sábado, 23 de outubro de 2010

Simbiose


Às vezes, ele me olha fixamente, me abraça, me beija e conversa comigo, mesmo sabendo que a minha mente funciona muito diferente da dele.

Nossa relação é de cumplicidade, quase uma simbiose. Ele depende da minha companhia, eu dependo dele para sobreviver, embora creia que em estado selvagem - eu nasci em África, afinal - eu possa me virar bem. Ele cuida de mim e eu velo por ele. Eu sei quando ele está para chegar em casa. Sinto a sua presença, apenas por instinto. Ele conhece meus passos, sente quando estou por perto e me faz as vontades. Sabe quando eu entro no quarto, à noite, para pedir um “cheiro”na cabeça e deitar-me ao seu lado. Só faço isso depois de dar uma boa vistoria na casa, pois ele só fecha as portas e apaga as luzes. Alguém tem que cuidar de tudo por aqui, com mais responsabilidade.

Aprendi a lidar com ele e ele aprendeu a ler minha linguagem. Eu tenho necessidade de saber onde se encontra, para garantir que não vou ficar só, mas também tenho necessidade de sossego, no que sou respeitado, normalmente.

Gosto de música, mas nem de tudo que se ouve nesta casa. Ele conhece meu gosto e fez uma selecção especial para me tranquilizar. Costumamos ter nosso espaço e tempo exclusivos para isso, de vez em quando. Aos domingos à noite, especialmente, enquanto ele passa as roupas a ferro, deito-me por perto, ouvindo aquelas músicas mais calmas, em silêncio, até que termine sua tarefa e chegue a hora de nos recolhermos.

Ele pensa que eu pertenço a ele, mas no fundo, sabe que é o contrário. Quando me chama pelo nome, eu venho correndo em resposta, porque sei que, de alguma forma, ou precisa de mim ou vai dar-me algo para comer. Às vezes é puro “dengo”, mas eu gosto. Quando me despenteia, estragando o trabalhão que levei horas fazendo, eu me irrito e volto a me pentear.

Quase não brigamos, mas quando eu estou de mau humor e o ataco, ele fica chateado e me dá broncas, mas estas não são muito sérias. Somente quando eu fujo pela varanda e entro na casa do vizinho é que ele fica, mesmo, muito irritado e me põe de castigo. O castigo é greve de fala e de atenção. Fico incomodado quando ele faz estas greves. Tento de tudo para que ele me desculpe e para que aquilo dure pouco tempo, mas ele é turrão, quase tão teimoso quanto eu. Eu sei que ele sofre com isso, também, porque me diz, quando pede desculpas e fazemos as pazes.

Quando quero algo, sou insistente. A maioria das vezes percebo que ele cede, depois de algum tempo. As restrições estão relacionadas com minhas idas ao corredor e escadas e, também, ao barulho na frente das portas dos vizinhos.

Ele reconhece minhas vocalizações, quase sempre, sem erro. Algumas vezes tenho que ser mais óbvio, pois ele anda meio distraído.

Não gosto quando fica horas na frente do computador e me dá menos atenção que estou habituado a receber, mas na maioria das vezes ele pára e me dá alguma.

Somos independentes em termos de relacionamentos com outros, mas somos muito apegados entre nós. Sei que ele fala muito a meu respeito. Deve ser por gostar tanto de mim. Eu dou-lhe atenção quando quero ou quando vejo que está precisando. Ele sempre está pronto para me dar atenção, mesmo quando quero ficar sozinho. Gosto quando ele me escova a cabeça e o corpo, deita sua cabeça sobre a minha, ou quando me pega no colo e me abraça ao chegar em casa. Gosto de deitar sobre a sua barriga, enquanto ouvimos música, deitados no sofá. Eu, então, recito meu “mantra”, num ronronar contínuo, que lhe abranda as preocupações e o faz cochilar. Isto também me acalma e atenua minhas tensões.

Eu associo palavras que ele usa, com minhas atitudes. Sei quando me chama pelo nome, quando menciona a palavra comida, associei o convite ”vamos tomar café?” a ganhar uma colherada de iogurte, e sei quando me chama para deitar e dormir. Meus horários e minhas rotinas são evidentes e as dele também. Eu não gosto de ver as coisas fora do lugar e me acostumei com aquela sua mania de organização.

Eu sou um sénior agora. Ele se deu conta disso, quando conversou comigo hoje. Sei que faz pouco sentido ter expectativas que vou viver tanto quanto ele, mas percebi que chorou quando falou sobre isto. Aliás, tem chorado bastante ultimamente. Às vezes me pede desculpas, por parecer estúpido. Eu olho nos seus olhos e espero até que a coerência volte e ele me diga que está bem. Não sei se compreendo o que se passa, mas mesmo assim, mostro que estou ali para o que der e vier, se for necessário. E ele parece contentar-se com isso. Eu gosto quando me olha com afecto, o que é quase sempre. Me faz sentir amado, mimado e especial. Eu sei que ele gosta da minha atenção e minhas demonstrações de carinho, porque se diverte com isso.

Ele ri. Ele sempre ri. Às vezes apronto alguma, só para ouvir a gargalhada dele. Os vizinhos devem pensar que é louco, mas não o vejo muito preocupado com isso.

Minha vida é bem tranquila. Não tenho acessos de ciúme, pois não tenho motivos para isso, por enquanto. Mas minha veia possessiva é bem acentuada e lembro bem que já mostrei quem pertence a quem, quando tive que o fazer. Ele está dentro do meu domínio, portanto me pertence... e ponto final! Nem que eu o tenha que "marcar" como parte do meu território!!!

Bom, agora que já lambi meu pelo todo, vou-me deitar e tirar uma soneca sobre o meu tapete favorito. Minha barriga está cheia e vejo que ele está ocupado no computador. Minhas músicas favoritas estão tocando e vou relaxar um pouco, até a hora de ser chamado para escovar os dentes e ir para a cama, nossa rotina nocturna, que eu controlo com maestria. Amanhã sei que vou ganhar meu carinho habitual e minha dose de atum, que eu adoro comer quando ele está em casa, na hora do jantar… a não ser que faça um bom peixinho assado e divida comigo… Hummm… O amanhã promete!

Ah, antes que esqueça: meu nome é Tiger…
                                                                                                                                    

domingo, 10 de outubro de 2010

The Smiling Game

I walked along
The frenzied streets
Of life,
Not fully aware
That behind a pair
Of amazing shy
And inquisitive eyes
And perfectly-designed lips,
-Decorating lovely features -
There was such a spark,
Which could ignite
A flame inside my chest
And my mind.
But then you smiled…
I was caught
In the middle
Of a million
Swirling emotions,
Like a fallen leaf
-Dragged around
By the winter wind-
And felt like
All lights were
Switched on
In front of my eyes,
Turning an ordinary day
Into a special one
For my unprepared
And skimpy heart.
You noticed
-Immediately -
I was mesmerized
By the sweetness
Of what that grin
Of yours
Could bring into my life
And decided to play
My game,
So you suddenly
Looked at me…
…And smiled again…
I felt so weightless
And so emotionally
Magnetized by you
That I asked myself:
If this is just a game,
Why do I have
Such a pleasure
Playing it?

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Páginas

E toda manhã
Sou uma página
Em branco,
Sendo escrita
Aos poucos,
Com a tinta indelével
Do destino,
Para ser virada,
Novamente,
Na manhã seguinte,
Sem perder as minúcias
Dos registros deixados
Na passagem anterior.
E toda manhã
Sou uma página
Em branco,
Sendo pintada
Com palavras
De vida,
E garatujas
De verdade,
Em aquarelas,
De cores suaves
- Mas firmes -
Trazendo a nitidez
Com a distância
E a beleza
Da técnica,
Com a observação
Detalhada
De cada momento.
Um dia,
Ao folhear as laudas
Já escritas,
Buscando lições
Aprendidas
E memórias
Deixadas
Com carinho,
Verei, apenas,
A beleza deixada
Pelas emoções
Que vivi
Com intensidade
E os arabescos
De sentimentos diversos,
A decorar,
Com esmero,
As páginas repletas
De boas recordações.

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Whispers

Your body
Is a temptation
I don´t mind to indulge
Myself into.
I surrender to desire
And lust
Giving myself up
To the beauty
Of your lovely features
And the sweetness
On the tender contact
Of your fingertips
Making their way,
Carefully,
All along my skin
And taking me
-Smoothly-
To unfamiliar places.
Your lovely smile,
This charming melancholy
In your mystifying eyes
And your sweet voice,
Whispering in my ears,
Words I would not dare
To speak out loud,
Bring me sensations
Which are brand new to me,
But they remind me
This feeling is surely
An old friend of mine.

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Hidden Track

You came into my days
-Slowly and tenderly -
When the silence
And the emptiness
That surrounded me
Shaped a shield
Around my splintered soul.
You threw my balance
Into a turmoil
Like the unexpected surprise
Of a hidden track,
After a sequence
Of innumerous,
-Already lovely-
Pleasant-sounding songs.
You touched my heart
With your gorgeous smile
And the tenderness
Of this tricky sadness
In your eyes
Allied to your feline,
Moving grace,
Filled me up
With dreams
Of affection and yearn.
And when that song
Was over
And silence was back
To my ears
-And my spirit-,
I switched it on
Once more
And played it over
And over again,
Until my heart
Settled down
With the sweetness
Of your sound and rhythm
And I gently fell asleep
In your arms,
Taking advantage of
The charming harmony
Of your poignant
And warm embrace.

sábado, 3 de julho de 2010

And You Dance...

You like white wine,
Poetry
And good music...
You have your dreams,
Your fears
And your joys...
Your smile is light
To my days
And your eyes,
Like dark beads,
Carry the beam
Of the stars,
Into the night.
And you dance…
And when you dance,
Your heart becomes one
With the music
And your body becomes one
With the light...
And my eyes,
Hypnotized by the movements,
Hope I had wings,
So I, too,
Could fly…
When I watch
Your body,
Floating in the air,
I almost think
I’m in ecstasy,
For this bird
Has broad wings
And flies…
And when you wide open
Your arms
On stage,
I think of angels
In heaven,
Cannot hold myself,
Get emotional
And cry…

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Obrigado...


Obrigado por não me ouvires,

Por não me responderes,

Por não dares, a mim,

O valor que eu dou a ti,

Porque somente assim eu me torno

Mais consciente

Das minhas próprias necessidades.

Obrigado por me deixares lutar

Sozinho,

Este conflito,

Sem fim,

Porque, somente assim, sinto

Meu espírito fortalecido

E me torno um lutador

Tenaz e incansável.

Obrigado por me abandonares

À minha própria sorte,

Pois, somente assim, procuro

Encontrar meu caminho,

Mesmo quando me sinto perdido.

Obrigado por seres quem tu és,

Porque assim eu tento

Ser sempre melhor,

Mesmo que não me vejas

Como tal.

Obrigado pelas noites mal dormidas

E pelos sonhos

Que não se realizam,

Porque, somente assim, desejo

Que a vida seja mais generosa

Que meus despojados sonhos.

Obrigado pela falta de contacto,

E pelo árido vazio que deixas

Em minha alma deserta,

Pois somente assim busco inspiração

Na tua ausência

E na austeridade do teu coração.

Obrigado pela amizade

Que não me dispões,

Pois é graças à ela

Que eu crio um mundo,

Onde a poesia

É minha maior força.

Obrigado,

Porque tu és a causa

Do amor à vida

Que hoje eu tenho,

E porque sem ti,

Meu coração seria duro

E insensível

E a vida, sem beleza.

Obrigado, porque sem as lágrimas

Que orvalham minhas manhãs,

A música seria vazia

E as cores, absolutamente desbotadas.

Obrigado pela distância

Que manténs de mim,

Porque somente assim

Eu me sinto tão próximo

Da tua alma de criança,

Que não aceita o carinho

Que eu tenho guardado

Para te dar.

Obrigado por me deixares viver

Sem a tua presença,

Porque somente assim eu consigo

Amar tanto

O meu simples viver…