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terça-feira, 24 de março de 2020

Soothing



And today,

If I could only

Make a wish,

I would have only one:

To be quiet

In your arms,

Cuddled, tightly,

By your loving embrace,

And hearing you,

Whisper in my ear

That everything

Is going to be alright…

(E, se hoje,
Eu pudesse
Fazer
Um desejo somente,
Este seria:
Estar em teus braços,
Quieto
E sendo cingido
Por um abraço apertado
E te ouvir
Sussurrar,
Em meu ouvido,
Que tudo,
Tudo mesmo,
Vai ficar bem...)

domingo, 11 de agosto de 2013

Um Frio Deserto


A grande onda de calor veio, de repente, como se fosse por mágica… ou por maldição. Para os mais desavisados, nem as lojas estavam preparadas para suprir a repentina demanda de ventoinhas ou aparelhos de ar condicionado.

Deitados no chão da sala, com as persianas baixas e as luzes apagadas, em frente à única ventoinha que havia sobrado na loja e que teria de servir, para o momento, ficamos quietos, lado a lado, como se soubéssemos que, qualquer movimento desnecessário, só nos iria trazer mais desconforto.

Havia, por sugestão da doutora, borrifado sua barriga e peito com água fria, para tentar refrescá-lo um pouco. Ele, assim como eu, já não sentia apetite algum… apenas sede; muita sede. 

Menos de uma semana depois, quando as temperaturas começaram a voltar ao normal, ainda não havíamos recuperado a rotina. Apenas nos forçávamos a comer o mínimo e continuávamos a ingerir muito líquido. Ele, porém, começou a enfraquecer e perder peso. Preocupado, voltei à clínica e o submetemos a uma série de exames e análises mais minuciosos.

Os resultados não foram animadores. Os rins estavam gravemente afetados. Parecia sentir dor nas articulações das patas traseiras também. A medicação, especialmente preparada, iria apenas sustentar seu corpinho, que ia definhando aos poucos e que preocupava-me sobremaneira. Meu grande amigo e companheiro, de tantas aventuras e alegrias, havia adoecido gravemente e eu não sabia o que fazer.

Aquele gato ativo e superinteligente, manipulador, desastrado e brincalhão, que não deixava passar, sem seu controle, nenhum horário das refeições ou de ir para a cama, de apagar as luzes ou fechar as portas, tornara-se um bichinho sofrido e apático, que apenas deitava-se ao meu lado, ainda, como dantes, porém já sem conseguir fazer-me rir. Apenas ficava a olhar-me, com seus olhinhos tristes, como se aconselhasse, com aquele olhar, a preparar-me para o que vinha, rapidamente, a seguir.

Pouquíssimas semanas passaram-se, frustrando todas as minhas tentativas de fazê-lo animar-se e reagir. Ele não reclamava. Não gemia. Não miava. Mal andava e, quando o fazia, era com um esforço imenso. Por fim, até mesmo o peso da cabeça impedia-o de beber água sozinho. Havia necessidade de segurá-lo pelos ombrinhos, para que pudesse atingir a água sem que o nariz pendesse e ele se afogasse.

Ele passou de cem por cento a zero, em menos de três semanas. Completamente dependente de mim para todas as funções, sendo alimentado e medicado por seringa e aplicações de soro subcutâneo, ele entregou-se ao destino.

Desesperado e despreparado, ainda tentei até o fim.

Na madrugada de uma quinta-feira (ah! Como eu ainda odeio quintas-feiras!), dormindo, como de costume, ao meu lado, na grande cama de casal, ele gemeu. Levantei-me, com ele no colo e levei-o à cozinha, onde tentei dar-lhe água e levá-lo à caixa de areia. Foi em vão, todavia. Ele recusou ambas as ações.

Deitado sobre meu peito, no sofá da sala, ele deu seu quase último suspiro, avisando-me que estava próximo do inevitável fim. Partiu, plácido e calado, poucos minutos depois, ainda sob os meus cuidados e meu carinhoso e suave abraço, a volta de seu corpinho debilitado. Minhas lágrimas pousaram, mornas e inúteis, sobre seu dorso sem vida.

Meu grande amigo e companheiro, de mais de treze anos, foi-se embora para sempre. (Para onde vão os gatos, afinal, quando morrem? Existe um Paraíso para eles? Existe um, para nós, humanos?) Fiquei sozinho, triste e desconsolado, sem saber como viver - sem a sua tão forte presença.

Acredito que tenha sido a situação mais desesperante da minha vida. E porque amei-o total e incondicionalmente, como nenhuma outra criatura antes dele, eu chorei. Admito, sem vergonha, que nunca havia chorado tanto, como fiz naquele dia (e, também, nos subsequentes)...

Na noite daquele dia, a grande cama de casal parecia um deserto. Estéril e desolado. A sensação era de um verdadeiro, imenso e frio deserto... glacial demais… a sufocar-me o fôlego, a comprimir meu peito. Afiadíssimas lâminas de um gelo frígido e ácido perfuravam, corroíam  e congelavam meu pobre coração.

A casa ficou quieta… vazia… enorme… como o enorme e amargo vazio deixado na minha vida e na minha alma…



quarta-feira, 10 de abril de 2013

A Visita


Eu tinha a cabeça recostada ao grande travesseiro que jazia, desalinhado, na cabeceira da cama. Meus olhos estavam cerrados, mas eu não havia adormecido ainda. Havia um leve perfume de alfazema no ar.

Na taciturna penumbra do quarto, minha intuição alertou-me que não estava sozinho. Foi como se a atmosfera à minha volta houvesse mudado. Senti sua forte presença, muito próxima de mim. Sabia, com uma certeza absoluta, que ela estava ali e que só poderia abrir meus olhos se tivesse permissão para tal. Por incrível que pareça, são esses instintos que sempre flutuam na minha cabeça, naqueles tipos de ocasiões. Eu não precisava de mais certeza que aquela.

Senti seu rosto repousar sobre minha cabeça, com suavidade… leve e carinhosamente... quase um toque de pluma. E ela disse, baixinho:

- Eu precisava vir…

Sem abrir os olhos, eu falei:

- Quero te ver.

Ela sussurrou, incerta:

- Mas eu estou diferente.

- Não tem importância, disse-lhe eu.

Ao que ela respondeu:

- Tenho medo.

- Eu também...

Minha afirmação era uma verdade incontestável. Minha razão receava que, ao abrir os olhos, um sentimento negativo assolasse meu espírito e o medo ou decepção a afastasse de mim.

Ela havia mantido seu silêncio, como se os meus temores fossem também os dela. Foi então que decidi que devia abrir meus olhos e enfrentar o que visse e viesse. Era necessário mais que coragem naquele momento – era preciso uma atitude arrojada, que derrubasse barreiras e juízos pré-concebidos…

Abri os olhos devagar.

Sua face realmente estava diferente, mas ela me olhava do mesmo jeito – aquela maneira meio triste, como se estivesse sentindo uma certa apreensão em relação à minha possível reacção. Os ossos da face pareceram-me mais acentuados e ela tinha aquela melancolia incerta no semblante… Minha mãe parecia mais jovem, todavia, que da última vez que a vira.

Toquei-lhe a face com delicadeza, como uma criança faria e vi que ela fechou os olhos ao meu contacto, como se aquele leve roçar de meus dedos sobre sua pele lhe fizesse algum bem. Foi então que eu chorei. Não por medo, nem por angústia… chorei por nostalgia, por sentir uma saudade enorme...

O relógio despertou-me, apagando de imediato meus pensamentos, chamando-me à realidade e à vida. Levantei-me de um salto e fui ao duche, entrando automaticamente na rotina diária.

Ela havia vindo a mim em um sonho, como não podia deixar de ser; um sonho cujos detalhes não lembrei imediatamente, ao despertar. Foi somente quando voltei ao quarto, para vestir-me, antes de sair para trabalhar, que as imagens vieram como num filme.

Foi como se acordasse, naquela hora, a memória de poucos minutos antes. Meu peito apertou-se, diante da tristeza gigantesca que me tomou os pensamentos. Daquela vez meus olhos inundaram com lágrimas incontroláveis e eu chorei mais… muito mais que no sonho. Sentado à beira da cama, enterrei o rosto nas mãos e me deixar levar por aquela emoção estranha, que misturava dor e saudade – uma saudade impossível de matar com uma viagem programada ou um telefonema de longa distância...

Como já era costume, Tiger entrou no quarto, mas ao ver-me soluçar, chegou-se, deu-me a tradicional cabeçada na perna e sentou-se a observar-me, quieto e com fixa atenção. Somente quando viu-me composto novamente, o astuto gato saiu do quarto… ainda em absoluto silêncio. Aquele respeito tácito fazia-me ter grande consideração pelo animalzinho que soube cativar-me tão bem e exercer tão marcante presença na minha vida.

Durante aquele dia, muitas vezes senti ondas de tristeza irem e virem, comprimindo-me o peito, incontrolável e inconsolavelmente. Por várias vezes tive de engolir, a seco, a vontade de chorar, para não parecer tolo, nem ter que explicar o inexplicável, para quem olhasse e percebesse o estado em que eu me encontrava.

Quando voltava para casa, vinha a pensar no que me acontecera durante o dia ou em coisas que me afectaram o humor, incidentes pessoais ou mesmo pensamentos aleatórios, engatilhados pela música que tocava no momento. Foi então que compreendi…

Em meu pequeno mundo, sua ausência ainda é sentida e um certo inconformismo diante do facto de não haver podido dizer-lhe adeus, propriamente, faz-me pensar, de vez em quando, nas últimas palavras que trocamos.

- A gente se fala na semana que vem…

Nem mais, nem menos. Entre nós existia aquela espécie de comunicação que sempre indicava continuidade. Quando ainda estava por perto, era a mim que ela esperava nos fins-de-semana para ir à farmácia, ou ao supermercado, ou ao shopping center comprar algo que necessitasse ou desejasse. Era o meu telefonema que ela aguardava sempre aos domingos, às 3:00h da tarde, estivesse no Brasil ou longe de lá.

No fundo, dizer que ia ligar-lhe na semana seguinte foi a melhor despedida que pude fazer. Era um simples “até breve”, que ficara entre nós… e agora ela vinha, em um sonho, apenas ver se tudo estava bem comigo… matar um pouco daquela saudade que ficou arranhando o peito… que gesto assustadoramente bonito!

- Até breve, então, mãe…