sábado, 18 de março de 2017

Olhares (Parte 1)


Eu não gosto de ocasiões sociais. Não gosto de festas, nem de ‘cocktail parties’, muito menos de ‘happy hours’. Quando muito, tolero um jantar entre amigos, mas com poucas pessoas. O ruído de muita gente a falar, especialmente se for em volume alto, me incomoda. As exceções existem, mas são escassas.

Numa destas raras ocasiões, estava num ‘vernissage’ de pintura, convidado por um dos artistas da coletiva, um amigo de longa data, que participava de uma mostra, pela primeira vez, depois de muita insistência dos conhecidos. Ele não achava que sua arte estava madura para mostrar ao público, mas todos insistiam que eram obras muito boas e ele acabou cedendo. Eu tive que concordar que ainda havia um longo caminho para aquilo que ele poderia chamar de “maduro”, mas eram melhores que muitas das outras obras à mostra naquela coletiva.

Aceitei o convite para dar-lhe o apoio que achava necessário aos artistas novos e, também, para quebrar meus próprios tabus e ideias pré-concebidas a respeito de sair de casa, num dia de semana à noite. Já havia decidido que ia ficar apenas o tempo suficiente para ser notado pelo meu amigo e dar-lhe o suporte público, mas sabia que ele estaria bastante ocupado com os convidados e não ia ficar chateado se eu saísse cedo. Ele sabia que minha presença naquele tipo de eventos já poderia ser considerada uma raridade, por isso não ficaria melindrado, se eu fosse para casa antes do fim do evento.

Passei os olhos num apanhado geral ao grupo que ali estava reunido, a andar de um lado para o outro, descontraidamente, a fingir que gostavam do que viam ou que percebiam de artes. O vinho era de boa qualidade, mas nada excepcional. Os canapés estavam bons, mas sem serem luxuosos ou sofisticados demais. Percebia-se que o objetivo do ‘catering’ não era manter os visitantes atentos ou ansiosos por comer, mas apenas servir para criar o clima de uma certa formalidade.

Sentia-me deslocado, como quase sempre. Preferia estar em casa a ouvir música, a ler, ou, simplesmente a fazer festinhas ao gato. O que uma pessoa não faz para apoiar um amigo…

Alguém esbarrou em mim e fez-me derramar um pouco de vinho branco na manga do casaco. Um mirrado pedido de desculpas e uma saída estratégica seguiram-se ao meu desajeitado ‘tudo bem’. Pousei o copo numa mesa e tratei de ir à casa de banho, a fim de lavar, rapidamente, o vinho do casaco, para não fazer mais estrago que já havia feito.

Na volta, decidido a deixar imediatamente o local, procurei por meu amigo artista, a fim de despedir-me, mas ele estava ocupado com um grupo de mulheres que riam à solta e nada discretamente.

- Gralhas!

Pensei alto e entre os dentes.

Por algum motivo meus olhos foram atraídos na direção da escadaria que levava ao mezanino, onde haviam alguns outros quadros expostos. Um homem vestido de preto olhava na minha direção e parecia sorrir. Eu não tinha certeza se era para mim, mas um arrepio subiu-me pela espinha. Ele tinha um copo de vinho tinto na mão e levantou-o, como se brindasse comigo. Olhei para trás, mas não havia ninguém por perto que estivesse a olhar na mesma direção. Ao voltar-me novamente, não mais vi o tal convidado. Procurei, com os olhos, mas não o encontrei.

- ‘Coisa mais estranha’, pensei. ‘Por que me olhava assim? Isso não pode ser normal. Devo estar mesmo bêbado.’

Saí logo em seguida.

Minha perturbação não durou muito. A caminho de casa, já não pensava mais naquele pequeno acontecimento. Em muito poucos minutos esquecia o incidente e voltava ao meu estado normal. Eu também não gosto de conduzir e o trânsito deixa-me tenso, por isso tento não pensar muito, quando estou no carro.

Já em casa, voltei à minha condição normal de eremita. Livrei-me das roupas formais e vesti um pijama, disposto já a preparar-me para deitar. Quase esquecia que a manga do casaco precisava secar direito, antes de ser pendurado de volta no armário, por isso, assim que escovei os dentes e preparei-me para dormir, voltei à sala e deixei-o sobre o encosto de uma cadeira.

Adormeci tão rápido que nem tive tempo de pensar em mais nada. Nem vi quando o gato subiu na cama e deitou-se aos meus pés…

***

Ele levantou a taça de vinho tinto e sorriu. Eu tentei desviar o olhar, mas não consegui. Havia algo em seu olhar que me deixava intrigado e, ao mesmo tempo, assustado. Ele moveu os lábios, como se a dizer algo, mas não ouvi nenhum som. O que ele tentava dizer-me? Seria importante? O que ele quer de mim?

Alguém passou na minha frente e aquela distração quebrou o contato visual. Quando voltei o olhar, ele já não se encontrava.

Déjà vu…

- ‘Isso já aconteceu antes’, falei em voz alta.

- Mas não desta forma…

Dei um salto. Não esperava que alguém me ouvisse.

O homem que estava ao meu lado ofereceu-me uma taça de vinho tinto, sem dizer mais nada. Eu tomei a taça e levei aos lábios, mantendo o contacto visual com ele. Ele sorriu de uma maneira estranha. Eu percebi que havia algo errado e olhei para o conteúdo da taça, que caiu da minha mão, assim que percebi tratar-se de outra coisa…

O denso e rubro sangue que estava nela respingou pelo chão e nas minhas roupas, assim que o cristal partiu-se em milhões de pedaços, contra o granito escuro do piso...

Acordei sobressaltado, com um grito, suando e ofegante como um animal depois de uma longa corrida.

- Merda! Foi um sonho…

Não havia pensado em como aquele incidente havia deixado uma marca tão grande no meu subconsciente, voltando à tona durante meu sono...

***

Minha volta à rotina, já de amanhã, tratou logo de manter minha mente ocupada com o trabalho e meus afazeres normais, pelo menos até a noite. Às vezes, porém, quando distraía-me, tinha a sensação que via aqueles olhos a espreitarem de algum lugar, que eu não conseguia realmente distinguir, mas cheguei à conclusão que não passava de uma mera impressão… peças que a mente prega na gente…

Na saída do trabalho, fui até a estação de metro, pois nunca ia ao centro de carro, pelas dificuldades de achar vagas e, também, devido ao custo para estacionar. Era muito mais prático ir de metro. O sistema funcionava bem e, além de ser prático, era também bastante eficiente e barato.

Desci as escadas e fui para a plataforma, que já estava bastante movimentada, àquela hora da tarde. É engraçado ficar a observar os transeuntes entrarem e saírem dos veículos e imaginar para onde vão e de onde vêem, com suas histórias, seus problemas, suas alegrias, seus desejos…

Estava distraído a olhar um casal que conversava animadamente à minha frente, quando o veículo chegou na plataforma do lado oposto. Minha atenção foi naturalmente direcionada para aquele lado e fiquei a olhar as pessoas a movimentarem-se até o grupo de vagões partir, tão rapidamente quanto veio. A figura vestida de negro a olhar para mim, com uma fixação tão evidente, causou-me um óbvio desconforto. Fiquei sem ação por uns segundos, até que percebi que ele fez uma vénia com a cabeça e mexeu os lábios como se estivesse a dizer-me algo. Franzi o cenho, sem responder ao cumprimento. 

O vagão do metro parou à minha frente e o foco da minha atenção foi logo desviado. Entrei no veículo e olhei pela janela, mas já não vi ninguém na plataforma oposta. Eu não havia-me enganado. Ele esteve lá e eu já sentia-me sendo perseguido.

- Que droga! Outra vez…

A moça, de pé ao meu lado, riu-se, ao ouvir-me e perceber que falava sozinho.

***

- Por que tu usas esta camisa horrível para dormir?

- O quê? Como é que…

A voz do outro lado da linha telefónica era rouca, mas parecia tranquila, quase provocadora, como se o interlocutor quisesse somente mostrar que sabia do que falava, mas não queria causar um desnecessário furor.

As luzes estavam apagadas e não lembrava de haver vestido aquela peça de vestuário antes de chegar ao quarto, já pronto para deitar. As cortinas estavam fechadas, por isso não compreendi, de imediato, como alguém poderia saber que eu estava vestido com aquela camisa listrada de várias cores, que eu mesmo admitia ser ridícula, mas era confortável para dormir, afinal.

Não acendi as luzes. Virei-me para o lado e procurei algum brilho estranho, como o que delata uma câmara escondida, mas não vi nenhum. Como é que aquela criatura sabia o que se passava dentro do meu quarto. Sentei-me na cama, sem acender as luzes. O gato pulou dos pés da cama, onde estava aninhado e olhou-me a caminho da porta, iluminado pela parca claridade do telefone que eu segurava.

- Não deixes que o gatinho fique sem água. Ele deve ter sede.

- O quê? Que brincadeira é essa?

O sinal de que a linha foi desligada seguiu-se e, para minha surpresa, o gato voltou ao quarto, mas não deitou-se. Fez menção de sair, como fazia quando queria alguma coisa e eu segui-o até a cozinha. Ele parou e olhou-me, sentando-se sobre o tapete azul, onde a tigela de água jazia, vazia, para meu completo espanto.

Enchi aquela e, também, um grande vidro vazio de café solúvel que sempre mantenho cheio de água, em cima da pia, perguntando-me como é que haviam ficado vazios, se ninguém, a não ser eu, tinha acesso ao apartamento. Sacudi a cabeça, como se a afastar um mau pensamento e voltei para a cama, disposto a não mais pensar naquilo, ou não conseguiria dormir.

Seis minutos depois de deitar-me, não exatamente para minha surpresa, o telefone tocou outra vez…

Ouvi a respiração pesada, do outro lado da linha. A mesma voz rouca falou, com tranquilidade, mas firmemente.

- Espero haver-te convencido que temos coisas a conversar. Devemos nos encontrar amanhã à hora do almoço. Não faltes…

- Mas, onde?

- Não te preocupes com isso…


***

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Revisitando Dragões (Parte final: A Batalha)


O sol nasceu como que por encanto. Não que fosse uma coisa inesperada, mas a tensão do momento, pareceu fazer os guardiães esquecerem que o nascer do dia não era a coisa mais natural do mundo. Era como se tivessem tido um lapso de tempo entre a espera e aquele momento, quando um verdadeiro caos se instalou no laranjal.

 A chegada do guerreiro de negro e seu fiel dragão causou uma correria geral.

 Os sete dragões alinharam-se à volta do grande animal pardo, quando este pousou. Era parte da estratégia de distração, mostrar-se mais suscetível, para que sua contraparte estivesse mais liberta, para trazer o terceiro elemento para a batalha, que estava apenas a iniciar-se.

Em seu caminho, porém, o guerreiro encontrava um pai protetor e disposto a tudo para ter o filho do seu lado e um velho cavaleiro, disposto a sacrificar a vida para derrotar o senhor de todo o mal.

 Os dois homens acorreram, tentando impedir a ação do guerreiro inimigo, quando perceberam que ele veio para libertar seu protegido e fazê-lo cumprir sua missão, antes de voltar para o gélido norte.

A investida do guerreiro loiro, entretanto, foi tão violenta, que os homens foram jogados para o lado, como se fossem crianças desajeitadas, quando ele abriu seu caminho para a entrada da caverna, onde seu pupilo estava preso ainda.

A espada do senhor de todo o mal partiu a porta da caverna com um golpe só. O rapaz saiu imediatamente e, apanhando sua própria espada, que estava do lado de fora, tomou lugar ao lado de seu senhor, numa batalha que teria um inevitável e único final.

Por mais que estivessem em vantagem de número, o pai e o amigo estavam, todavia, em evidente desvantagem, tanto pela força e violência dos ataques, quanto pelo treinamento que os dois guerreiros possuíam, bem diferente deles.

Os dragões avançaram contra o pardo, tentando imobilizar seus movimentos, mas sabiam o quão perigoso e poderoso aquele animal era, pois além de ser superior em tamanho e força, era também mais bem preparado que eles, em batalhas contra homens e animais, desde há muito tempo. 

O caçador e o velho retomaram suas posições e a verdadeira luta começou. Nem um nem outro podia antecipar a força com que seus contendores iam atacá-los, mas não foi pouca e, por conseguinte, difícil de segurar por muito tempo. Viram, logo, que estavam em desvantagem e aquela consciência deixou-os, de certa forma, amedrontados.

Os adversários perceberam a fraqueza e, mesmo sem falarem nada, usaram suas forças e habilidades contra os dois homens, que foram derrubados com facilidade.

O tirano ocupou-se do pai do rapaz, enquanto aquele estava a lutar contra o velho cavaleiro. As forças eram praticamente incomparáveis, mas a resistência e o instinto de sobrevivência eram maiores que eles podiam imaginar, por isso tentavam, pelo menos, defender-se. Mas o velho não tinha mais a mesma força de antes e caiu.

O dragão verde-azulado foi em socorro do velho.

O dragão pardo, usando sua habilidade e vigor, logo conseguiu libertar-se, aproveitando a oportunidade e a quebra do círculo de força que os sete mantinham, quando estavam juntos.

Ao chegar perto, o verde-azulado empurrou o rapaz de cima de seu amigo, com uma violência a que ele não era acostumado, de modo a livrar o velho da ponta da espada do outro.

O rapaz caiu de frente, com sua arma na mão. Mesmo com o golpe violento, ele apenas ficou meio atordoado, mas não o suficiente para sentir-se derrotado. Era forte e robusto, muito bem treinado e disposto.

Quando tentou levantar-se, porém, ele sentiu a pressão da garra no seu braço e não teve dúvidas. Agarrou a espada com muita força e desferiu um golpe na pata do dragão, que ficou seriamente ferida, esguichando sangue em grande volume. O guerreiro levantou-se rapidamente, disposto a acabar com o animal, que urrava de dor.

O dragão verde-azulado estava com os olhos arregalados a olhar a cena, de longe, tão surpreso quanto o velho, que erguia-se do chão, um tanto desajeitado.

O guerreiro negro vinha correndo em sua direção com a espada em punho, soltando imprecativos em alta voz, ao ver o dragão pardo seriamente ferido, por engano, quando tentava ajudar o jovem protegido. O homem na armadura negra avançou contra o rapaz, com todo seu ódio afluindo para a arma em suas duas mãos.

O rapaz tentou afastar-se, mas não foi bem-sucedido. O outro foi muito rápido. O impacto foi grande e ele perdeu o equilíbrio, caindo de costas no chão, tentando, com sua espada e com toda a sua força, segurar a ira de seu tutor. Espada contra espada, ele sentiu que começava a perder espaço e a sentir a lâmina afiada quase a tocar-lhe a pele.

O homem estava irascível. O dragão era parte dele e feri-lo seria o mesmo que ferir ao senhor dele. O rapaz nem conseguia dizer nada, apenas tentava conter a força extraordinária do homem, mesmo sabendo que ia perder.

No meio do esforço descomunal que fazia para conter a ira do seu tutor, o rapaz balbuciou o que pode, tentando redimir-se.  

- Eu sinto muito! Pensei que fosse o outro dragão…

- Tua missão era destruir os dragões… aqueles sete dragões! Eliminá-los completamente! Não era para ferir o grande dragão pardo, rapaz estúpido!

 - Eu sinto muito!

 De repente, o homem, que estava com o rosto muito próximo do rapaz, impelindo a espada contra seu pescoço, arregalou os olhos e afrouxou a força que estava fazendo. O rapaz empurrou-o para o lado e levantou-se, deixando o outro a cair pesadamente sobre o solo.

 De pé, o pai olhava os dois, com o cajado firmemente seguro em suas mãos, após haver batido com aquele na cabeça do guerreiro de negro, seu poderoso inimigo e tutor do filho que, então, mostrava-se completamente confuso, como se não compreendesse perfeitamente o que acabara de acontecer.

Mas o guerreiro de negro não era um páreo fácil, nem desistia sem conseguir o que queria. Rapidamente levantou-se e, com a espada em riste, avançou contra o pai e o filho.

Ambos prepararam-se, quase sem ter muito tempo para voltar a reagir, antes que a arma do homem loiro cortasse o ar com velocidade e violência, atingindo o cajado e a espada, ao mesmo tempo, destruindo o primeiro e fragmentando o metal da segunda, como se fosse feito de material extremamente frágil. O rapaz ficou sem ação. O pai caiu de lado, ao ser empurrado com os pés, pelo homem tomado de fúria combativa.

Sem o cajado e sem poder defender-se propriamente, o homem, mesmo assim, partiu para cima do guerreiro loiro, que desviou-se facilmente, deixando o outro a abraçar o ar e perder o equilíbrio. O senhor de todo o mal voltou-se e partiu para cima do rapaz, que já havia levantado, mas estava desarmado. Ao aproximar-se, ouviu um grito atrás de si e viu que o velho trazia uma espada em sua mão e atirava ao rapaz, que agarrou-a com destreza de um bom e bem treinado guerreiro.

O ato foi apenas em tempo suficiente para defender-se, ainda que mal defendido. O rapaz e seu tutor lutavam um contra o outro com violência, mas o primeiro sabia que estava em desvantagem. Quando aproximaram-se a forçar as espadas, uma contra a outra, o rapaz falou:

- Por que lutamos? Estamos ambos do mesmo lado.

 - Nunca estivemos do mesmo lado! Eu usei-te para conseguir o que queria, mas tu não foste destro suficiente para cumprir a missão e, ainda assim, feriste o dragão errado.

 - Mas não foi de propósito!

O guerreiro de negro empurrou o rapaz e voltou à carga com mais violência, tentando atingir e exterminar seu concorrente.

O jovem estava confuso. Fez o que pode para satisfazer os desígnios de seu tutor, foi-lhe fiel e um exímio aluno e, via-se sendo atacado pelo mesmo, como se fosse um inimigo.

O velho, percebendo o perigo, acudiu o pai do rapaz. Ambos partiram para cima do senhor de todo o mal, juntos e dispostos a morrer para salvar o filho e amigo. Com a atenção desviada da luta contra seu pupilo, o guerreiro loiro voltou-se à sua própria defesa, mas percebendo que os atacantes vinham sem armas, tratou de avançar contra os dois, derrubando-os imediatamente, um sobre o outro, e posicionando a espada no pescoço do caçador, de modo que se trespassasse um, atingiria o que estava por baixo. O rapaz percebeu que tinha que fazer algo e partiu para cima, mas o homem gritou:

- Se chegares mais perto, eu mato os dois. Eu posso morrer, mas, antes, eles vão comigo. 

 O rapaz parou a meio caminho. Tinha que fazer algo, mas estava em desvantagem. Não estava sendo bem recebido do lado de seu tutor e estava sendo defendido pelo seu pai e o velho amigo, os quais haviam abandonado a busca, há muito tempo atrás, deixando-o à mercê do inimigo e senhor de todo o mal.

Sentia-se só, abandonado e enganado, mas algo queimava seu peito, com o calor de um estranho fogo. A espada em sua mão tremeu. O amuleto pendurado em seu pescoço e tocando seu jovem peito ardia como se estivesse fervente. O rapaz, então, parou e percebeu que os dragões haviam-se aproximado.

O grande dragão pardo, ferido gravemente, não conseguia ter forças para atacar. Alguns dos dragões, incluindo o verde-azulado, mantinham a vigília sobre a fera ferida. 

Os três dragões mais jovens, o negro, o dourado e o albino colocaram-se à volta do grupo, mas sem mostrar quaisquer formas de ameaça.

O dragão negro fez um sinal com a cabeça, olhando o rapaz. Este não percebeu imediatamente o gesto, mantendo os olhos firmes nos animais e nos homens, que formavam um grupo bizarro à sua frente. O amuleto queimava sua pele. Ele passou a mão no peito e sentiu-se estranhamente diferente. Olhou todos, aproximou-se dos três homens e falou, baixando a espada e deixando-a cair aos seus pés.

- Deixa-os ir. Eu me entrego no lugar deles. Vou lutar ao teu lado até os fins dos meus dias, mas deixa-os viver! Tens a minha palavra de honra.

O guerreiro ficou tão surpreso quanto o pai e o velho amigo.

O dragão negro acedeu com a cabeça. Ele sabia por qual razão o rapaz havia tomado aquela atitude. Era necessário ter muita força de espírito e caráter para tomar uma decisão daquelas, no meio daquela confusão de personagens, de sentimentos e de atitudes contraditórias.

O rapaz baixou os braços e aproximou-se. O guerreiro de negro ainda hesitou um pouco e então, levantando-se lentamente, mostrou que aceitava a oferta.

 Os dois homens levantaram-se e tentaram, ainda, defender aquela atitude com um ataque ao senhor de todo o mal, mas o rapaz gritou com eles e disse-lhes:

- Eu dei minha palavra. E ela foi dada em troca das vossas vidas. Não vou voltar atrás. Ajudem-me a acudir o dragão pardo, que está ferido. Nós partimos assim que ele recuperar suas forças.

Seu tutor, mesmo estando entre estar desconfiado e acreditar na honra do rapaz, afastou-se, mantendo-se de frente, enquanto o grupo acudia a fera ensanguentada. O pobre dragão estava com a pata bastante cortada e precisou de um torniquete e umas bandagens, mas a não ser por um certa fraqueza causada pela perda de sangue, não estava impedido de voar.

Os dois guerreiros passaram a noite a vigiar, para terem certeza que não iam ser surpreendidos e prepararam-se para partir ao amanhecer, sem se despedir de ninguém.

O dragão negro, entretanto, aproximou-se do rapaz e fez um aceno com a cabeça, numa demonstração de afeto e de aceitação daquele destino, mas, ao mesmo tempo de apoio. De uma forma muito discreta, transmitia a mensagem de que estava disponível, se necessário fosse.

O rapaz passou a mão à volta do pescoço e retirou o amuleto que ali estava pendurado e estendeu-o ao dragão, mas este não aceitou, empurrando a mão do rapaz de volta ao seu pescoço. Este percebeu o que a animal quis traduzir.

O amuleto era seu por direito. Era o único vínculo que ficaria vivo entre os dois lados – o bem e o mal – a lembrar que não há um lado sem o outro e que mesmo o mal precisa do bem para equilibrar-se no Universo.

O rapaz repôs o amuleto à volta do pescoço e foi de encontro ao seu mentor e ao dragão pardo, que estava pronto a partir. Deu uma última olhada para trás e fez um aceno com a cabeça, que foi repetido pelo jovem dragão negro.

 Quando o pai e o velho amigo despertaram, o trio já ia alto no céu, viajando contra a luz do sol da manhã.

Um aperto nos corações dos dois foi, também, compartilhado pelos sete dragões.

Todos os personagens sentiram que aquele não era um fim definitivo, mas sabiam que aquela decisão tinha consequências graves no futuro de todos.

Lá longe, no alto do azul cerúleo da manhã, sobre as costas largas do dragão pardo, o rapaz mantinha seus olhos à frente, tentando não deixar que aquelas lágrimas que inundavam seus olhos, sua mente e seu coração, fossem percebidas pelo seu mentor, que sentara-se no dorso do grande animal, um pouco à sua frente.

A viagem para o extremo norte ia ser longa. Também ia ser muito fria, como o coração do senhor de todo o mal…

O guerreiro loiro esboçou um leve sorriso. Havia ganho mais uma batalha. Aquela era uma das mais importantes que ele travara, mas a guerra não estava terminada…

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Azul




Se for Azul,

Que eu seja Céu!


domingo, 22 de janeiro de 2017

Revisitando Dragões (Parte 5 - Amuleto)


Nos olhos do rapaz, aquela mistura de ódio e mágoa deixavam claras as suas intenções. Ele tinha uma missão – uma tarefa a cumprir, para concluir seu rito de passagem, que havia iniciado com uma batalha sangrenta, não muito antes de chegar ao seu último destino.

Não era apenas uma transição para a idade adulta. Era mais uma confirmação de que havia passado, definitivamente, para o lado do guerreiro de negro. Uma vez que ele estivesse do lado de lá, não haveria volta e ele sabia. Era com isso que seu mentor e senhor de todo o mal contava.

Avançando contra o velho, que mantinha-se impávido, sem demonstrar nenhuma intenção de mover-se, ainda com o dragão verde-azulado desacordado a seus pés, o jovem guerreiro descarregava seu desgosto contra a injustiça que acreditava ter sido feita, quando seus antigos amigos deixaram de procurá-lo.

Ele havia sacrificado sua infância e boa parte de sua adolescência, para proteger seu pai, sua família e seus amigos que, afinal, deixaram-no à mercê do mal e de seus mais poderosos asseclas. Agora, passado tanto tempo, sentia que o sacrifício havia sido em vão, pois nunca existira uma contrapartida. O mal o havia acolhido e adotado, como quem o faz à uma criança órfã.

Felizmente ele era, agora, um guerreiro bem treinado em batalhas contra grandes e poderosos inimigos, sem medo de nada e dominado pelas forças do mal. Aquelas características tornavam-no, não somente poderoso, mas, também, totalmente temerário por onde passava.

O mais perigoso tipo de guerreiro não é o que sabe melhor empunhar uma espada ou outra arma qualquer nas lutas, mas aquele que não respeita as regras, não teme a morte, nem sente pesar por quem quer que seja. Estes são capazes de tudo, pois não têm nada a perder.

Ele não tinha nada a perder e nem temia a nada… nem a ninguém.

O velho fechou os olhos e esperou. Chegou a sentir a ponta da lâmina a tocar seu peito, no mesmo lugar onde uma antiga cicatriz ainda latejava, por vezes. Mas a espada não penetrou seu corpo. Ele sentiu o frio contacto do metal na pele e esperou pelo golpe fatal. No fundo, quase desejava por aquele destino. Sentia-se culpado por não haver procurado o rapaz, mais insistentemente, até conseguir trazê-lo de volta para o mundo ao qual pertencia. No fundo achava-se merecedor de um castigo e sentia que não devia lutar contra aquela sentença. Era sua conta a pagar…

O homem abriu os olhos e fitou os daquele que outrora havia sido seu protegido, mas que agora agia como seu carrasco. Eles tinham um brilho estranho. A face trazia um misto de rancor e angústia. A boca estava estranhamente contorcida. Mas a mão do guerreiro tremia, como se hesitasse ou fosse impedido de dar o empuxo final. Ele sentia a lâmina a arranhar sua pele e um pequeno corte abrir-se, deixando um estreito fio de sangue quente e viscoso a escorrer-lhe vagarosamente pelo torso abaixo.

Foi então que o mundo pareceu-lhe revirar completamente ante seus olhos. A espada foi atirada para cima com tamanha violência, que o rapaz perdeu o equilíbrio e caiu para trás. Uma grande e escamosa pata verde-azulada pousou sobre seu peito, imobilizando-o completamente, com um peso descomunal e causando-lhe sufocamento, por falta de ar.

O velho olhou para o lado, já prevendo a reação do grande dragão pardo, mas aquele estava cercado por seis outros dragões, cada um de uma cor distinta. Atrás dos mesmos, uma face conhecida surgia, com armas de combate nas mãos e correndo em sua direção.

O recém-chegado olhou o rapaz caído no chão e perguntou ao velho:

- Quem é este, afinal?

O velho respirou fundo e disse:

- Aquele que pensávamos estar morto, mas que nunca devíamos ter desistido de procurar: teu filho mais novo!

***

Apesar de amarrado e de estar sob cuidadosa vigilância, o rapaz não parecia sentir-se derrotado. Havia nele uma certa arrogância, como se soubesse de algo que os outros não sabiam. Que trunfo ele possuía, era um mistério que os dois homens não conseguiam perceber.

O pai estava com sentimentos divididos entre a culpa e o amor, tentando perdoar a investida do filho e arranjar desculpas para aquela mudança tão radical. Tinha esperança que o amor que o abandonara fosse mais forte que o mal que o acolhera, mas também sabia que teria muito trabalho para convencer o rapaz a entender seus motivos. Os filhos e os pais quase nunca conseguem entender as razões que movem as ações de um e do outro.

O velho estava assustado. Tinha medo que a imprevisibilidade do rapaz colocasse as vidas dos outros dragões em risco. O verde-azulado já havia sofrido seu tanto e não era merecedor daquilo. O pobre animal precisava apenas de alguma paz, naquela fase de sua longa e atribulada vida, não de mais conflitos e sofrimento.

O rapaz havia mudado profundamente e aquela transformação era extremamente perigosa… para todos.

Os devaneios dos dois homens foram interrompidos por uma grande barulheira do lado de fora. Os dois correram até a clareira, onde o grande dragão pardo havia sido acorrentado firmemente.

Não foi nenhuma surpresa que o dragão aprisionado houvesse escapado e que os outros estivessem tão estupefactos quanto os dois homens. Dois dos dragões, o prateado e o vermelho, haviam sido feridos pela grande fera e estavam a ser acudidos pelos outros, que decidiram ser uma melhor atitude do que perseguir o inimigo, pois sabiam não ter a mínima hipótese de alcançá-lo.

- Isso complica, demasiadamente, as coisas…

- Muito mesmo! Melhor nós verificarmos o nosso ‘prisioneiro’. Eu sabia que algo estava errado.

O rapaz sorria. Era um sorriso estranho. Malicioso. Triunfante.

Embora não tivesse presenciado o que ocorrera lá fora, tinha consciência da fuga do dragão e das consequências que aquele acontecimento teria. Ao chegar sozinho ao seu destino, o animal seria porta-voz das más notícias ao seu senhor. Era de esperar que houvesse uma reação imediata, por parte do guerreiro de negro, um homem extremamente poderoso e vingativo.

Era premente, entretanto, tratar dos animais feridos, antes que o outro voltasse com reforços. Todas as forças do bem tinham que estar preparadas para a retaliação do mal, o que não seria um combate fácil de travar.

***

Não era de estranhar que o rapaz parecesse tão fora de contexto como naquela ocasião. Sabia que estava preso, mas mantinha uma atitude presunçosa e longe de parecer derrotista. Ele tinha uma missão, afinal, que somente ele e seu protetor sabiam. A esperança de ser liberto e salvo pelo guerreiro de negro era grande e quase uma certeza de sua parte. Se ele o fosse, porém, todos sabiam que ele estaria total e definitivamente voltado para o lado do mal.

Para o pai e também para seu velho amigo, ele era instável e perigoso como um animal selvagem, aprisionado e prestes a enfrentar a tudo e a todos para salvar sua pele. Ainda severamente magoado pelos acontecimentos do passado, era capaz de tudo.

Veio a noite e, com ela, a densa e imprevisível escuridão. Toda e cada hora, minuto e segundo, eram preciosos e imponderáveis. Tudo podia acontecer de um momento para o outro, por isso uma cuidadosa vigília era indispensável.

Os dragões tomaram turnos à porta da caverna, onde o rapaz era mantido prisioneiro.

A madrugada demorava a chegar e ele era atormentado por expectativas, como as que tinha quando esteve prisioneiro do senhor de todo o mal. Ele não dormia um sono tranquilo. Era acordado muitas vezes por qualquer ruído mínimo que atingisse seus ouvidos treinados. Ele levantou a cabeça e olhou para fora, tentando focar a vista na entrada da caverna, onde uma silhueta recortou-se contra a faixa muito ténue de luz que subia por trás do laranjal, anunciando a chegada do dia. À aquela, juntaram-se outras duas, muito semelhantes.

Ele sentou-se e ficou quieto a observar. Quando conseguiu acostumar a visão à pouca luz, percebeu que os três dragões mais jovens, encarregados da vigília daquela noite, estavam ocupados a bicar um objeto conhecido dele. O dragão negro, conseguiu quebrar o pequeno lacre de cera que havia na empunhadura da espada que pertencia ao jovem guerreiro, revelando um pequeno objeto oculto por baixo daquele, numa pequena cavidade feita com o propósito de esconder, de tudo e de todos, um amuleto, que eles lhe haviam dado, ao que parecia haver sido há uma eternidade atrás.

Com a ponta da unha, o dragão recolheu o pequeno amuleto e estendeu ao rapaz, através da grade à porta da caverna. O rapaz segurou-o na palma da mão e lembrou, pela primeira vez, desde muito, por qual razão havia escondido o presente recebido para sua proteção. Ele fechou os olhos e ficou em silêncio por uns momentos. Depois abriu os olhos e a mão, novamente, olhou para fora e atirou o minúsculo objeto para longe de si. O dragão recolheu o amuleto do chão e devolveu-o ao seu legítimo dono, mais uma vez. Por mais que tentasse negar ou refutar, aquele pequeno presente era seu. Por mais que ele quisesse acreditar que odiava aqueles personagens e tudo o que vinha deles, não podia negar seu passado.

O jovem guerreiro atirou o objeto mais uma vez para longe e mais vez o dragão recolheu-o e devolveu-o a ele. Ele percebeu que o animal não desistiria enquanto ele não ficasse com o que lhe pertencia. Então, para evitar repetir a ação, pendurou-o no pescoço. O dragão negro acedeu com a cabeça e afastou-se um pouco da porta.

A luz da madrugada já fazia a paisagem mais visível, especialmente o céu. O rapaz olhou para cima e seus olhos avistaram, muito ao longe, uma estranha figura vindo, por detrás das brancas nuvens, pouco iluminadas pelo sol da manhã.  

Ele sorriu. Faltava pouco, agora.


***

sábado, 17 de dezembro de 2016

Revisitando Dragões (Parte 4 - Crescer e Lutar)



Ante o olhar incrédulo do velho amigo, o menino falou, com voz muito baixa, quase inaudível.

- Este é o homem que me tem aparecido nos sonhos, nos últimos dias…

- Então sabes porque estou aqui. Nós temos um acordo. Eu cumpro a minha parte, na condição que tu cumpras a tua! Tu sabes os termos e as consequências do nosso acordo, portanto não há o que decidir….

O menino acedeu, balançando a cabeça afirmativamente e deu um passo adiante.

- Eu tenho que ir com ele, ou eles destroem tudo e matam a todos vocês.

- O quê?

- O mal sempre encontra seus próprios meios de superar as expectativas inocentes do bem… Para uma criança nesta idade, ele sabe negociar muito bem. Deves ter muito orgulho dele.

O velho, numa reacção normal de lutador, tentou alcançar a arma, que estava apoiada na sua antiga armadura, mas o guerreiro, bem mais jovem e preparado que ele, foi mais rápido e impediu-o com um golpe de sua própria espada, derrubando o homem e imobilizando-o completamente.

O guerreiro loiro e vestido de negro, então, tomou o menino pelo braço e saiu com o mesmo até o lado de fora, onde o grande dragão pardo os aguardava. Ao seu lado, o dragão verde-azulado jazia desacordado. Havia sido surpreendido pelo outro animal, que sendo maior e mais forte, vencera-o com facilidade, deixando-o inconsciente, por tempo suficiente de saírem sem serem importunados ou impedidos de escapar.

Diante do olhar do pai, manietado e sem poder de acção, o homem de negro partiu, levando o menino consigo, os dois montados no grande dragão pardo. Quando o velho conseguiu chegar ao lado de fora, para acudir o outro homem e seu amigo alado, já era tarde demais e já não havia sinal dos três à vista. 

- Temos que ir atrás deles!

- Não sei se vai adiantar. Nunca chegaremos antes deles… e duvido que estejam indo para o lugar mais óbvio que existe. Não os encontraremos tão facilmente.

- Mas temos que tentar… já!!!

- E nós vamos… mas precisamos de toda a ajuda que pudermos, nesta difícil tarefa… É uma certeza que sete dragões farão uma busca mais eficiente que um, somente.

***

A busca, realmente, não foi nada fácil, como eles já pressentiam. Foram até ao extremo norte, nos confins da região mais gelada, mas não encontraram quem buscavam. A terra parecia modificar-se magicamente, de modo a impedir que fossem achados, cada vez que eles a percorriam. Por mais que tentassem, não conseguiam encontrar nenhum dos personagens que partiram juntos naquele dia.

No ponto mais extremo do Pólo Norte, onde a curvatura da terra ilude o olhar, abre-se uma cratera, que leva ao reino secreto, onde vive o senhor de todo o mal e seu fiel e gigantesco animal de companhia, o dragão pardo. O paradeiro exacto do seu reino é impossível de ser detectado, a não ser por quem tem permissão para tal.

Quando levou o pequeno guardião para o seu reino, a intenção do guerreiro de negro era treiná-lo, para ser um dos seus. O homem sabia que o poder contido naquela criança era imenso e só aumentaria com o tempo. Ao invés de pensar em destruir, o que não seria uma tarefa muito fácil, ele conjecturou que, se aquela capacidade pudesse ser utilizada para combater as forças opostas, ele teria, lutando ao seu lado, o ser mais poderoso do planeta e, talvez, com o tempo, eliminasse a carga da profecia. Os opostos poderiam unir-se, ao invés de combaterem um contra o outro, evitando, assim, a destruição de um ou do outro… ou de ambos... Aquele era o princípio do equilíbrio.

O menino sabia, instintivamente, que não deveria ser libertado tão cedo, por isso mostrou-se aberto a colaborar, antevendo os benefícios de um treinamento com o lado oposto ao que já havia iniciado a aprender, quando estava com seus amigos. Se conseguisse distinguir as forças e, também, as fraquezas do mal, poderia aproveitar-se daquele conhecimento, quando fosse necessário combatê-lo. Embora fosse apenas um menino, sentia que já havia dentro de si um guerreiro em rápida formação. Não tinha ideia, porém, de quão exímio poderia tornar-se.

Ele tinha a protecção do pequeno amuleto, dado pelos dragões, que só usava à noite, quando estava a sós em seus aposentos. Além de ser seu único contacto com a vida que deixou para trás, não por desejo, mas por falta de opção, era também seu consolo e esperança de um dia poder voltar aos seus amigos e família.

As forças do mal, porém, são poderosas e muito atraentes. Muitas vezes sentiu- se tentado a abandonar a esperança e cumprir a sina que o destino redesenhara para ele. O guerreiro de negro satisfazia-se com o progresso do rapaz, cada vez mais, com o passar dos tempos. Os dias tornaram-se semanas e, estas, transformaram-se em sequências de meses… longos meses…

Os mesmos longos meses tornaram-se, então, estações completas.

Veio o Outono, trazendo seus ventos frios e fortes, proporcionando a limpeza da natureza. Seguiu-se o impiedoso Inverno, a bela Primavera e o lânguido Verão… Depois a sequência foi-se repetindo até o dia em que ele recebeu uma espada verdadeira como presente de seu novo mentor. Era uma prova de imensa confiança do poderoso guerreiro de negro. A lâmina da espada fora forjada no fogo das profundezas da terra e havia sido temperada com o fogo do dragão pardo. Era uma arma poderosa e praticamente invencível, sendo uma versão mais actual daquela que o guerreiro e senhor de todo o mal portava. Três Invernos haviam-se passado e o rapaz tornara-se um adolescente, com o corpo e a mente em rápida mudança. 
 
Para conservar o poderoso amuleto sempre junto a si, sem perder o contacto com o mesmo, o rapaz abriu uma cavidade no cabo da espada e introduziu o pequeno objecto protector dentro dela, cobrindo, a seguir, o espaço com cera de abelhas e uma faixa de couro negro. Assim mantinha-se em contacto indirecto com o mesmo, pois percebeu que as forças do mal eram extremamente poderosas e ele começou a sentir-se muito atraído pelo lado obscuro. Com aquele gesto, tentava não afastar-se totalmente o talismã, mas sabia que o tempo poderia fazê-lo esquecer do que representava.

Mais quatro longas sequências de quatro estações completas passaram-se. Ele conheceu o lado mais perverso do mal e foi sábia e extenuadamente treinado para tanto. Aprendeu a distinguir as fraquezas e as forças do lado de lá, bem como a combater todo o bem.

Naquele Inverno, o sétimo desde que chegara, o rapaz foi presenteado com uma armadura negra, para usar no seu primeiro combate contra as tribos no norte. Era mais uma prova de que seu mentor confiava nele. E ele não decepcionou seu mestre.

Na luta, os inimigos foram dizimados facilmente. O jovem guerreiro combatia com a fúria e a destreza de um adulto enlouquecido e movido pelo mal. Vestido na armadura negra, ele empunhou a espada dada por seu antigo algoz - agora protector -, com toda a habilidade de um adulto. Seus pouco mais de dezasseis anos escondiam, debaixo da camada de músculos desenvolvidos e dos longos cabelos e barba, a antiga face da inocência, já totalmente irreconhecível, naquele momento. A força e o poder que habitavam no rapaz haviam aumentado sem precedentes. A ideia de trazer aquela força e poder para o lado do mal havia sido a perfeição, o que muito comprazia o senhor de todo o mal, que, agora, tornara-se o único mentor e protector do guerreiro mais poderoso da terra.

O menino de outrora já não existia e nem voltaria a ser o mesmo. Tornara-se um vigoroso jovem e devia voltar para a terra donde nasceu e viveu até ter sido levado por longos sete anos. A prova de fogo havia sido designada por seu treinador, para garantir seu reconhecimento definitivo. Era seu rito final de passagem e a missão mais importante a ser ultimada.

Ele devia voltar ao laranjal.

Montado num enorme dragão pardo, ao chegar à clareira, ele foi confrontado pelo dragão verde-azulado, mas a fera alimentada pelo mal era bem mais forte e, no ataque, deixou o outro gravemente ferido, com golpes de suas garras afiadas e envenenadas.

O dragão da esperança caiu contra o chão da clareira, desfalecendo imediatamente. Um velho homem, desesperado, correu para acudir o amigo, sem reconhecer o guerreiro que atacou-o, montado no grande animal alado e vestido com uma pesada armadura negra, a observá-los do alto.

O homem amaldiçoou aos dois, jurando que não ia descansar enquanto não os destruísse. Mal sabia ele que fazia uma promessa que jamais teria forças ou poderes para cumprir.

O jovem guerreiro deu instruções ao dragão para pousar, apeou e veio para perto do homem, empunhando a espada. O dragão pardo ficou a observar, de longe.

O rapaz tocou o corpo do animal inconsciente com a ponta da espada e sentiu que algo em seu punho estremeceu, impedindo-o de ferir, ainda mais, o pobre animal caído. Ele, então, arrancou a proteção que lhe cobria a cabeça e mostrou a face de um jovem maltratado pelo tempo e pelo frio, com longos cabelos emaranhados e barba arruivada e bastante crescida.

Uma lufada de vento soprou-lhe os cabelos para longe dos olhos e ele observou o velho homem, com cuidado. O outro percebeu uma familiaridade no olhar do rapaz, levantou-se de onde estava e encarou-o, incrédulo.

- Não pode ser! Isso é realmente incrível!

***

- Passamos tanto tempo a procurar e nunca conseguimos encontrar-te. Nós pensávamos que havias morrido. É um verdadeiro milagre!

O homem adiantou-se para abraçar o rapaz, mas aquele manteve-se impávido e deu um passo atrás, como se a repudiar o gesto do velho. O rapaz, então, falou, muito pausadamente.

- Sete longos anos… é muito tempo…

- Eu sei. Nós procuramos por tudo, por longos anos…até que, finalmente, desistimos.

- Pensei que eu fosse digno do esforço… não achei que iriam desistir.

- Sempre foste digno, meu jovem amigo. Mas nunca tivemos um mínimo sinal de vida, depois que foste embora. Nós tivemos que…

O rapaz interrompeu, bruscamente.

- Também não tiveram nenhum sinal de que havia morrido, portanto não era motivo para desistirem. Eu esperei por anos excessivamente longos, dia após dia… Eu era apenas uma criança. Mas já não sou mais. Nem voltarei a ser…

Havia muita mágoa nos olhos do rapaz. Havia muita decepção na sua mente. Havia muito ódio em seu coração… e havia muita força concentrada em seus músculos, tornando-o um jovem extremamente perigoso.

Junto ao dragão verde-azulado, ainda desacordado, o velho homem mantinha-se de pé, com a expressão facial um tanto confusa, flutuando entre os sentimentos de culpa e o de verdadeiro assombro.  

O jovem guerreiro, então, levantou a espada e avançou contra os dois.

domingo, 4 de dezembro de 2016

Revisitando Dragões (Parte 3 - Treinamento)


- Onde ele está? Não adianta vocês o esconderem, porque eu vou achá-lo, mais cedo ou mais tarde. Se não me disserem onde ele está, eu vou matar a todos.

- Como assim? Então ele não está…?

A pergunta saiu num ímpeto incontrolado, mas o homem parou a frase no meio, como se a verdade tivesse sido percebida justa e somente naquela hora. Arrependeu-se, porém, de ter-se deixado levar pela euforia de saber que o filho não era, afinal, refém do representante do mal.

Os seus companheiros, porém, logo preocuparam-se, por não saber onde poderia estar o guardião, mas só por saber que não estava em poder do grande dragão pardo, sentiram-se, de uma maneira estranha, esperançosos.

O grande réptil, obviamente, percebeu o ingénuo erro e, demonstrando satisfação, deu uma espécie de assobio, levantou o focinho ao ar e meneou a cabeça, como se a desafiar os outros personagens ali, à sua volta.

 - Então… onde estará o rapaz? Vai ser uma grande diversão tentar achar a criaturinha, antes de vocês e… acabar, de vez, com ele…

- Só se passar por cima do meu cadáver!

O dragão abaixou a cabeça e, aproximando-se muito do homem, disse-lhe, com uma voz baixa, calma e grave, num tom bastante irônico:

- Será, mesmo, um prazer extra! Dois, ao invés de um… Perfeito!

O dragão verde-azulado tomou a dianteira e enfrentou o grande animal, mesmo sabendo que aquele era mais forte que ele.

- Saia daqui! Não há nada mais aqui para ti…

- Ainda não. Mas haverá…

E dizendo isso, o dragão saiu, não por medo ou respeito, mas por saber que, tanto ele quanto os outros tencionavam procurar o mesmo, mas nenhum deles sabia por onde começar.

Seria mais fácil se estivesse no ar, ao invés de na terra, onde seus movimentos eram mais limitados. O enorme animal pardo abriu as asas e levantou voo, diante dos olhares preocupados de todos.

- Onde ele poderá estar? Temos que encontrá-lo e tirá-lo daqui antes que seja descoberto pelo nosso inimigo!

O dragão verde-azulado dirigiu-se ao pai e perguntou se o menino costumava esconder-se em algum lugar, em particular. Diante da negativa do outro homem, o velho disse:

- Talvez ele esteja mais perto que pensamos… Tive uma ideia.

E, dizendo isso, atravessou a clareira, a bater com o cajado fortemente no chão, a cada passo que dava.

***

- Eu sabia que não podias estar longe.

- Eu vi que ele andava por perto, porque ouvi os passos e escondi-me… O primeiro lugar que eu encontrei, onde ele não podia entrar, foi a caverna…

- E fizeste muito bem! Mas, agora, temos que proteger-te a todo custo.

- Com todo o cuidado e com o respeito que tenho, não vejo melhor alternativa que tirá-lo daqui o quanto antes. Temos que levá-lo para um lugar onde seja mais difícil ser localizado. Eu tive uma ideia, mas vamos precisar de toda ajuda que conseguirmos…

O dragão precisava convencer o pai do menino a aceitar a triste realidade do perigo e da necessidade do plano de emergência, mas diante do que havia acontecido poucos minutos antes, pareceu-lhe mais fácil argumentar.

O homem, embora a contragosto, sabia que o filho precisava ser protegido. Uma tragédia estava iminente, mas ele não ia entregar o filho ao inimigo, mesmo que para isso tivesse que abrir mão de tê-lo por perto. A vida era, agora, mais importante que os laços de família.

***

Cada um dos sete dragões acrescentou um pequeno detalhe ao presente que deram ao menino, para servir-lhe de proteção contra todo o mal. Como cada um representava uma virtude, todas elas somadas faziam do pequeno amuleto um poderoso artefacto.

Com excertos da simplicidade do dragão albino, do amor apaixonado do vermelho, da paciência do castanho, da generosidade do dourado, da compaixão do prateado, da força de espírito do dragão negro e da esperança do verde azulado, o guardião tornava-se não somente o mais protegido, mas também o mais poderoso ser de toda a região.

Agora precisava ser treinado com muita urgência. Para confundir as forças do mal, caso o dragão pardo desconfiasse, o menino era preparado em um lugar diferente a cada lua, por um protetor diferente. Assim, às vésperas da sétima lua nova, o dragão verde-azulado tomou sua parte do treinamento, com o auxílio do velho companheiro.

Com o cajado em punho, o menino aprendeu a lutar para defender-se, após aprender tudo sobre os pontos fortes e as fraquezas do inimigo pardo, com os outros virtuosos personagens de cores diversas. Não era o treinamento perfeito, mas era essencial conhecer os pontos vulneráveis da força, já que o pequeno guardião tinha forças bastante limitadas, devido à sua juventude e ao seu reduzido tamanho.

Tanto o dragão verde-azulado quanto o velho homem, que outrora havia sido um exímio cavaleiro campeão de muitas contendas, estavam bastante preocupados e faziam de tudo para evitar o confronto entre as duas forças opostas. Sabiam, entretanto, que estavam apenas a adiar o inevitável.

Mas o inevitável pode ser apenas adiado, nunca impedido de acontecer.

O dragão pardo percebeu que estava sendo enganado e passou a vigiar o local onde o velho e o dragão, que representava a esperança, costumavam encontrar-se. No laranjal, por mais que tentassem, não conseguiriam deixar de estarem expostos. Tinham que mudar de estratégia a cada dia, para confundir o algoz, por isso o menino nunca deveria aparecer junto dos dois, quando estivessem por lá. O pai do menino era informado dos progressos do filho, sempre que possível, pelo velho amigo.

O menino, porém, sentiu saudades de casa. Sabendo que corria perigo, consultou seus protectores e combinaram um encontro com a família, numa das noites sem lua, para diminuírem os riscos.

A caverna estava às escuras, os personagens escondidos e em silêncio, no fundo da mesma, onde nunca poderiam ser tocados por uma fera do tamanho daquela que os vigiava constantemente. Num canto de um dos compartimentos mais próximos da entrada da caverna, a armadura parecia um vigia em atalaia, pronto a lutar para defender quem viesse com más intenções, com a espada apoiada ao lado.

O som de passos a aproximar-se deixou-os bastante tensos, mas como eram curtos e ligeiros, a tensão era mais por ansiedade que por medo. Os passos extremamente cuidadosos e um tanto hesitantes, dentro da caverna, pareciam antecipar o encontro entre os personagens, mas todo cuidado era pouco. Um sussurro. Silêncio. Depois outro sussurro. Estava na hora de saírem do esconderijo.

O velho e o menino caminharam cuidadosamente até a sala improvisada. No centro daquela, a silhueta conhecida do homem surgiu contra a abertura da caverna e eles mostraram-se, finalmente, com alegria e entusiasmo, abraçando o visitante, mas este não os pode retornar o entusiasmo e o abraço, pois tinha os braços amarrados às costas e a boca amordaçada.

Atrás dele, um outro homem, bem mais alto, vestido de negro e com cabelos longos e loiros, apareceu com uma espada em punho.

sábado, 19 de novembro de 2016

Revisitando Dragões (Parte 2 - O Guardião)


- Quem é este dragão pardo?

- Ele nasceu das forças do mal e é comandado por um inimigo nosso, que vive muito ao norte, nas terras frias. Seu coração é mais gélido que as neves dos extremos da terra. Além de um animal de muita força, ele é também muito poderoso, perigoso e sabe onde o menino está. É só uma questão de tempo até cá chegar, com o pior dos intuitos. Há uma profecia conhecida que diz que só poderá ser destruído por um guerreiro alimentado com o poder dos sete dragões. Nós sabemos quem este guerreiro é… ele também. O que nós temos que fazer é prepará-lo e evitar o confronto direto, pois pode ser fatal para um dos dois. Se o dragão vencer, será o nosso fim. E ele destruirá tudo e todos que forem contra o seu senhor. Vamos precisar de toda a nossa inteligência em montar uma estratégia e…

O dragão fez uma pequena pausa.

- … e de tempo…, mas este talvez não seja o nosso maior problema.

- O pai… Acredito que ele possa ser um grande empecilho.

- Eu sei. Ele passou maus bocados por causa do acidente com aquela criança. Não vai aceitar ceder assim fácil. Mas temos que falar com ele. Não temos outra alternativa…

- Talvez tenhamos…

O dragão olhou o velho homem e compreendeu, instintivamente, aquela mensagem.

***

- Wow! Isso é sério?

- Mais do que sério!

- Mas eu não serei capaz! Sou pequeno e fraco…

- Por isso nós devemos preparar-te e ensinar-te a lutar… para proteger a ti e a todos…

Os olhos do menino brilharam, mas uma sombra de preocupação seguiu-se á aquela momentânea euforia.

A armadura era, obviamente, grande demais e, para empunhar uma espada verdadeira, ainda era muito cedo.

O velho, então, entregou-lhe um bastão de madeira feito a partir de um pedaço de um tronco de laranjeira. O artefacto era coberto por uma camada lustrosa e apesar de muito suave ao toque, também aparentava ser bastante resistente.

E os ensinamentos começaram… Para evitar maiores constrangimentos, as lições eram dadas muito cedo na madrugada até o nascer do sol. A intenção era evitar serem vistos e o confronto iminente com o pai do aprendiz que, invariavelmente, teria que saber de qualquer jeito... quando o momento fosse mais propício.

O velho mostrava os princípios básicos de combate e de como empunhar uma arma e fazer uso dela, especialmente de maneira defensiva. O dragão ensinava-o a pensar estrategicamente, a procurar os pontos fracos do inimigo e a explorar a velocidade do pensamento. O menino era um excelente pupilo, sempre aberto a absorver os novos conhecimentos e era, também, muito curioso. Apesar do que havia passado, suas pernas e braços eram bastante ágeis e sua mente, extremamente sagaz.

O dragão observava o menino com orgulho, enquanto este aprendia o que lhe era ensinado, com precisão e com a habilidade de um verdadeiro guerreiro.

O velho sabia que o tempo corria contra eles e que, mais cedo ou mais tarde, teriam que revelar, à família do rapaz, o que estava acontecendo e o que viria a acontecer, no futuro. Ele, todavia, evitava revelar toda a verdade, com receio que, se soubessem que o dragão pardo queria a destruição do guardião, para poder reinar sobre toda a terra, iriam duvidar da palavra deles, ou esconder o filho, por isso decidiram que iriam inventar uma desculpa qualquer, se fossem vistos a treinar o rapaz.

Os pais, como seria de esperar, logo descobriram e foram totalmente contra, proibindo aquele tipo de treinamento, veementemente. Bastou alguns dias, porém, para os três arranjarem uma outra forma de se encontrarem, retomando a tarefa, cada vez com mais afinco, sempre que lhes era possível.

Uma madrugada, porém, o menino não apareceu. Pensando tratar-se de um empecilho qualquer com o pai, o velho e o dragão ficaram quietos, sem criar nenhum alarde, aguardando o amanhecer.

Algumas horas passaram, sem que o aprendiz chegasse. O som de passos apressados deixou-os em estado de alerta. Os dois esperaram, para ver o que acontecia. O caçador, pai do menino, vinha a passadas rápidas e com uma mistura de fúria e preocupação estampada no rosto.

- Eu avisei que não queria meu filho envolvido nesta aventura, brincadeira ou o que quer que vocês estejam tramando.

Pegos meio desprevenidos, os dois não disseram nada, já sentindo-se culpados. O homem estava mesmo furioso.

- Onde está o meu filho? Quero saber agora!

Os dois trocaram um olhar suspeito e preocupado e, quando se voltaram para o homem, aquele percebeu que algo estava muito errado, pela expressão grave na face do velho homem.

- Oh, não! Não, não, não!

- Ele não está, nem esteve connosco hoje. E isso é grave; muito grave. Temos que procurá-lo, imediatamente. Ele pode estar em grande perigo…

- E não está preparado para defender-se… ainda… O treino não foi suficiente!

- Isso é outra das artimanhas de vocês, os dois? Mais uma vez ele corre perigo por causa de vocês! Desta vez, não vou perdoá-los…

- Não. Ele está em perigo, porque ainda não está preparado para defender-se. Tomara que não seja o que estamos pensando… Se for, é melhor nós corrermos. Acho que temos que pedir ajuda aos nossos companheiros alados.

O velho, então, contou ao pai do menino toda a verdade sobre a profecia e sobre o dragão pardo e seu plano malévolo, o que aumentou a preocupação do homem… e a deles também.

Estava mais que na hora de trazer os outros seis dragões para perto deles. O menino precisava ser encontrado, antes que fosse tarde demais.

O dragão verde-azulado preparava-se para levantar voo e buscar os companheiros, quando o chão sobre os pés deles estremeceu grandemente, para surpresa de todos. Os homens olharam para o dragão, que olhava para o centro da clareira, com uma expressão ameaçadora.

Um grande animal pardo surgiu e aproximou-se deles, com a boca escancarada, pronto a atacá-los…