domingo, 23 de março de 2014

Anno Domini: 4553 (P1: Intro)



O som estridente das sirenes ecoou pelos corredores do grande edifício, com uma insistência pouco usual. Em um pequeno espaço de tempo, pessoas começaram a deslocar-se, apressadas, pelas galerias, numa estudada ação de evacuação. Fazia tempo que tal não acontecia e alguns elementos pareciam realmente perdidos no procedimento e limitavam-se a seguir os mais experientes.

O Conselho de Segurança fora chamado às pressas para uma reunião de emergência. A maioria nunca havia participado em nada parecido em, pelo menos, mais de um par de décadas, após o grande blackout que havia acontecido pelo sistema de emergência haver apresentado uma falha.

- Senhores Membros do Conselho. Ainda não sabemos o que aconteceu, mas por medida de segurança, devemos colocar esta unidade em estado de alerta. Não deve ser nada grave, mas se houver perigo, temos que estar protegidos. Não deve ter sido mais que uma falha no fornecimento de energia, como aconteceu uma vez antes, há muito tempo atrás e que não passou de um grande susto para todos nós.

- Há algum perigo de invasão?

A voz daquele jovem, no meio da grande sala, pareceu ribombar, quando o silêncio seguiu-se e caiu pesado como uma rocha sobre o ambiente. Os olhos todos voltaram-se ao rapaz extremamente pálido, de olhos esverdeados, que levantara-se para ter sua pergunta ouvida. O chefe do Conselho falou, com voz calma, mas com o cenho um tanto franzido.

- Invasão? Não acreditamos que seja algo desta natureza. Nós somos um povo pacífico. Não fazemos mal a quem quer que seja, nem temos nada em nosso domínio que alguma outra civilização possa querer tomar. Na verdade, somos uma raça despreparada para invasões ou para guerras. Somos cientistas e estamos preocupados apenas com o bem-estar da nossa civilização e deste planeta.

Uma sombra, entretanto, pareceu passar sobre o semblante sério do Chefe do Conselho.

‘O bem-estar deste planeta estéril… para quê, afinal? Já nem sabemos a razão pela qual ainda estamos cá… nem sabemos porque nos mantemos vivos ou a este sistema sem sentido.’

O pensamento passou-lhe como um flash, abandonando-o logo em seguida, mas deixou o seu incômodo peso na mente do homem. Ele passou o olhar pelas fileiras de cadeiras e sentiu um pouco de pena dos elementos que ali estavam. As faces, tão pouco diferentes umas das outras, demonstravam apreensão. Ele tinha que extinguir qualquer sinal de dúvidas em relação ao perigo, mas não tinha informações concretas ainda, para poder sustentar seu discurso.

- Voltem para seus aposentos. A segurança tratará de mantê-los a salvo. As portas permanecerão fechadas até que se tenha alguma resposta para dar-vos. Agora vão.

A audiência saiu em silêncio e tomou os corredores que davam para as galerias, onde estavam os aposentos. Assim que entravam, o sistema de segurança bloqueava as portas e os monitores ligavam, mostrando imagens captadas por câmeras instaladas do lado de fora do edifício central.

O chefe do Conselho esperou que todos saíssem, evitou o olhar questionador do jovem que fez a pergunta e que o deixara inquieto, virou-se, antes que pudesse ser interpelado uma outra vez e entrou por uma abertura por trás do púlpito, onde estivera por poucos minutos. Dali, teria acesso à sala de controlo central do edifício, onde a segurança lhe daria informações atualizadas sobre o incidente.

Enquanto caminhava pelo corredor pouco iluminado, sua mente trabalhava com rapidez, a preparar-se para o que poderia vir a constatar. As sirenes já lhe soavam bastante distantes e pouco audíveis, mas ainda teriam que permanecer ligadas, até que todos estivessem recolhidos aos seus aposentos. Ele esperava que agora fosse questão de apenas uns poucos minutos a mais.

Entre um pensamento e outro, as lembranças de um passado um tanto remoto iam preenchendo os espaços na mente do chefe do Conselho com uma série de preocupações, que desde há muito tempo já não o assombravam. O homem respirou fundo e entrou na sala de controlo central, onde outros velhos e conhecidos cientistas já o aguardavam, com expressões de preocupação estampadas nas faces. Um outro pequeno grupo entrou na sala, logo em seguida, em silêncio.

- Não me parece nada tranquilizador…

O pensamento saiu-lhe pela boca, antes que ele pudesse controlar ou evitar. Um homenzinho de olhos azuis muito pálidos, quase transparentes, adiantou-se e disse, sem cerimônia e sem demonstrar qualquer sinal de emoção:

- E não é, na verdade… Agora que estamos todos aqui, quero que me sigam até a sala de segregação do Limbo.

O chefe do Conselho seguiu o homenzinho, com uma expressão bem mais preocupada do que aquela com que entrou na sala em que estavam. O caso parecia ser mais sério que ele imaginara. Atrás de si, além do grupo dos mais experientes, um pequeno grupo de jovens cientistas caminhava quieto, mas sem conseguir esconder a carga de curiosidade que sentiam naquele momento. Suas mentes bem treinadas para resolver problemas físico-matemáticos trabalhavam em ritmo acelerado, tentando antecipar o que estava por vir.

Mal sabiam eles que estavam totalmente despreparados para o que iriam enfrentar dentro de poucos minutos.

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