quinta-feira, 26 de maio de 2016

Dragões


"O dragão vermelho veio do sul, onde o sol amorna as tardes e as folhas todas, ainda tão rubras e escarlates, lutam por manter-se presas aos ramos das árvores; onde a natureza ainda acorrenta o Outono, como se tentasse manter o cinzento Inverno à distância, como se fosse, de alguma forma, possível. "*

"O dragão castanho veio do oeste, onde o mar apaga os rastos dos homens serenos e das ruidosas gaivotas e carrega mensagens quase anônimas em garrafas de vidro, para quebrá-las, sem atingir seus destinos, contra as rochas e os recifes, como se quisesse manter os náufragos da vida, amigos e amantes, separados para sempre ". *

O saguão do aeroporto estava cheio de transeuntes, empurrando os mais diferentes tipos de malas rodadas e carrinhos de bagagens. Eu cruzei, lentamente, a grande porta de correr, mas com os meus olhos procurando cuidadosamente por um rosto conhecido. Ele estava de pé, ereto e elegante, mais alto que maioria das pessoas que ali se enfileiravam, a esperar por seus amigos, clientes, parentes ou colegas... Eu sorri e caminhei a passos firmes, em sua direção. Ele devolveu-me um sorriso cortês e espontâneo.

Eu pensei, cá, com meus botões: 'que homem bonito'...

Quando me aproximei, ele simplesmente apertou minha mão, olhando seriamente para o meu rosto e corando ligeiramente. Dei um passo adiante e abracei-o, como fazem os amigos que não se vêem há muito e sussurrei-lhe ao seu ouvido.

- ‘Have I told you lately that I love you?' **

- Não, não disse... não que eu lembre...
- Acabei de dizer.

Ele sorriu timidamente. Naquele momento, todos os meus problemas, as inseguranças e todos aqueles medos que eu vinha sentindo em minha cabeça, durante a viagem para encontrar-me com um homem praticamente desconhecido, desapareceram completamente. Eles simplesmente esvaneceram no ar, com a doçura espontânea daquele primeiro contato.

- Vamos sair daqui... rápido!

***
- Tu sabes que eu nunca...

- Shhh... Não digas nada. Basta fechar os olhos, por agora.

Ele obedeceu. Seus músculos estavam tensos sob sua pálida pele. Eu sabia que ele estava pronto, mas não muito confortável, então eu beijei, muito levemente, sua cabeça, sua testa e suas pálpebras.

Ele simulou um sorriso, ainda meio sem graça, mas não refutou, não lutou contra e nem disse nada, que pudesse comprometer a magia estranha daquele momento especial.

Eu, então, beijei seu rosto e rocei, muito suavemente, meus lábios nos dele. Ele esperou. Olhei para suas belas feições e beijei-lhe novamente os lábios, muito de leve, quase sem tocar, mas deixando-o sentir que eu estava lá, muito mais presente que jamais estivera. Ele respirou fundo e fingiu beijar-me de volta. Tomei a dianteira e avancei, desta vez com mais entusiasmo e senti que ele abriu a boca um pouco, para que eu pudesse sentir seu sabor. Seu beijo, um tanto inseguro no começo, logo encheu-se de desejo e luxúria. Seus braços envolviam-me com firmeza, mas também com doce e afetuosa paixão.

Ele olhou-me nos olhos, como se estivesse-me vendo pela primeira vez. Talvez tenha sido, mesmo, a primeira vez que ele me via assim, tão perto de si e com tamanha abertura.

Estávamos em pé, no centro da sala. Nossos braços entrelaçavam-se à volta de nossos corpos inquietos, em exploração mútua. Ele tocou meu rosto e eu movi minha cabeça para o lado e beijei seus longos e pálidos dedos. Ele segurou minha mão nas suas e fez o mesmo. Aquele gesto despretensioso e tão simples era, ao mesmo tempo, tão íntimo e tão intenso, que acabou acendendo um súbito fogo dentro de nós. Ele resmungou o que pareceu-me algo como 'eu te amo', segurando-me em seus braços, firmemente. Então, beijou-me com tal impetuosidade, que eu senti todo o seu corpo estremecer. Ele estava ávido e eu também. Nossas bocas colaram-se. Eu simplesmente segurei seu corpo contra o meu, sentindo-o reagir de uma maneira que eu já não podia controlar... não que eu quisesse ou fosse tentar...

- Deixa-me olhar para ti.

Sua face estava corada. Seus olhos mais azuis. Eu desabotoei-lhe o colarinho da camisa, com dedos inquietos e nervosos e segui fazendo o mesmo com os outros botões, um após o outro, parando, cada vez que abria o próximo. Tentava, mas era quase impossível desviar meus olhos da densa camada de pelos ruivos, harmoniosamente distribuída em seu largo peito, sobre a pele sardenta e quase pálida demais.

Incrível como a primeira vez que se está com uma pessoa pode ser uma maravilhosa viagem de exploração e descoberta, mesmo para alguém que já tenha experimentado aquilo antes. Aquele homem tinha o corpo forte e incrivelmente atraente.

Comecei a abrir meus próprios botões, mas ele segurou minhas mãos e pôs-se a fazer o mesmo que eu havia acabado de fazer com ele, roçando os lábios em meu pescoço, muito levemente. Com os dedos tépidos, empurrou o tecido que ainda me cobria os ombros, fazendo-o deslizar e cair no chão. Senti calafrios pelo corpo todo e ele, aproveitando-se da situação, roçou a barba já um tanto crescida, por cada centímetro da minha pele arrepiada, numa carícia estranha e, ao mesmo tempo, bem-vinda. Segurei-lhe a cabeça entre as minhas mãos e beijei-lhe, mais uma vez, mas ele desvencilhou-se, com delicada firmeza e seguiu, a descer pelo meu peito e mamilos, barriga e umbigo, com seus lábios mornos e atrevidos, abrindo caminho pelo meu corpo, já totalmente desejoso dele. Ele parou ali mesmo abaixo do meu umbigo e beijou levemente o trilho de finos pelos que crescia para baixo e escondia-se, discretamente, para dentro do cós dos meus melhores ‘blue jeans’. Suas mãos quentes abriram caminho entre minhas roupas e minha pele, já totalmente incendiada pelas chamas daquela paixão.

Ele parava vez ou outra para beijar minha boca, enquanto cingia-me num abraço apertado. Depois, correu as pontas dos dedos pelas minhas costas e puxou-me para mais perto dele ainda.

Eu senti o fogo do dragão a queimar-me, com desejo docemente sensual e, em seguida, ouvi-o sussurrar.

- Eu sei que tu és a única pessoa que pode desvendar o segredo. Tua experiência, teu cuidado e teu amor são as coisas que eu sempre procurei e o fato de virem em forma do pacote mais sexy que eu poderia desejar, torna tudo ainda mais emocionante e gratificante.

- Teus olhos são muito gentis e vêem-me melhor do que eu realmente sou. Tu és tão especial, que eu sinto que eu sou um pouco especial também.

- E tu és. Agora, guia-me nesta doce aventura...


- Com certeza. Apenas deixa-te ser amado...

Minhas mãos mornas acariciaram seu belo e robusto corpo. Eu não cansava de beijar o pescoço, ombros e costas e todo o resto daquele homem, com total atenção e luxúria.

Ele fechou os olhos, saboreando o momento e as carícias, cheio de genuíno deleite. Eu só queria estar com ele, para satisfazer seus anseios mais profundos e para agradá-lo o melhor que pudesse. Eu sabia que aquele momento já estava sendo muito bom para nós dois, mas eu queria que ele se sentisse contente e satisfeito e só desejava que fosse, de alguma forma, memorável...
***

- Fazer amor contigo foi a experiência mais incrível que eu poderia sonhar, mas sabes o que eu acho que fantasiava mais, antes deste encontro?


- Diga…

- Eu acho que ansiava por este momento especial, depois que tudo está terminado, quando nossos corpos estão cansados e consumidos, quando podemos simplesmente deitar nus e abraçados, não precisando falar, mas sabendo que estamos juntos como amantes... Ser capaz de dormir contigo, poder olhar-te, abraçar-te e proteger-te. Ter meus braços em torno de ti, sentir o perfume suave do teu pescoço e cabelos e acariciar a tua pele nua...Desejar fazer mais amor, mas apenas, por agora, desfrutar da paz e tranquilidade de ter-te no meu abraço protetor...

Estávamos nos olhando e ele abriu o sorriso mais encantador que conseguiu e puxou-me para junto dele, aninhando o meu corpo entre seus braços e peito, beijando minha testa, meu rosto e meus lábios. Eu deitei nele minha cabeça e, então, fechei os olhos, sentindo as asas do meu dragão escarlate a envolver-me completamente.

Aquele era o lugar onde eu sentia-me mais confortavelmente em casa...


***


- Como assim?

- NYC, meu amor. Vens comigo?

- Eu não sei o que dizer…

- Diga que sim, então...

Seus profundos olhos azuis encontraram os meus, pela milionésima vez. Seu rosto estava um pouco pálido e bastante sério, provavelmente de expectativa. Minha mente trabalhava em alta velocidade, tentando encontrar as palavras certas para lhe responder. Em vez disso, eu simplesmente perguntei-lhe.

- Isso é uma proposta?

- Não é de casamento, mas é, ainda, uma proposta...

Ele riu de mim, quando eu corei inesperadamente.

- Bem, pelo menos não estás de joelhos.

- Não por esse motivo, não...

- Não te atrevas! Acho que é melhor verificar melhor o meu passaporte, então...


***

- Isso é loucura, não é?


- Se for, então não há nenhuma cura ou saída, criatura que eu amo tanto... Mas esta loucura só é boa porque eu estou contigo...

Estávamos caminhando de mãos dadas à beira-mar, desfrutando a brisa amena do fim de tarde de verão. Eu sentia meu corpo tão cheio de vida e aquilo era, ao mesmo tempo, tão bom e tão libertador, que eu poderia levantar os pés do chão e voar. O simples toque das peles de nossas mãos já era suficiente para inflamar uma série de sensações incontroladas, algumas delas muito perceptíveis.

Ele olhou-me e disse, em voz baixa, enquanto segurava-me em um de seus mais ternos abraços, daqueles que eu tanto amava:

- Tu nunca terás de sentir solidão ou tristeza, enquanto eu estiver vivo e por perto...

O dragão vermelho abriu suas largas asas, mergulhou no ar e voou para o céu.

O dragão castanho, ligeiramente menor que o outro, bateu suas asas quase douradas e seguiu o ruivo amante, de muito perto. Seus olhos estavam húmidos, com lágrimas de puro contentamento e admiração.

Embora pudesse tentar, não conseguiria, jamais, nem realmente, esconder o carinho que sentia pelo seu rubro companheiro, que voava tão livre e tão feliz, a apontar o caminho à sua frente…
***

* (Originalmente de "A Efigie do Dragão", ligeiramente modificado para esta história)

** (Originalmente de Van Morrison "Have I told you lately that I love you?"

quarta-feira, 18 de maio de 2016

Dragons



“The red dragon came from the south, where the sun warms up the afternoons and the still crimson and scarlet leaves struggle to remain attached to the trees branches; where nature still shackles autumn, as if trying to keep the grey winter away, as if it could ever be possible.” *

“The brown dragon came from the west, where the sea wipes out the traces of quiet men and noise seagulls and conveys anonymous messages in glass bottles to shatter them, without reaching their destinations, against the rocks and the reefs, as if to keep the castaways of life, friends and lovers, forever apart.” *


The airport hall was filled with passers-by, pushing the most different wheeled luggage and carts. I crossed the sliding door slowly, but with my eyes searching carefully for a known face. He was standing tall right behind the line of people waiting for their friends, clients, relatives or colleagues… I smiled and walked firmly to his direction. He smiled back.

I thought to myself: ‘how handsome’

When I reached him, he simply shook my hand, looking at my face and blushing slightly. I moved forward and hugged him like long-time-no-see friends do and whispered in his ear.

- ‘Have I told you lately that I love you?’ **

- No, you haven’t… not that I can remember now…

At that moment, all my troubles, the insecurities and all the fears I had in my head, during the trip to meet that man disappeared completely. They simply vanished in the air with the sweetness of the first contact.

-  Let’s leave… quick!

***

- You know I have never…

- Shhh… Don’t say anything. Just close your eyes for now.

He obeyed. His muscles were tense under his pale skin. I knew he was ready, but not really comfortable, so I kissed, very lightly, his head, his front and his eyes. 

He smiled. 

I kissed his face and rubbed my lips on his. He waited. I looked at his handsome features and kissed his lips with tender and soft care, almost not touching them, but letting him feel I was there. He took a deep breath and pretended to kiss me back. I took the lead and kissed him again, this time with more passion and I felt he opened his mouth a bit, so I could taste him. His kiss was soft and insecure in the beginning, but he soon gave in to desire and lust, holding me in his embrace and sweet loving passion. 

He opened his eyes and looked into mine, as if seeing me for the first time. Maybe it was the first time he saw me like that. 

We were standing in the centre of the room. Our bodies were touching, our arms around each other. He touched my face and I moved my head and kissed his long-fingered and pale hand. He held my hand in his and kissed it back. That unpretentious gesture was so simple and at the same time so intimate, it kind of ignite the fire inside us. He held me back in his arms, firmly and strongly. Then he kissed me with such a passion, I felt his whole body shake. He was hungry. So was I. Our mouths locked, our tongues interlocked. He mumbled what I though was something like ‘I love you’. I moaned and held his body against mine, feeling it react in a way I could not control… not that I would ever try to…

- Let me look at you.

His face was flushed. His eyes bluer. I unbuttoned his shirt collar, his other buttons one after the other, stopping once each one was released and looking at his amazing ginger furred chest, his lovely pink nipples and his pale skin. I caressed his torso with uneasy fingers. 

Amazing how the first time one is with another can be so enticing and such a marvellous journey of exploration and discovery, even for someone who had experienced that before. I took his shirt off and enjoyed the view of his bare torso. That big boy was incredibly handsome and strong. His body was a dream.

I started unbuttoning my shirt, but he held my hands and moved forward doing the same I’d just done with him, kissing my neck as soon as he pushed the fabric off over my shoulders and let the garment fall to the floor. I got goose bumps and quivered slightly. He kissed every inch of my skin, tasted and smelled the scent of my trembling body. I held his head in my two hands and kissed his scalp, while he went down my chest and nipples, stomach and navel, with his lips and tongue, opening his way onto my eager self. He stopped right there below my navel and lightly licked the path of fine hair growing downwards and hiding through the blue jeans around my waist. His warm hands reached down, unbuckling the belt and undoing my trousers. My skin was on fire. He caressed me and then kissed my mouth over and over again, holding me in his tight embrace. Our bodies were touching, our hands uneasy around each other. He moved his fingertips down my back and held me closer to him. 

I felt the dragon’s fire burning me with sweet lustful yearning and then I heard him whisper.

- I know you are the one who will unlock the secret. Your experience, your care, your love are all the things I've been seeking and the fact they all come in the form of the sexiest package I could wish for make it even more exciting and fulfilling.

- Your eyes are too kind. They see me better than I really am. You’re so special I feel I am somewhat special too.

- You are. Love me now, my sweet guide…


- Yes, my ginger furred lover. Just let yourself be loved…

My warm hands caressed his sturdy and beautiful body. I kissed his neck, shoulder and back and pushing him over to the large bed, kissed the rest of that man with utter attention and lust.

He closed his eyes, savouring the moment, while giving himself in to my touch and caresses, full of genuine desire. I just wanted to be with him, to fulfil his deeper desires and to please him the best I could. I knew it would be great for both of us, because we loved and respected one another very much, but I wanted him to be content and satisfied. I wanted it to be memorable…

***

- You know, making love with you was the most amazing experience I could ever dream of, but do you know what I think I fantasised most?

- Tell me…

- I think I longed for this special moment after we are finished, when both our bodies are spent, when we can just lie together naked and holding each other, not needing to speak, but just knowing we are together and we have our lover next to us, with us… to be able to have you sleep with me, to have you in front of me, so I can spoon you and protect you, my arms around you, to smell your neck and hair and to caress your naked skin… to look forward to more lovemaking but just, for now, to enjoy the peace and tranquillity of having you in my embrace…

We were looking at each other. He opened the most wonderful grin and pulled me towards him, nesting my body into his arms and kissing my front, then my face and my lips. I rested my arms around his body, my head on his ginger chest and then I closed my eyes, feeling I was surrounded by that red dragon’s sheltering wings. 

That was the place I felt I really belonged…

***

- What do you mean?

- NYC, my love. Will you come with me?

- I don’t know what to say…

- Say yes, then…

His deep blue eyes met mine. His face was paler and quite serious with expectation. I was appalled but my mind was working in high speed, trying to find the words to answer him. Instead, I asked.

- Is that a proposal?

- Not for marriage, sweetheart, but still a proposal…

He laughed at me, when I blushed unexpectedly.

- Well, at least you’re not kneeling.

- Not for that reason, no…

- Don’t you ever! I think I’d better check my passport then…


***

- Is this any kind of madness?

- If it is, then there is no cure or way out, my lover... But it is good being this mad as long as I am with you…

We were walking hand in hand along the seashore. I haven’t had felt so alive in quite a long time and that was so good and so liberating at the same time. The simple rubbing on the skins of our hands was enough to ignite a series of uncontrolled sensations, some of them very noticeable. 

He held me in his arms and said, softly, while holding me in an embrace:

- You will never have to be alone again, my dear lover, while I am alive and around...


The red dragon unfolded his broad wings, dove into the air and reached up the sky. 

The slightly smaller brown dragon flapped his almost golden wings and followed close. His eyes were moist. He tried but could not really hide the affection he had towards his ginger lover flying so free and so happy and leading the way. 

His tears, he knew, however, were of pure enjoyment…

***

* (Originally from "A Efígie do Dragão")
** (Originally from Van Morrison's "Have I told you lately that I love you?"