquistado com eles. 

Um pequeno caranguejo-branco-da-areia saiu de uma toca e veio na direção de um dos menores, que ficou a olhar o bichinho mover-se, naquele caminhar engraçado. Os olhos estirados para fora do corpo movimentavam-se com atenção e com curiosidade menor que a daquelas crianças. Ginger levantou-se e veio para a beira deles. Se foi por curiosidade ou por instinto protetor, eu não consegui distinguir, mas fiquei impressionado pela forma com que ele parecia mostrar-se presente e disposto. Era mesmo uma figura de suporte à segurança dos nossos alunos. O caranguejo levantou as pinças, como a defender-se do gato, que deu um passo atrás, depois levantou a pata e deu um toque no bichinho, que recuou e voltou a esconder-se na toca de onde havia saído. Ginger ainda foi até a beira do estreito buraco, para certificar-se que o crustáceo não ia mais sair e ali manteve atento plantão por um bom tempo. 

As crianças riram-se e aplaudiram o salvador, que se sentiu o verdadeiro dono da praia. 


- Ele é esperto!

- Pois é!


Eu voltei-me para conversar com quem eu pensei ser uma das professoras ou uma das auxiliares, mas, ao virar-me, fui pego de surpresa. Não era nem uma nem outra. Eu pensei, quase em alta voz:


- Mas o que esta mulher está fazendo aqui?


Minha cabeça deu uma reviravolta. Não podia ser…


domingo, 24 de janeiro de 2016

Café da Manhã e Brincadeiras


Hey.

Brinca comigo… Eu sei que fiz bagunça no quarto de trás, quando derrubei o ferro de passar roupa, mas eu não fiz por mal. Eu só queria saber o que estava por trás da caixa. Foi um acidente. Eu também levei um susto. Aquilo faz muito barulho quando cai…

Hoje, quando já passava das sete da manhã, pelo menos uns trinta segundos e a luz do dia já entrava pela janela, fiquei preocupado. Por que ainda estavas deitado? Pensei que era dia de trabalho e havia algo errado. Também estava na minha hora e eu tinha fome. Até resolvi dar-te uma cutucada, para ver se reagias. O relógio havia despertado havia bastante tempo e parecia que tinhas, simplesmente, ignorado. Pensei que podias estar doente. Mas, não. Foi só quando sorriste, depois que cheirei teu rosto, que eu fiquei mais aliviado. Eu ia voltar a insistir, mas tu resmungaste um pouco e levantaste em seguida. Eu até pensei:

E vamos nós! Hora do café! Iupi! Já não aguentava mais…

Às vezes eu penso que te esqueces… ou distrais-te… das coisas importantes. Se não sou eu, aqui, nesta casa, a lembrar os horários da comida, a hora de deitar, de brincar, de limpar a caixa de areia, até parece que tu deixas as coisas passarem. Isso não pode ser! É muita responsabilidade para mim…

Ouvi-te dizer que hoje é feriado, seja lá o que isso signifique. Pelo jeito vamos, os dois, ficar em casa e eu vou aproveitar da presença e dos mimos. Tomara que seja um dia de sol, para poder deitar-me lá fora, um pouco. Os invernos são chatos, quando não faz um pouquinho de sol, para estirar-me preguiçosamente e aquecer-me na varanda, ou na janela, pelo lado de dentro. Um calorzinho sempre é bom.

Se não tiver sol, em compensação, vou deitar-me em baixo do edredão, como faço à noite, encostadinho na tua barriga, ou na almofada da cadeira, atrás de ti… É tão agradável e tão quentinho… principalmente se colocares aquela música suave para ouvirmos. A música ajuda-me a relaxar.

Mas antes disso, vou brincar até cansar. Afinal, estou sentindo muito vigor e preciso gastar um pouco disto. Acumulei muita energia nas dezasseis horas que dormi ontem.

Eu sou um gato de casa, agora, por sorte e estou bem protegido e salvo dos perigos que já passei lá fora, antes de ser resgatado, medicado e adotado, mas preciso de atenção e brincadeiras…. Algum exercício físico também é bom…

Eu trouxe a bolinha, para jogarmos… só não vou prometer que vou ser discreto ao correr pelo assoalho. O meu peso não pode ser disfarçado facilmente, quando corro pelo piso de madeira…

Ah, eu não gosto quando dizes que eu pareço um cavalinho a correr pela casa. Não é nada bonito rir de mim, só porque estou um pouco gordito! Não é culpa minha… somente…

Opa! Acho que vou adiar a brincadeira. Ouvi um som muito agradável na cozinha. Meu pratinho fez o som característico, quando foi colocado na pia. É um ótimo sinal.

Adoro meu iogurte, de manhã. À noite, prefiro o peixinho, obviamente. Afinal é a janta…. E janta é sempre uma refeição importante…

É… a brincadeira fica para depois… Agora vamos tratar de manter este meu corpinho bem alimentado…

Mas não esqueci que hoje é dia para brincar bastante... e eu vou cobrar!

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Um Animal de Sorte



Eu, decididamente, não gosto de viajar de carro. Não gosto de ficar preso dentro de uma caixa de transporte, mesmo que seja por uns poucos instantes e para minha própria segurança. Sei que é necessário e, provavelmente, ainda não acharam uma forma melhor, mas eu, simplesmente, abomino aquelas experiências.

No dia em que eu fui transportado para fora da casa de onde estava, temporariamente, depois de haver sido recolhido da rua, não foi diferente. Apesar de tudo, eu não queria deixar a casa de minhas madrinhas. Não tinha a mínima ideia do que iria acontecer e não estava nada voltado para uma nova mudança. Já tinha passado por uns maus bocados e não estava com intenção de passar outros. Meus passeios anteriores não haviam sido marcantes pela positiva.

Quando levaram-me para dentro e abriram a pequena caixa de transporte, ele estava inquieto e apreensivo, apesar de nos haver recebido com um sorriso no rosto. Talvez até estivesse mais receoso que eu… não sei direito. A minha madrinha colocou a caixa sobre um tapete que havia no hall de entrada do apartamento.

Ele sentou-se no chão e eu percebi que estava bastante tenso… ou talvez fosse uma demonstração de cuidado excessivo. Quando vi-me livre, olhei à minha volta e esperei uns segundos. Ele esperou também. Não invadiu meu espaço, o que pareceu-me uma boa estratégia. Aquele sinal de respeito indicou que minha sorte estava por mudar. Antes, eu estava assustado e desconfiado, mas senti-me abrigado e seguro, perto daquele homem desconhecido, cujos olhos tinham uma tristeza tocante e pareciam carregados de dor. Naquele momento, senti o impulso de aproximar-me dele e deixá-lo saber que eu apreciei sua consideração. Dei um passo adiante e inclinei meu corpo para perto dele, que levantou a mão e tocou-me a cabeça, com muito cuidado. Eu retribuí com uma leve turra.

Lembro que ouvi a madrinha perguntar à colega: o que foi que aconteceu aqui? Ele riu e disse: não sei, mas pareceu-me um bom sinal...

Eles trocaram informações sobre meu estado de saúde e as indicações médicas. Eu estava a curar uma infeção urinária, decorrente do stress que tive, no meu primeiro lar. Ele disse que achava esquisito o nome que me deram. Eu também, mas não tinha como dizer-lhes. Mas foi graças ao tal nome esquisito que ele teve ciência da minha história e resolveu conhecer-me.

Quando elas saíram e a porta foi fechada, deixando-nos a sós, o meu novo lar temporário pareceu-me um imenso campo a ser explorado… nas minúcias. Já sabia onde ficava minha comida e água e também a caixa de areia, portanto o básico estava sob controlo. Fui-me habituando, aos poucos, tanto ao lugar, quanto ao homem que cuidava de mim, inicialmente como FAT… uma família de uma pessoa só.

Duas semanas depois ele disse que havia decidido adotar-me. Eu já desconfiava, pela maneira que havia-se apegado e como parecia contente com minha presença na sua rotina de vida. Levaram-me, ele e minha madrinha, ao veterinário, para avaliar o estado da minha saúde. Eu estava bem. Ainda assustava-me com muitas coisas e ruídos desconhecidos, mas estava a adaptar-me bem ao meu novo lar, graças à paciência dele.

Burocracias ultrapassadas e compromissos assumidos, um novo nome foi-me escolhido, por ele, para combinar com minha nova vida. O passado tinha que, definitivamente, ficar para trás, junto com meu antigo nome e a dor eu já havia sofrido. Ele passou a chamar-me Thomas. Um novo nome, um novo lar e uma nova vida. Não sei porque, mas às vezes chama-me de “tigre”, além de muitos outros estranhos e carinhosos cognomes. Não acho que sejam os nomes ou as alcunhas que me fazem o que eu sou. Aliás, meu nome oficial é bonito e caiu-me muito bem.

Dois anos já decorreram desde o dia em que entrei por aquela porta. Engraçado como o tempo passa rápido, quando está-se bem. Agora eu ando livre pela nossa casa, conheço as rotinas e os horários e sei quando ele chega, de volta do trabalho, pelo som de seus passos nas escadas e corredor. Eu corro para a porta e fico à espera do barulhinho da chave na fechadura, para dizer-lhe olá, assim que entra. Ele chama-me de “meu menino”, faz festinhas e conversa comigo, como se eu fosse uma criança, perguntando-me se estou bem, se tenho fome e se quero um carinho.

Nós não recebemos muitas visitas. O tocar da campainha da porta ainda causa-me uma certa desconfiança. A mulher da limpeza reclamou que eu era muito arisco, mas eu tinha que certificar-me que ela estava livre de qualquer suspeita, antes de deixá-la aproximar-se. No dia em que ele chegou mais cedo e que trouxe-me, ao colo, para perto dela, percebi que, afinal, a mulher não ia fazer-me mal.

Melhor assim… para o bem dela…

Gostei da reviravolta que minha vida deu. Gosto da tranquilidade que ele me proporciona e do cuidado que demonstra para comigo. Ele cuida bem de mim e faz de tudo para proteger-me. Tenho mimos, conforto, comida e água, a caixa de areia sempre limpa e, ainda, companhia e segurança. Não preciso muito mais que isso, afinal.

Ele não perde a paciência comigo, nem quando eu apronto alguma. Na verdade, ele acha engraçado que eu arranje, da minha maneira, um lugar para ficar em cima do roupeiro, derrubando as incómodas caixas que lá foram deixadas. Eu sou um bichano grande e preciso de espaço… e gosto de lugares altos e quietos…

Ele sempre diz que eu sou muito amado e eu sei o que isso significa. Basta reparar no jeito que me trata e a forma como me olha. Não tenho quaisquer dúvidas em relação ao sentido daquelas palavras, ditas com tamanha afeição. É fácil compreender as intenções explícitas por elas. É bom saber que sou amado. Dá-me uma sensação boa saber que eu faço parte da vida dele e que ele faz da minha.

Ouvi uma conversa, dia desses, quando um amigo disse a ele que eu era um gatinho de sorte. Apesar de ele ter dito que eu já sofri o suficiente na minha vida e que mereço um pouco de paz e tranquilidade, reconheço que muitos animais não têm a mesma sorte que eu. Alguns continuam a sofrer maus tratos e acabam por ter uma vida infeliz, sujeita a muitos perigos e, consequentemente, com baixas expectativas de vida longa. Eu, pelo menos, estou seguro e sou bem tratado e respeitado, o que é uma coisa que nem todos conseguem ser.

Sim. Eu sou, mesmo, um gato de sorte!

Sinto que, às vezes, a rotina dele precisa de um pouco de ação… e eu, claro, faço questão de proporcionar-lhe alguma.

Vou lá dentro, agora, fazer minha cara de santo e inocente para ele. Acabo de ouvi-lo chamar meu nome e perguntar quem foi que bagunçou o armário e derrubou as t-shirts no chão do quarto...

…Não sei porque fazer qualquer drama. Nem foi no chão… Foi no tapete!

sábado, 6 de setembro de 2014

Bem Mais Que 365


A minha história com Thomas começou há pouco mais de um ano atrás. 

Ele havia sido uma das vítimas de um infortunado destino, daqueles que são enganados facilmente pela aparência das coisas. Se bem percebi a situação, ele havia sido oferecido como presente à alguma criança, quando ainda era pequenino, mas ao crescer, naturalmente, deixou de ter o mesmo aspecto engraçadinho e brincalhão que os gatinhos pequenos têm. Como deixou de ser interessante, por haver mudado, como tudo e todos, o pobre bichinho foi maltratado, adoeceu, chegou a desenvolver uma infecção urinária, provavelmente causada pela situação de stress a que esteve exposto e foi, finalmente, abandonado pela família que o tinha. 

Talvez tudo o que ele pudesse ter desejado, fosse ser amado e respeitado, mas tal fato não aconteceu. Teve azar, como tantos outros animaizinhos que são maltratados e/ou abandonados... o que não é incomum, especialmente nesta terra.

Sua situação havia sido, enfim, reportada e ele recolhido da rua, pelas voluntárias da ‘Bichanos do Porto’, para ser oferecido para adoção, em caráter de urgência. Três meses haviam-se passado, desde então. Neste tempo, ele havia sido devidamente tratado da infecção e vencido aquela batalha. Parecia estar bem.

Meu Tiger partiu desta vida no auge do verão do ano de 2013. Eu tinha o coração bastante entristecido pela dor e pelo vazio causado por aquela perda. Sabia que precisava de tempo para aplacar o pesar que minha alma sofria, mas o destino, por vezes, é bastante brincalhão e atropela minhas decisões, de maneiras que eu não compreendo totalmente… pelo menos no início.

Não foi exatamente por acaso que eu vi aqueles seus olhos verdes, tão tristes e assustadiços, numa foto no blog da ‘Bichanos do Porto’. Por alguma razão estranha, eu senti meu coração comover-se pronta e especificamente por aquela criaturinha.

Racionalmente eu acreditava qua ainda era muito cedo para ter outro companheiro de quatro patas mas, emocionalmente, eu sabia que estava apenas sendo teimoso ou, mesmo, desnecessariamente cuidadoso. Pensei, seriamente, por uns dias e decidi que era hora de assumir uma postura radical em relação àquela infeliz condição a que ele estava submetido. Em menos de uma semana, após uns poucos contactos com a pessoa que estava responsável pelo bichinho, ficou acertado que eu iria conhecê-lo pessoalmente e, talvez, servir de família de acolhimento temporário – uma operação paliativa, criada para ajudar as pessoas e as associações que fazem este trabalho, voluntariamente.

Ele chegou numa caixa de transporte flexível e estava bastante assustado e tenso pela viagem. Pelo jeito, não gostava nada de passear de carro.

Quando saiu da caixa e ficou mais à vontade no hall de entrada do meu apartamento, eu vi que ele estava muito bem tratado e demonstrava uma confiança incomum ao ingressar no novo ambiente. Tinha um porte bastante robusto e sua pelagem apresentava um brilho saudável, apesar do que havia passado.

Eu deixei-o avaliar-me e perceber, sozinho, que era bem-vindo ao seu novo lar e à minha vida. Ele, então, aproximou-se, inclinando-se para que eu o tocasse. Fiquei feliz em ver que ele me aprovava e dava uma demonstração enorme de confiança, especialmente para uma pessoa com a qual entrava em contato pela primeira vez.

Formou-se, naquele momento, uma conexão única entre nós e eu soube que jamais o deixaria sair de perto de mim, se dependesse da minha vontade. Aquele primeiro contacto transformou-se numa ligação cada vez mais forte entre nós, dois seres tão diferentes um do outro, mas com necessidades tão similares. Éramos como duas almas solitárias, um servindo de apoio ao outro, para tentar amenizar a carência de companhia e, talvez, também de afeto. O que era para ser um lar de acolhimento temporário nunca assim o foi.

Mas ainda havia uma componente muito grande de medo a assombrar-lhe e esta era mais forte que qualquer outro sentimento. Ele ainda demonstrava ser um gato assustadiço e inseguro, que havia perdido aquela tranquilidade que seria de se esperar de um ser nascido e criado em ambiente doméstico. Muitas vezes reagia de maneira incomum ao ouvir-me sacudir sacos plásticos, ou usar o ‘spray’ de água para molhar as plantas, ou até mesmo quando ouvia crianças a falar no corredor do prédio. Estas e outras coisas deixavam-no em estado de alerta, pronto a correr e esconder-se, se necessário fosse. Eu não compreendia suas razões, mas aceitava que tinha de ser paciente e dar-lhe tempo para ambientar-se e ganhar confiança, para poder viver serenamente no seu novo território.

Por isso mesmo, aquela demonstração de confiança que deu, ao conhecer-me, foi surpreendente e inesperada. Talvez houvesse sentido, no ar, que estava mais bem protegido, de alguma forma, ali naquele novo meio, com aquele novo amigo de coração tão mole, que tinha os olhos cheios de lágrimas, cada vez que pensava no que aquele pobre ser poderia haver passado até ali.

Eu prometi-lhe, secretamente, que faria de tudo ao meu alcance para que jamais voltasse a sofrer ou sentir qualquer tipo de insegurança ou medo novamente. Não fosse o seu azar com os seus primeiros donos, eu não teria a sorte de comover-me com sua triste e trágica situação anterior e de trazê-lo para viver comigo, modificando, assim, a sua... e também a minha... história a partir do primeiro instante em que nos conhecemos.

Até o presente momento, tenho cumprido minha parte daquele secreto pacto de amor e tenho certeza que ele reconhece meu esforço, pela forma como dá demonstrações de confiança, de afeição e de respeito pelo meu espaço, assim como eu tenho pelo dele. Hoje, sinto que o conforto que sente e a amizade que demonstra são evidências claras que está, definitivamente, sentindo-se perfeitamente ambientado na casa que é, agora, também, sua. Dou-lhe atenção, carinho, companhia e espaço para sentir-se seguro e nunca mais pensar que sua história precisa de um outro final, de alguma forma, mais feliz, como se espera em contos de fadas ou em grandes romances.

Nossa convivência tem, agora, um ano e uns poucos dias. Com certeza, terá bem mais que isso, no que depender de mim. Eu assumi, secretamente, para meu coração e, para ele, em voz alta, que faria tudo ao meu alcance para que tivesse uma vida digna, confortável e tão longa e saudável quanto possível. 

Ele, entretanto, não precisa prometer-me nada. Já dá-me mais do que preciso. Tê-lo presente em minha vida é muito mais que eu podia esperar. E que não se pense que ele ‘é só um gato’. Somente quem nunca teve um animal de estimação pode achar que ‘é só um gato’. Ele é uma parte bastante importante da minha vida. A confiança que tem manifestado, ao longo do tempo, dá-me boa convicção de que eu tomei a decisão certa ao adotá-lo. Claro que tenho cuidado excessivo em relação ao seu bem-estar, às suas necessidades e também ao tempo que ele necessita, tanto para ficar só, quanto para conviver, especialmente nos fins-de-semana e quando chego em casa, após o trabalho.

Thomas é um gato de constituição bastante forte, com o dorso de pelagem malhada de cinza e preto e a parte de baixo, bem como as patas, de um branco muito puro. Aqueles seus olhos verdes estão sempre atentos a tudo que se passa à sua volta.

É um animal muito bonito, brincalhão, carinhoso e superinteligente. Aprende as coisas com rapidez e percebe facilmente o ambiente à sua volta. Sua confiança nas pessoas, porém, está mais ligada a mim, que a qualquer outro fator. Ele só a demonstra, se perceber a minha aprovação. Exemplo disso foi com a empregada, que faz a limpeza no apartamento onde vivemos. Como ela não foi “apresentada” a ele, por mim, cada vez que entrava no apartamento, o bichano corria e escondia-se por trás da cortina do quarto, para não ser perturbado. Ele não se deixava tocar por ela, de maneira alguma, por isso era considerado muito desconfiado e arisco, o que não deixava de ser a mais pura verdade. Somente no dia em que cheguei cedo à casa e a empregada ainda lá estava, foi que ele chegou perto e deixou-se tocar, não sem antes ter a certeza que eu conversava amigavelmente com a mulher.

Posso afirmar, com toda certeza, que a evolução no relacionamento que tivemos, dentro destes mais de 365 dias, é manifesta e salta aos olhos. Ele reconhece muito bem as minhas palavras e as intenções por trás delas. Coisas como: ‘Vamos comer?’; ‘Venha cá’; ‘Vem comigo’; ‘Senta’; ‘Bom dia’; ‘Dá-me um cheiro’; são todas bem compreendidas e geram uma ação, de sua parte.

Thomas mia muito raramente e, quando o faz, é baixinho, quase imperceptivelmente. Seu ronronar também é discreto e quando quer atenção, ele torna-se insistente e bastante carinhoso, como quem dá algo, mas que quer também uma justa parcela em troca. Hoje está muito mais tranquilo, dentro do ambiente familiar em que está inserido. Não se assusta facilmente, nem se comporta de maneira mais estranha que qualquer outro felino. Está confortável. Tem seus gostos e suas preferências. Gosta de ouvir música comigo. Gosta de comer quando estou na cozinha, fazendo-me companhia. É também meu ‘controller’. Quando passa das onze da noite, hora oficial de dormir, ele vem até onde estou e fica a rodear, até que eu desligue a TV ou o computador, apague as luzes e vá deitar-me. Na maioria das vezes, segue-me e aninha-se aos meus pés, especialmente se a temperatura estiver mais fresca.

Neste momento está a brincar com uma das 19 bolinhas de papel alumínio amassado que gosta de esconder em baixo do sofá da sala. Sim, eu contei, enquanto as resgatava. Em pouco tempo todas elas lá estarão de volta e ele virá pedir-me para levantar o móvel e retirá-las novamente, para o processo, então, repetir-se, até ele cansar-se… ou não.

Minha vida é mais tranquila porque ele faz parte dela. Eu o observo com muito cuidado e atenção e copio alguns de seus comportamentos também. Tenho tido mais estabilidade e equilíbrio, aprendi a melhorar minha postura, a fazer alongamento, a espreguiçar-me, a ser mais carinhoso e a olhar sempre por onde ando, para não esbarrar, inadvertidamente, nele…

Também aprendi a reservar um tempo  para dar-lhe atenção total. Suas exigências são muito poucas e muito simples. Posso muito bem diminuir o ritmo frenético que sempre estou, para dar-lhe carinho, conversar com ele, ficar à varanda ao seu lado, olhando as pessoas passarem, ou, então, sentado no tapete da sala, a coçar-lhe o queixo, alisar-lhe o pelo, acariciar-lhe atrás das orelhas… Estes pequenos gestos não me custam nada e a satisfação que recebo, em troca, é impagável.

Ele ensina-me que, por vezes, é importante parar um pouco e simplesmente ouvir música, brincar por uns instantes ou relaxar despreocupadamente.  E que a vida passe por nós, sem que sintamos qualquer coisa que não seja o prazer simples da companhia um do outro, por uns breves momentos.


Thomas tornou-se, neste pouco mais de um ano, um companheiro excepcional e um grande suporte para mim. Já não sei ver a vida longe dele. Estou sinceramente apaixonado pelo meu pequeno...

Ele é um presente, sempre presente, no meu presente!


Este video mostra apenas uma pequena parte de como ele é adorável!







domingo, 23 de fevereiro de 2014

Semestrados...


- Senta, Thomas.
Ele olhou-me com seus olhos grandes e magnificamente verdes. Não tinha dúvidas sobre o que eu queria, mas esperava que lhe confirmasse. Eu repeti:
- Senta, Thomas.
Ele sentou-se sobre o tapete aos meus pés, enquanto eu preparava o nosso desjejum. O som do pequeno pires de porcelana sendo colocado sobre o granito da pia havia chamado sua atenção. Aquela era parte de sua rotina matutina. Ao ouvir o tilintar da porcelana contra a pedra, ele muda a atenção de sua tigela de ração e vai até o tapete, a esperar pelo miminho, que sempre ganha. Sentado a ouvir o som conhecido da colher a mexer o iogurte, ele não move os olhos de mim, sabendo que uma pequena porção vai ser-lhe dada no pratinho branco, decorado com o símbolo conhecido de um galo português. Ele recebe com satisfação, come até não restar nenhum vestígio e volta à sua ração habitual.
Ninguém diria que em apenas seis meses, estaria tão ambientado à minha vida e aos meus hábitos, como se fizesse parte dos mesmos desde sempre. Aquele gato, cuja triste história comoveu-me no princípio, havia-me cativado completamente, fazendo-me perceber que fora mais fácil que eu esperava, tornarmo-nos parceiros de luta. No fim-de-semana passado havia dado um sinal de confiança que não fizera antes. Deitara-se sobre minha barriga, comodamente, enquanto eu lia, deitado no sofá.
Vindo da criatura que, aos poucos, tivera que ultrapassar alguns traumas que eu desconhecia completamente, aquela era uma demonstração de progresso na relação que vinha sendo construída aos poucos, com muita paciência e perseverança.

Thomas é um gato excepcionalmente inteligente e tem uma percepção bastante aguçada do ambiente que o rodeia. Sabe bem que confiança tem de ser conquistada e precisa estar muito seguro de que não corre nenhum perigo, antes de deixar-se levar por quaisquer demonstrações de afecto.
Desde o dia em que entramos em contacto, pela primeira vez, o gato de aproximadamente dois anos, havia sido respeitado e tratado como um hóspede da casa. E como tal havia-se comportado, pelo menos no começo. O tempo deu-lhe segurança e confiança, mas como fora adoptado já adulto, reagia de maneira desconfiada, cada vez que enfrentava uma situação nova. Não consigo imaginar o que sofreu, antes de ter seu lugar na minha vida, mas garanti-lhe que estava totalmente a salvo, comigo, dali para frente.
Eu, agora, já não troco, distraidamente, seu nome. Um sonho que tivera deu-me um sinal que eu precisava. Tiger deitava-se numa sala separada, confortavelmente, enquanto Thomas estava em outra, também deitado confortavelmente.
‘Somos dois animais bastante diferentes e, portanto, nos comportamos diferentemente’.
É como uma relação nova. Muitas vezes há a inevitável comparação, mas os indivíduos não são os mesmos, nem se comportarão da mesma forma. Era isso que Tiger vinha me dizer no sonho.

Thomas é muito diferente do seu antecessor. Desde a forma física, cor da pelagem e dos olhos, até a forma como se acomodou na minha rotina e eu na dele. Ele não é melhor, nem pior; é diferente e é, também, único. E eu tenho que reconhecer que estou muito feliz de tê-lo comigo... sem nenhum tipo de comparações desnecessárias.
Seus hábitos são simples e fáceis de perceber. Ele espera-me, todos os dias, à porta, ao final do dia. Segue-me ao quarto, onde deleita-se com os carinhos que lhe dou, uma, duas, três… sete vezes... a passar de um lado para o outro, em cima da cama, assim que desfaço-me dos sapatos e do casaco. Depois cheira-me a cabeça, o rosto, o pescoço e dá-me sua cabeça para cheirar.
- Vamos comer, filhote?
Ele percebe logo a mensagem. Segue-me à cozinha, onde recebe a sua porção de ração, come enquanto eu preparo minha refeição e, logo em seguida, fica disputando atenção com minhas tarefas. Por cerca de uma hora, ele corre, brinca com umas bolinhas de papel alumínio amassado, revira os tapetes, sobe na mesa da sala, para beber água do frasco que lá é posto, propositadamente, desloca o rato do computador para o lado, de modo a sentar-se sobre meu braço, ou fica a provocar-me de uma das cadeiras, espiando por baixo do tampo transparente da mesa e dando-me patadas nas mãos, para ganhar carinho, um cumprimento, ou alguma conversa.
Passado o frenesi diário do reencontro e do dispêndio de energia acumulada, ele acalma-se e deita-se no tapete ou no sofá, especialmente se estiver a ouvir música. Estes rituais repetem-se nos dias de semana e, muitas vezes, aos sábados também. Aos domingos, como já era de esperar, sente falta do sono que não usufruiu no dia anterior e dorme a tarde inteira, em algum lugar quieto e escuro, como dentro do armário, em baixo da cama ou outro nicho qualquer, que ele encontra ou cria.
Geralmente não mia, não reclama, não faz sons estranhos. Excepção se dá quando tem de ir à clínica veterinária, pois não gosta de viajar de carro. Algum trauma anterior? Não tenho a mínima ideia...
Seu ronronar é muito suave e quase imperceptível. Seus olhos, porém, estão sempre muito atentos, assim como as orelhas. Às vezes, quando tudo está em silêncio, ouço um ressonar baixinho vindo de onde ele dorme profundamente. Dou uma risada discreta, feliz por saber que está tão relaxadamente confortável no ambiente que lhe é, agora, tão familiar e que é, também, sua casa.
Como um bom animal de companhia, Thomas normalmente está perto de onde estou, como se quisesse ter a certeza que estou protegido por sua presença. Como um pai adoptivo, eu preocupo-me em saber se ele está bem aconchegado, alimentado e tranquilo, ou se as suas inúmeras bolinhas de brinquedo já não estão acumuladas em baixo do sofá da sala.
Recentemente aprendeu a responder convenientemente, quando eu digo:

-‘Bom dia, gato. Estás bem?’

Ele levanta a patinha direita em altura suficiente para que eu o cumprimente com um ‘aperto de mãos’ e olha-me com uma carinha engraçada.
Thomas dá-me suporte. Dá-me alegria. Dá-me companhia e ensina-me a ser paciente, condescendente e, ainda por cima disto tudo, tornou-me extremamente emocional.
Neste momento, está deitado no sofá, 'envelopado' no cobertor, como se fosse uma chamuça de gato, a ouvir música e a dormitar confortavelmente, sem saber que estou a escrever uma homenagem/agradecimento à sua presença nesta casa e na minha vida, sentindo meu coração leve e aquecido, por tê-lo aqui comigo.

Vê-lo assim, faz-me ter certeza que adoptá-lo foi a melhor coisa que eu fiz por nós dois... sem dúvida nenhuma.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Uma das muitas formas de amar...



Esta foto eu havia tirado há algum tempo, em meados do Inverno passado, sem ter consciência que seria a última com ele, deste jeito. Estava perdida na câmera, sem haver sido baixada no PC, por meses...

Esta é uma simples homenagem, em complemento ao post anterior.

Saudades... Não há mais nada a dizer...


domingo, 24 de novembro de 2013

Uma Outra Forma de Amar


- Sabe que vai falar com ele, procurar por ele, chamar o nome, manter as mesmas rotinas, até se acostumar?

- Imagino que sim. Mas não vou ter como evitar… ou vou?

Minha resposta não havia sido nem muito consciente nem tampouco convincente… pelo menos para mim. Eu julgava que saberia gerir bem minhas alternativas e a nova condição que começava naquela nova fase.

As palavras da médica, cheias de experiência e ditas de maneira sábia, numa das mais difíceis ocasiões, não fizeram tanto efeito naquela hora em que minha cabeça estava às voltas, numa confusão de sentimentos, sensações, obrigações… mas fizeram mais tarde...

Era a primeira vez que eu lidava com a morte daquele jeito… Mais de treze anos juntos, vivendo numa quase simbiose e total dependência física e emocional, não me deram bases suficientes para enfrentar uma fortuita fatalidade, como aquela…

Eu não sabia quão despreparado estava para viver sozinho, sem meu bichano – que havia sido meu grande e sempre presente amigo por tanto tempo.

Mas o Universo é sábio e tem seus próprios tempos e seus modos de garantir que sobrevivamos às mais estranhas situações e, ainda, saiamos delas com o espírito um pouco mais fortalecido. A carga deixada em nossos ombros tem sempre os pesos que podemos suportar, mesmo que, às vezes, pensemos que sejam excessivos.

Grandes perdas trazem grandes vazios e deixam, com certeza, grandes cicatrizes. Eu tinha a alma totalmente esfacelada. Minha vida perdia um firme suporte. Eu meio que flutuava entre as horas, sem saber ao certo o que fazer, ou o que sentir…

Mergulhei no trabalho, em silêncio amargo, tentando esconder as lágrimas e evitando os olhares de pena, que as pessoas me dirigiam, sabendo que eu sofria. Não pensei que fosse encontrar tanta consideração das pessoas que viviam à minha volta, de uma maneira ou de outra.

Um feliz incidente trouxe-me um outro personagem, que invadiu minha vida, menos de um mês depois da grande perda. O incidente ganhou um nome: Thomas… e uma vida nova.


Ele entrou na minha vida, lambeu-me, sem cerimónia, as feridas e permitiu-me dar-lhe aquilo que nunca havia tido: um amor incondicional e sem partículas de culpa, miséria ou arrependimento.

O mais puro e irrestrito amor, que dei gratuita e abundantemente, brotou espontaneamente de um coração entristecido e saudoso, mas que ainda estava fértil em generosidade. Ele, em troca, deu-me companhia, segurou-me em silêncio, os dias em que chegava à casa mesmo mal, preencheu-me os espaços vazios, com suas brincadeiras, suas chamadas para ter atenção e sua maneira especial de me olhar, com aqueles olhos grandes e verdes – antes tão perdidos, numa desafeição incompreensível, que terminou –definitivamente - quando nos conhecemos…  

Eu passei a repetir rotinas, quase sem pensar… Muitas vezes errava-lhe o nome e imediatamente pedia-lhe perdão. Ele tinha seu próprio nome, sua própria personalidade e uma maneira toda sua de cativar-me. Eu tentava – às vezes sem muito sucesso – ambientar-me a ele, suas brincadeiras e seus hábitos.

Coisas como esperar à porta, passar um tempinho a fazer gracinhas, enquanto aguarda que eu troque de roupa, para fazer-lhe carinho, em cima da cama, por uns poucos e importantes minutos, mexer na areia, para ter a porta aberta, largar-se sobre o meu braço, para ser carregado pela sala… são os vários expedientes que ele usa, para ter minha atenção.

E tem.

Três meses depois de sua chegada, reconheço que estou totalmente tomado pela presença dele na minha vida e nos meus dias. Ele já é parte do que eu passei a ser.

Com Thomas, eu compreendi, então, que existem muitas formas diferentes de amar. E eu fui surpreendido, mais cedo que consegui alguma vez avaliar.

O facto de passar a amá-lo assim não traz desrespeito nenhum com o amor que eu senti por Tiger...

Tiger foi, sem sombra de dúvida e por mais de treze anos, meu grande amor. Thomas é, hoje, meu outro grande amor…

São duas formas diferentes de amar. São incomparáveis. São imensas, totalmente incondicionais e  absolutamente sem fronteiras.


É AMOR do mais mais simples e mais puro… e basta!



terça-feira, 24 de setembro de 2013

Thomas




Faz, hoje, um mês que o conheci. Ele havia sofrido maus-tratos, sido expulso de casa, aos pontapés, por haver deixado cair, ao chão, umas pinguinhas de urina com sangue - resultado de uma infecção urinária, provavelmente devido ao stress a que esteve exposto - e fora recolhido por uma associação de protecção aos animais.

Cerca de três meses depois, estava a ler umas notas numa página da internet e vi a história do gatinho. Havia umas fotos, mostrando a carinha dele, no artigo, com um olhar distante e meio tristonho. Por algum motivo, aquela história deixou-me comovido e aflito. Ainda estava chorando a perda do Tiger e não conseguia entender como alguém podia fazer aquele tipo de coisas a qualquer bichinho que fosse. Eu havia tentado até o fim e feito tudo ao meu alcance, para que meu Tiger tivesse assistência até os últimos momentos de sua vida. Era-me estranho pensar que outros não fizessem algo parecido.

Entrei em contacto com as responsáveis da associação e perguntei a idade do bichano. Devia ter cerca de três anos, mas ninguém sabia dizer ao certo. Perguntaram se eu queria servir de família de acolhimento temporário (FAT) e ajudar a cuidar do animalzinho, por uns tempos, até que aparecesse alguém, para adoptá-lo oficialmente. Fiquei incerto e não disse sim, imediatamente. Depois de algumas conversas, combinamos que ele deveria vir para os meus cuidados, num fim-de-semana, de modo a dar-nos tempo de avaliarmos um ao outro por, pelo menos, dois dias completos.

Ele chegou numa transportadora flexível. Pelo que constava, não se sentia bem em viajar de carro, ficando bastante agitado no percurso. Já fora da caixa dentro da qual veio, ele começou a exploração do território, não sem antes avaliar-me, sem deixar tocá-lo, mas deixou-me uma boa impressão. Parecia um gatinho forte, apesar de um tanto assustadiço, mas com um jeitinho carinhoso de envolver-se e deixar-se apreciar. Já havia sido tratado e tinha um aspecto bem saudável e cuidado. Poucos minutos depois, aproximou-se e mostrou que estava pronto para um primeiro contacto. Ele deixou-se tocar e, para nossa surpresa, logo caminhou de rabo levantado, como se já sentisse incluso em território amistoso. Nunca demonstrou sinal de qualquer animosidade.

Quando fomos deixados a sós, decidi deixá-lo à vontade, para explorar todos os cantos e os recônditos do apartamento. Resolvi chamá-lo por Thomas. Uma capa de cor cinzenta cobre-lhe a parte de cima do pelo. A parte de baixo e as patas são de uma pelagem muito branca e macia. Seus olhos são verdes e sempre atentos a tudo, como em qualquer felino que se preze. Parece-se com Tom, o desastrado gato que persegue o camundongo Jerry – daí o nome cair-lhe bem.

Thomas tem seu próprio tempo. Ele é esperto e brincalhão. Sabe avaliar bem os limites, antes de tentar ultrapassá-los. Para um gatinho que havia passado pelo que ele passou, ser tratado com respeito e carinho é uma verdadeira dádiva. Ele é dócil e carinhoso. Não gosta de ficar ao colo, mas deixa-se ser afagado, quando aproxima-se, muitas vezes de propósito, a roçar-se nas minhas pernas. No início, talvez para sentir-se seguro, alimentava-se apenas quando me tinha por perto. Com o tempo, felizmente, tornou-se mais independente.

Ele aprecia música, especialmente quando a quietude da noite o convida a recolher-se e descansar. Que feliz surpresa!

Menos de vinte dias depois de tê-lo em casa, resolvi adoptá-lo oficialmente. Não conseguia imaginar outra pessoa a levá-lo para longe de mim, para sempre. Estava apaixonado, acho eu.

Levei-o ao veterinário, para avaliar suas condições físicas e confirmar se a infecção estava realmente curada. Tive a resposta positiva e voltei para casa, aliviado e satisfeito.

Ele já fazia parte da minha vida, que acabou tomando um rumo que eu não esperava, pelo menos assim tão cedo. Ganhei um grande companheiro em Thomas. Tenho certeza que este é o início de uma grande amizade.

Às vezes, como hoje de manhã, enquanto olho para o gatinho a fazer gracinhas no tapete da sala, comovo-me a pensar no que ele passou, no que sofreu, nos medos que teve… até chegar aqui, neste tempo e neste lugar, junto de mim… e não contenho as lágrimas. Não tenho de as conter, para falar a verdade.

Só penso que o pesadelo deste ser quase indefeso está no fim. Tudo que ele precisava era um pouco de atenção e outro tanto de autêntica afeição. Em mim, tem ambas e, ainda, muito mimo. Ele já é muito estimado, com certeza, e sabe disso. Seus olhos, de um lindo tom luminoso de verde, olham-me assim, de uma maneira enigmática, demonstrando afeição e, talvez, gratidão, quando aproxima-se e faz um cumprimento com a cabeça, pedindo um chamego.

Afago-o, passando a mão pelo corpo forte do bichano e ouço seu ronronar satisfeito. O pelo macio brilha com a luz e eu digo-lhe, baixinho, com a voz emocionada:

- Olá, filhote… está tudo bem, agora… Você é muito amado, sabia?

Ele fecha os olhos, devagar, numa demonstração de confiança, como se dissesse, no seu jeito meio estouvado e adorável de ser:

- Eu sei, amigo… eu sei…


domingo, 11 de agosto de 2013

Um Frio Deserto


A grande onda de calor veio, de repente, como se fosse por mágica… ou por maldição. Para os mais desavisados, nem as lojas estavam preparadas para suprir a repentina demanda de ventoinhas ou aparelhos de ar condicionado.

Deitados no chão da sala, com as persianas baixas e as luzes apagadas, em frente à única ventoinha que havia sobrado na loja e que teria de servir, para o momento, ficamos quietos, lado a lado, como se soubéssemos que, qualquer movimento desnecessário, só nos iria trazer mais desconforto.

Havia, por sugestão da doutora, borrifado sua barriga e peito com água fria, para tentar refrescá-lo um pouco. Ele, assim como eu, já não sentia apetite algum… apenas sede; muita sede. 

Menos de uma semana depois, quando as temperaturas começaram a voltar ao normal, ainda não havíamos recuperado a rotina. Apenas nos forçávamos a comer o mínimo e continuávamos a ingerir muito líquido. Ele, porém, começou a enfraquecer e perder peso. Preocupado, voltei à clínica e o submetemos a uma série de exames e análises mais minuciosos.

Os resultados não foram animadores. Os rins estavam gravemente afetados. Parecia sentir dor nas articulações das patas traseiras também. A medicação, especialmente preparada, iria apenas sustentar seu corpinho, que ia definhando aos poucos e que preocupava-me sobremaneira. Meu grande amigo e companheiro, de tantas aventuras e alegrias, havia adoecido gravemente e eu não sabia o que fazer.

Aquele gato ativo e superinteligente, manipulador, desastrado e brincalhão, que não deixava passar, sem seu controle, nenhum horário das refeições ou de ir para a cama, de apagar as luzes ou fechar as portas, tornara-se um bichinho sofrido e apático, que apenas deitava-se ao meu lado, ainda, como dantes, porém já sem conseguir fazer-me rir. Apenas ficava a olhar-me, com seus olhinhos tristes, como se aconselhasse, com aquele olhar, a preparar-me para o que vinha, rapidamente, a seguir.

Pouquíssimas semanas passaram-se, frustrando todas as minhas tentativas de fazê-lo animar-se e reagir. Ele não reclamava. Não gemia. Não miava. Mal andava e, quando o fazia, era com um esforço imenso. Por fim, até mesmo o peso da cabeça impedia-o de beber água sozinho. Havia necessidade de segurá-lo pelos ombrinhos, para que pudesse atingir a água sem que o nariz pendesse e ele se afogasse.

Ele passou de cem por cento a zero, em menos de três semanas. Completamente dependente de mim para todas as funções, sendo alimentado e medicado por seringa e aplicações de soro subcutâneo, ele entregou-se ao destino.

Desesperado e despreparado, ainda tentei até o fim.

Na madrugada de uma quinta-feira (ah! Como eu ainda odeio quintas-feiras!), dormindo, como de costume, ao meu lado, na grande cama de casal, ele gemeu. Levantei-me, com ele no colo e levei-o à cozinha, onde tentei dar-lhe água e levá-lo à caixa de areia. Foi em vão, todavia. Ele recusou ambas as ações.

Deitado sobre meu peito, no sofá da sala, ele deu seu quase último suspiro, avisando-me que estava próximo do inevitável fim. Partiu, plácido e calado, poucos minutos depois, ainda sob os meus cuidados e meu carinhoso e suave abraço, a volta de seu corpinho debilitado. Minhas lágrimas pousaram, mornas e inúteis, sobre seu dorso sem vida.

Meu grande amigo e companheiro, de mais de treze anos, foi-se embora para sempre. (Para onde vão os gatos, afinal, quando morrem? Existe um Paraíso para eles? Existe um, para nós, humanos?) Fiquei sozinho, triste e desconsolado, sem saber como viver - sem a sua tão forte presença.

Acredito que tenha sido a situação mais desesperante da minha vida. E porque amei-o total e incondicionalmente, como nenhuma outra criatura antes dele, eu chorei. Admito, sem vergonha, que nunca havia chorado tanto, como fiz naquele dia (e, também, nos subsequentes)...

Na noite daquele dia, a grande cama de casal parecia um deserto. Estéril e desolado. A sensação era de um verdadeiro, imenso e frio deserto... glacial demais… a sufocar-me o fôlego, a comprimir meu peito. Afiadíssimas lâminas de um gelo frígido e ácido perfuravam, corroíam  e congelavam meu pobre coração.

A casa ficou quieta… vazia… enorme… como o enorme e amargo vazio deixado na minha vida e na minha alma…



quarta-feira, 23 de maio de 2012

12 Anos


Doze anos. Há exactamente doze anos ele entrou definitivamente em minha vida. Ainda lembro do dia em que veio, com menos de três meses de vida, um gatinho de tamanho bastante fora do comum, que me fez desconfiar de sua verdadeira idade e deixou-me meio receoso de aceitá-lo. Era um pequeno sobrevivente, recolhido nas ruas de Johannesburg e entregue aos cuidados da Sociedade Protetora. Depois das dúvidas desfeitas pelo médico veterinário do SPCA em Roodepoort, que mostrou com precisão as características físicas do bichano, resolvi admitir sua presença em minha vida, com um pouco mais de agrado e adotá-lo oficial e definitivamente.

O nome inicialmente dado, Tigger – em homenagem ao meu personagem favorito do desenho animado - foi em seguida alterado pela veterinária da clínica em Sandton City, onde vivíamos na época – que acreditava ser um erro de grafia - para Tiger e acabou ficando até hoje. Hoje reconheço que Tiger é mais apropriado que o nome com o qual queríamos baptizá-lo.

Com a decisão tomada conscientemente, não foi somente a minha rotina que teve que mudar, invariavelmente e para sempre. Abri uma grande janela na minha vida e no meu coração, pela qual ele entrou, encontrou um lugar adequado e onde, já acomodado confortavelmente, instalou-se de vez. Em menos de uma semana já estava apaixonado por ele… e nunca mais me deixei de surpreender.

Ele revelou-se um parceiro exemplar em muito pouco tempo, acompanhando-me desde a hora que levantava, de manhã cedo, até quando saía para trabalhar. Brincalhão, companheiro, trapalhão e estabanado, naturalmente curioso, surpreendentemente inteligente e criativo, revelou uma afinidade tão grande comigo, que nenhuma outra criatura jamais teve ou teria.

Ele derrubou vários pré-conceitos que eu possuía, ensinou-me uma grande porção de coisas relativas às suas preferências e sua maneira própria de se comunicar e conviver, fez-me ver a minha própria vida com outra perspectiva e despertou em mim um carinho invulgar pelos animais em geral, mas em especial e extraordinariamente pelos gatos.

Ele é meu filho, meu irmãozinho, meu guru, meu grande amigo, meu suporte, meu calmante, a rocha na qual minha vida se apoia… Viver sem ele – reconheço, sem receio nenhum - seria intolerável. É o mais genuíno significado de “lar” para mim.

É aquele para quem eu volto no fim do dia, muitas vezes cansado de uma jornada extenuante, mas sempre encontro disposição para deixar-me envolver e dedicar parte do meu tempo para que ele se sinta alimentado, confortável e amado. Sempre me recebe à porta e faz a festinha de costume. Depois de um abraço e um chamego, segue para a varanda, onde se deita de barriga para cima e pede uma massagem... que, invariavelmente, ganha.

Grande parte da minha vida em casa gira em torno dele e de seu bem-estar. Ele traz tranquilidade quando estou agitado, estimula meus dias quando estou sonolento, controla meus horários, quando esqueço deles – especialmente quando se trata das refeições, obviamente.

Ele tinha menos de dois anos de vida, quando me divorciei e, podendo ficar mais tempo com ele, somente, nosso relacionamento foi-se estreitando e nos aproximou ainda mais. Ficamos mais livres para nosso amor incondicional. Nossa relação cresceu em entendimento e tolerância e nossa comunicação entrou em estado adiantado de compreensão, com o passar dos dias. Aprendi a ser mais paciente, a prestar atenção às suas necessidades e desejos, a respeitar não somente as suas rotinas e a deixá-lo em paz quando necessitava de sossego e silêncio, mas também a tê-lo como parte essencial da minha vida.

Lembro que no dia em que o jardim da casa ficou pronto, ele parecia uma criança que havia ganho um presente tão especial, que não cabia em si de felicidade, correndo de um lado para o outro e chamando-me, na sua maneira meio desajeitada, para olhá-lo enquanto pulava de um lado para o outro, por vezes escondendo-se atrás dos arbustos recém-plantados na relva verde, outras subindo na árvore assentada no centro do terreno. Aquela euforia toda me fez ver que o investimento havia sido lucrativo, pelo menos em satisfação pessoal - minha e dele. Também foi nesta ocasião que ele se tornou mais possessivo e territorial.

Já passamos por algumas situações difíceis. Tive um grande medo de perdê-lo, quando tivemos que combater um sério envenenamento. Mas ele lutou como um bravo. Provou mais uma vez que era um sobrevivente… e dos mais fortes – um verdadeiro tigre!

Nunca foi um fardo para mim, nem quando tive que optar por um novo desafio de carreira e sair do meu país de origem pela segunda vez em minha vida. Tivemos que passar por uma necessária separação de alguns meses… longa demais, a meu ver, mas como em ocasiões anteriores, sobrevivemos a tudo que enfrentamos juntos. Fazer a viagem até Portugal havia sido uma preocupação grande, um stress a que nos submeteríamos, tendo o pobre bicho que ficar dentro de uma caixa de transporte, cruzando oceanos e céus por muitas horas, mas tudo acabou bem. Ainda bem que o trouxe, pois sem ele aqui comigo, a vida seria praticamente insuportável.


Estamos cada vez mais unidos. Temos, verdadeiramente, uma relação muito intensa, por assim dizer. Ele é uma parte essencial de quem eu sou hoje, sem dúvida nenhuma. Como disse um amigo psicólogo, somos viciados um no outro – e é a mais legítima realidade. Não tenho vergonha de dizer que sou muito protector e tenho muitos ciúmes de quem chega perto dele, mas a recíproca também é, cada dia que passa, mais verdadeira. Se pensar bem, é ele quem cuida de mim e não o inverso…

Tento fazer a leitura em seu comportamento quando este muda, pois é sinal que algo o incomoda. Ele sabe se comunicar com muita precisão. Basta observar com cuidado e fica fácil perceber sua linguagem. Desconfiado, quando percebe que estou a dar atenção demais a alguém, especialmente “on-line”, usa de seus próprios artifícios para atrair-me às suas brincadeiras. De passar várias vezes por cima do teclado do computador, a correr desgovernado pela casa e atirar-se por baixo de folhas de jornais dispostas no tapete da sala, ou sentar-se em cima do rato, de modo a impedir-me de usar o computador propriamente, ele faz de tudo.

Não dorme sem ganhar um cheiro na cabeça, um chamego, um carinho... Às vezes, acordo-me no meio da noite e vejo que está deitado comigo, com a cabeça no travesseiro e o corpo esticado ao longo do meu, como se fosse uma criança, buscando o calor em baixo da coberta. Se perde o sono, me faz vítima de sua impaciência e de sua disposição para ficar acordado no meio da madrugada. Quando estou em casa, não come sem me pedir para verificar a tigela de ração ou seu pratinho.

Eu o chamo por vários nomes, que ele reconhece, pela forma e entonação que uso quando falo. Néne, Nino, Go’dinho, Filhote, entre outros, fazem parte do repertório carinhoso de alcunhas, porém o nome oficial, dito de maneira clara e firme é, praticamente, o único que o faz obedecer.

Sempre agradeço aos céus por ele estar comigo. E só posso mesmo agradecer pelas alegrias e pelo conforto moral e a companhia sempre presente e solícita que ele tem me proporcionado. Ele exige bastante atenção, sim, mas por que não exigiria, afinal tem direitos adquiridos.

São doze anos de convívio, dos quais dez são de uma exclusiva vida “a dois”. Ele sabe que eu sou apaixonado por ele. Quando o vejo a dormir perto de mim, deitado no sofá da sala ou sobre meu peito, com seu sono tão tranquilo e tão despreocupado, me dou conta que eu já preciso muito pouco para ser feliz. Se para ele basta um cantinho confortável, um prato de comida e um pouco de água limpa e fresca, para mim esses pequenos luxos também tem sido suficientes, se estiverem associados ao carinho e atenção de alguém – ou alguma criatura - que se importe.

Ah… e música... Assim como para mim é essencial, para ele existe uma afinidade especial, que pode ser considerada um capítulo à parte. Quando percebi que ele a tinha, resolvi explorá-la, testando sua reacção às melodias. Descobri que ele tem preferências bem definidas e deixa bem claro quando gosta, aproxima-se e fica a ouvir, quieto. Quanto mais harmoniosas, mais relaxado ele parece, desde que estejam a tocar em volume tolerável para ouvir.

A forma como me observa, às vezes, deitado no sofá ou no tapete, ou fazendo gracinhas para me arrancar um sorriso, faz-me parar o que estou a fazer e me deitar ao seu lado, ou simplesmente olhar e ver como ele parece estar tão confortável e feliz por estar ali, comigo, naquele momento em que desfrutamos a companhia um do outro, sem interferências, sem preocupações e sem quaisquer tipo de promessas ou segundas intenções. Recosto, levemente, minha cabeça sobre seu corpo e ouço seu ronronar tranquilizador, levando-me a crer que não precisa existir muito mais que esta despretensão em nossas vidas.

Do jeito que somos apegados um ao outro, o convívio se tornou uma grande e bem-vinda dependência. Ele minora a possibilidade de sentir solidão e alegra os momentos em que estamos juntos. Eu, por meu lado, faço-lhe as vontades e cuido para que ele tenha o que precisa, que nem é tanto assim, além de sua exigência de atenção.

Sei também que o destino pode me trazer surpresas inesperadas, pela idade que ele já tem, apesar de não a ostentar - nem pela aparência, nem pela actividade e agilidade que ainda possui. A inteligência parece haver aumentado com o tempo, assim como o seu poder manipulativo - o que me diverte, mas não me engana. Sou condescendente quando necessário ou quando quero.

Não tenho medo do futuro, nem temo pela tristeza, nem pelas saudades que com certeza deverei sentir quando ele se for para sempre da minha vida. De todas as formas, tento me preparar emocionalmente para o que vier, sem deixar de prover-lhe o melhor que eu possa e que ele mereça. Vou aproveitar da melhor maneira possível o que tiver, sem restrições emocionais e confiando que podemos ter, ainda, um longo, confortável e salutar tempo juntos. Só posso pensar no melhor, nada mais… e viver com intensidade, enquanto puder… Com toda certeza…

Neste momento, aqui sentado ao meu lado, sobre a mesa, com seus olhos inquisidores e sua presença forte, mas confortante, espera a hora da refeição – que, diga-se de passagem, já passa um pouquinho e ele veio me lembrar da falha no nosso esquema. Como se soubesse que me refiro a ele, o esperto gato se curva e me saúda com a cabeça, ronronando baixinho e esperando que lhe dê um “cheiro”, costume que inventou para ganhar mais atenção e me fazer sorrir...

Ao ouvir-me dizer “vamos lá, então”, salta da mesa com um grunhido de satisfação e se dirige, ligeiro, à cozinha, onde o pratinho vazio sobre o pequeno tapete aguarda uma pequena porção de atum de lata, que ele simplesmente adora.

Esta despretensão é, realmente, uma das coisas mais sublimes que há, concluo, com carinho, enquanto olho-o a deliciar-se, concentrado e em quase silêncio, com as orelhas a se moverem instintivamente, como radares atentos aos mínimos ruídos à sua volta. Ele me ouve aproximar e pára, por um instante, levanta discretamente a cabeça e espera por outro “cheiro”, a ronronar de satisfação, fazendo-me sorrir da percepção extraordinária e controle de ambiente que ele possui…

terça-feira, 31 de maio de 2011

Simbiose (Versão Oficial)

Às vezes, ele me olha fixamente, me abraça, me beija e conversa longamente comigo, mesmo sabendo que a minha mente funciona muito diferente da dele.

Nossa relação é de cumplicidade, quase uma simbiose. Ele depende da minha companhia, eu dependo dele para sobreviver, embora creia que em estado selvagem - eu nasci em África, afinal - eu possa me virar bem. Ele cuida de mim e eu velo por ele. Faço-lhe companhia sempre. Dou-lhe atenção quando quero ou quando vejo que está precisando. Ele sempre está pronto para me dar atenção, mesmo quando quero ficar sozinho, mas tento ser condescendente e paciente com este homem, para receber minhas compensações mais tarde.

Eu sei quando ele está para chegar em casa. Sinto a sua presença, apenas por instinto, mesmo antes de ouvi-lo ou vê-lo entrar pela porta. Ele conhece meus passos, percebe quando estou por perto e, além de me fazer carinho, com frequência, ainda me faz as vontades. Sabe, também, quando eu entro no quarto, à noite, para pedir um “cheiro”na cabeça e deitar-me ao seu lado. Claro que só faço isso depois de dar uma boa vistoria na casa, pois ele se limita a fechar as portas e apagar as luzes. Alguém tem que cuidar de tudo por aqui, com mais responsabilidade, afinal não é somente a segurança dele que está em jogo.

Sou curioso e diligente. Minhas extravagâncias e rotinas são evidentes e as dele também. Pela manhã, assim que saímos da cama, vamos directos ao banheiro. Gosto de deitar-me no tapete fofo, enquanto ouço a água do chuveiro a escorrer, um som que me fascina. Depois é hora do “desjejum” – do dele e do meu. Nos fins-de-semana, esta sequência muda, estrategicamente, para que eu perceba que vamos ter mais tempo juntos.

Não mexo em nada que não seja meu. Não toco em comida, a não ser que me seja dada, mesmo que eu esteja próximo de um prato feito... para ele. A minha dose vem num pratinho exclusivo ou na minha tigela de ração – também exclusiva.

Não gosto de ver as coisas fora do lugar e me acostumei com aquela sua mania de organização. Roupa suja tem que ser colocada no cesto. Se alguma coisa aparece fora do seu devido lugar, eu paro e fico olhando para ele até que conserte o erro. Minha caixa de areia tem que estar sempre limpinha. Eu aviso assim que acabo de usá-la e, assim que ele a deixa limpa e disponível, vou lá verificar se não ficou com resquícios de cheiros inconvenientes.

Não costumo procurá-lo pela casa, apenas o chamo (ele conhece meu miado especial para isso!) e sigo o som de sua voz, assim que me responde. Assim poupa-me o trabalho de ficar entrando em cada aposento, para ver se o encontro. Faço isto para garantir que não vou ficar só, desavisadamente. Aliás, ele sempre me deixa saber quando vai sair, de todo jeito. Por outro lado, também preciso de sossego e ele respeita estas minhas necessidades de silêncio e tranquilidade. Portanto, se eu colocar meu “manto da invisibilidade” e desaparecer das vistas, é porque não estou disponível. Se ele ficar me chamando, só vou me revelar novamente - se e quando - eu quiser e tiver vontade. No caso, eu chego bem quietinho e fico olhando, só para ver quão ridículo ele parece, a ponto de quase desesperar, por não me ver por perto. Imagino que ele tenha medo de me perder…

Ele pensa que pertenço a ele, mas no fundo, sabe que é o contrário. Quem dita e conduz todos os horários aqui dentro de casa sou eu mesmo. Luzes acesas depois das onze da noite, TV com o som alto, ficar na cama depois das sete da manhã ou dormir no sofá até tarde, são coisas intoleráveis, que eu trato de garantir que não me escapem ao controlo. Refeições nos horários certos, especialmente nos fins-de-semana, são essenciais e eu cuido bem para que esta regra seja cumprida. Minhas horas de sono são sagradas, por isso quando estou a lamber o pêlo, estou-me preparando para uma boa e revigorante soneca. Se me atrapalhar ou me despentear por algum motivo, tenho que recomeçar o trabalho desde o início… Claro que eu deixo evidente que isso me incomoda e… bufo, pois goste ou não, é a forma de manifestar meu descontentamento. Ele sabe que levo horas a me embelezar, afinal…

Quando quero algo, sou insistente. Na maioria das vezes ele cede, depois de algum tempo. Se encostar meu focinho na perna dele e empurrá-lo, significa que estou com fome. Se fico de barriga para cima, quero massagem. Se vou cutucá-lo no sofá, está na hora de me recolher e ir para a cama. Não gosto de portas dos guarda-roupas fechadas, nem das dos quartos e banheiros, por isto faço questão de pedir para abri-las. Quando fico sentado perto da porta de saída, quero dar uma voltinha lá fora. Ele sabe disso. Só me faz restrições ao tempo que fico no corredor e escadas e, também, ao barulho na frente das portas dos vizinhos.

Quase não brigamos, mas quando eu estou de mau humor e o ataco, ele fica chateado e me dá broncas, mas estas não são muito sérias. Somente quando eu fujo pela varanda e entro, pela janela, na casa do vizinho, é que ele fica, mesmo, muito irritado e me põe de castigo. O castigo é uma greve de fala e de atenção. Fico incomodado quando ele faz estas greves. Tento de tudo para que ele me desculpe e para que aquilo dure pouco tempo, mas ele é turrão, quase tão teimoso quanto eu. Eu sei que ele sofre com isso, também, porque me diz, quando pede desculpas e fazemos as pazes.

Aprendi a lidar com ele e ele aprendeu a ler minha linguagem e compreender minhas vocalizações, quase sem erro. Associo palavras que ele usa, com minhas atitudes. Sei responder ao meu nome, reconheço quando menciona a palavra comida, associei o convite ”vamos tomar café?” a ganhar uma colherada de iogurte e sei quando me chama para deitar e dormir. Gosto de tomar água directamente da torneira, mas ensinei-o que puxar-lhe a mão lamber-lhe as gotículas na sua pele molhada, mostra que quero que me sirva da mão em concha. E ele compreende perfeitamente. Algumas vezes tenho que ser mais óbvio ou não consigo passar minha mensagem, mas isso acontece somente quando ele está distraído.

Tenho meus dentes escovados duas vezes por dia. Pode parecer estranho, mas eu gosto – não somente do sabor da pasta de dentes, mas de ter alguns momentos dedicados só a mim. Na maioria das vezes, obedeço ao pedido dele para sentar-me, pois do contrário posso cair de cima do móvel da pia do banheiro. Eu o deixo fazer a operação com calma, sabendo que no fim vou ganhar mais um pouquinho daquela delícia. Depois, ele verifica e limpa meus olhos e nariz com o cotonete, me dá um cheiro na cabeça, um abraço e diz-me, logo em seguida, que estou lindo. É bom ouvir isso de vez em quando… Sei que sou simpático, mas ouvir que sou lindo é muito melhor…

Não tenho aversão a banho, desde que a água esteja na temperatura certa e que venha em chuveiradas gostosas nas minhas costas e barriga. Até gosto. Ele me esfrega o corpo com shampoo e com delicadeza, do contrário eu reclamo. Não fujo do banho, mas não suporto ser enxuto com a toalha. Gosto é de ficar ao sol, secando ao natural, usando meus próprios recursos, mas quero que me escove, de tempos em tempos. Aliás, a escova é um prazer ao qual não abro mão. Se ele esquecer, vou atrás e protesto. Ele acaba se divertindo com isso. Meu pêlo ganha um brilho extra e cheirinho de limpeza. Mais uma razão para ser chamado de bonitão.

Gosto bastante de música, mas nem de tudo que se ouve nesta casa. Ele conhece minhas preferências e fez uma selecção especial de canções com melodias mais harmoniosas, que eu reconheço assim que começam a tocar. Costumamos ter nosso espaço e tempo exclusivos para curtir. Aos domingos à noite, especialmente, enquanto ele passa as roupas a ferro, deito-me por perto, ouvindo àquela sequência, em silêncio, até que termine sua tarefa e chegue a hora de nos recolhermos.

Desconfio logo quando percebo certos movimentos estranhos. Se o vejo com a mala nas mãos, deito-me por perto, quieto e triste, deixando evidente que não aprecio o facto de ele viajar. Quando vai trabalhar é uma coisa muito diferente, pois eu sei que à noite, quando chega, mesmo que seja tarde, vou ter toda a atenção que mereço. Mas quando viaja, nunca sei se aquela situação vai me deixar sozinho por dois dias ou três semanas a fio... e isto me deixa desconsolado. Claro que quando ele volta, eu fico contente, mas deixo sempre manifesto meu desagrado. Faço meu teatrinho particular, que ele já conhece e aceita, dedicando-me tempo e carinho extra. É isto mesmo que quero… Ele tem que pensar que, se me acontece algo, tenho que ter quem me socorra, imediatamente. Será que ele percebe que eu preciso dele, cada vez mais, por perto?

Eu sou um sénior agora (somos, ambos, para falar a verdade). Tenho necessidades diferentes e careço de mais cuidado. Meu tempo com ele é precioso. Ele parece ter-se dado conta disso, quando conversou comigo hoje. Eu o vi lendo algo a este respeito recentemente. Não sei se ele está, de alguma forma, preparado para quaisquer eventualidades. Sei que faz pouco sentido ter expectativas que vou viver tanto quanto ele, mas percebi que chorou quando falou sobre isto. Aliás, tem chorado bastante ultimamente. Quando chora, este lugar me parece tão imenso, tão desolado… Quando ele parece desabar, eu tento permanecer firme como rocha. Então me aproximo, olho nos seus olhos e espero até que a coerência volte, que se recomponha e me diga que está bem. Às vezes até me pede desculpas, por parecer estúpido. Não sei se compreendo o que se passa, mas mesmo assim, mostro que estou ali para o que der e vier, se for necessário. E ele parece contentar-se com isso.

Eu gosto quando me olha com afeição, o que acontece quase sempre. Me faz sentir amado, mimado e especial. Eu sei que ele estima a minha presença, a forma com que eu o saúdo - com uma leve cabeçada - e minhas demonstrações de carinho, porque me dá indicações de que se regozija com isso.

Ele ri. Ele sempre ri. Às vezes apronto alguma, só para ouvir a gargalhada dele. Quem o ouve,  deve pensar que é louco, mas não o vejo muito preocupado com isso. Acho que isso o diverte, ao invés de incomodar.

Somos independentes em termos de relacionamentos com outros, mas somos muito apegados entre nós. Sei que ele fala muito a meu respeito. Deve ser por gostar tanto de mim. Gosto quando ele me escova a cabeça e o corpo, me faz massagens, deita sua cabeça sobre a minha ou quando me pega no colo e me abraça ao chegar em casa. Às vezes dança comigo de rosto colado. Gosto de acomodar-me sobre a sua barriga, enquanto ouvimos música ou assistimos à TV, deitados no sofá. No inverno, é mais agradável ainda, pois usufruo do calor de seu corpo. Ele, então, diz que me ama. Eu, em resposta, recito meu “mantra” - um ronronar contínuo - que lhe abranda as preocupações e o faz adormecer. Isto também acalma e atenua minhas tensões. Chego a cochilar ali, bem confortável e aquecido, sabendo que sou bem-vindo e tenho um lugar sempre disponível junto a ele. Só não gosto quando fica várias horas na frente do computador e me dá menos atenção que estou habituado a receber, mas na maioria das vezes ele pára e me dá alguma. Se não, eu sento-me sobre o teclado. Não há como não perceber que já passou tempo demais sem me dedicar algum…

Em termos gerais, minha vida é bem tranquila e sou bem tratado e respeitado. Não tenho acessos de ciúme, pois não tenho motivos para isso, por enquanto. Minha veia possessiva é, porém, bem acentuada e lembro bem que já mostrei quem pertence a quem, quando tive que o fazer. Ele está dentro do meu domínio, portanto me pertence... e ponto final! Nem que eu o tenha que "marcar" como parte do meu território!!!

Bom, agora que já me penteei, vou deitar-me sobre o meu tapete favorito. Minha barriga está cheia e vejo que ele está ocupado com alguém no computador. Minhas músicas favoritas estão tocando e vou relaxar um pouco, até a hora de ser chamado para escovar os dentes e ir para a cama, nossa rotina nocturna, que eu controlo com maestria. Amanhã sei que vou ganhar meu carinho habitual e minha porção de atum, que eu adoro comer quando ele está em casa, na hora do jantar… a não ser que faça um bom peixinho assado e divida comigo… Hummm… O amanhã promete!

Ah, antes que esqueça: meu nome é Tiger…