segunda-feira, 1 de julho de 2013

A Carta


Assim que entrei, os meus olhos foram atraídos pela folha de papel. A carta, pousada em cima da mesa vazia, estava, estranhamente, assinada por ela.

Não se tratava de uma despedida. Era mais um recado: simples, breve e direto. Anunciava, apenas, o fim… quase impessoal, como uma lista de compras ou um comunicado de que ia chegar mais tarde do trabalho.

Senti um vazio…um enorme vazio a abraçar-me a alma, a pesar-me nos ombros e um cruel e triste silêncio a impregnar a casa deserta.

Mas não era aquela sensação que incomodava. Eu já sentira muito mais vazio, estando a seu lado, dividindo a cama, sem compartilhar os sonhos, sem sentir prazer no sexo automático - que já nem frequente era – e que só me fazia sentir vontade de lá chegar, para sair logo, tomar um banho, voltar a deitar-me e dormir.

Não era tampouco a carta, assim secamente escrita, ainda pousada sobre a mesa, a anunciar a partida – sem volta - sem considerar o que alguma vez sentimos, ou mesmo o que fizemos um pelo outro, que me inquietava.

Já não havia nenhuma emoção desnecessária, nem tampouco explicações, no teor da mensagem … pois estas já não faziam, mesmo, diferença alguma. Já não havia nenhuma necessidade de demonstrar ódio, nem amor, nem piedade, nem nada… A nossa história havia-se simplificado nas estéreis palavras escritas naquela folha de papel.

Pensei no tempo que havíamos perdido, sem que, por comodismo, tomássemos a corajosa-covarde atitude que ela tomara sozinha e na minha ausência. Talvez evitasse, assim, a obrigação de olhar-me nos olhos e hesitar...

Aquele era apenas um fim. Daqueles que não deixam ódio, nem mágoa, nem mesmo qualquer amizade. Daqueles que fazem, no futuro, questionarmo-nos as razões de havermos deixado a relação chegar ao ponto de a separação não fazer mossa alguma em nossas vidas.

O fim, sabe-se, nunca advém do nada. Vem sempre como consequência de muitos fins… de muitos erros e de muitos desencontros... de tantos pequenos e incómodos gestos que, então, somam-se, como gotas d’água de intolerância, ao copo já totalmente cheio.

Não era nada daquilo que, naquele momento - a olhar a folha de papel, então em minha mão e a pensar numa parte de minha vida praticamente desperdiçada - me incomodava o espírito.

O que me incomodava, na realidade, era ter sido ela - e não eu - a ter tomado aquela decisão. A bravura de ter tomado a dianteira e resolver por um termo à relação, deveria ter-me acontecido há muito tempo atrás, antes que os sentimentos - tanto os pequenos, quanto os grandes; tanto os bons, quanto os maus - houvessem partido, definitivamente, sem deixar qualquer vestígio em nossas emoções…

Antes mesmo que eu olhasse aquela assinatura no papel e a visse como de uma verdadeira e completa desconhecida…

1 comentário:

  1. Este texto faz parte de um concurso a que estou participando... a intenção era usar a primeira frase e construir uma história a partir dali.

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