domingo, 4 de dezembro de 2011

Autumn Cleaning...


You, just like me,
Need the force of the wind
Blowing fiercely
Through your soul
And carrying away
All your brown tinted
Old and dry leaves,
Withered by the pain
And despair
Of days,
Baring your branches
And preparing your heart
For the winter cold
And silence
That will follow
This so-needed
Autumn cleaning.
You, just like me,
Need to stay away
For a while,
Allowing the seeds,
That are buried inside you,
To germinate
Underneath the frosty
Winter-snowed covers
Of your days...
And when the Spring sun
Comes to warm up
This slumbering soil
One more time,
Bringing new comfort
To your distressed spirit,
A perfectly designed smile,
Which will bloom
On your face,
Will show you’re ready
For new and bright colours
Of a fresh beauty,
That will paint your life
From then on
And the light in my eyes
Will bring you close
To the heart
Which hung around,
Almost hopeless,
Waiting for you
To be prepared
To come out
And bring verve
Back to the one
Left in the bitter dark
Of lonely and endless nights...
Just don’t forget
To blossom to the daylight
And to the eyes,
Which waited for so long,
To see you bring hope
To this dreary world
Once again...

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Em Vermelho e Azul


Eu conversava animadamente com Adrian, o acrobata, que havia acabado de apresentar sua performance da noite. Dizia-lhe, entusiasmada, como admirava seu show. Eu e alguns convidados estávamos, naquele momento, numa ampla sala de espectáculos, juntamente com os atletas e os promotores do grupo de circo búlgaro. Não percebi, porém, que estava exposta de maneira um tanto peculiar ao ambiente em que me encontrava. 

James me observava em silêncio, de certa distância, sem que eu desse conta de sua presença. Aproximou-se, cumprimentou o artista, elogiando sua actuação e se dirigiu a mim, como se me conhecesse, assumindo que partilhávamos interesses comuns naquele lugar. 

A princípio tentei-me desviar, para não constranger a atracção principal da noite, mas aquele jovem homem não tirava os olhos de mim e insistia em monopolizar minha atenção. Adrian percebeu logo e piscou-me o olho, em cumplicidade. Desculpei-me ao meu bem-educado interlocutor, desvencilhei-me do pequeno grupo, cautelosamente, com um leve aceno de cabeça e fui para o lado de fora, na pequena varanda que tinha vista para o mar, fingindo precisar de ar puro. 

O acrobata se entreteve com os outros convidados, mostrando sua cordialidade e gentileza e seu comprometimento com o espectáculo que havia acabado de dar. 

James seguiu-me, depois de algum tempo, para minha não total surpresa… Virei-me, ao ouvi-lo chamar meu nome e olhei-o directamente no rosto, sorrindo. Seus olhos azuis traziam uma tristeza misteriosamente profunda, como as águas de um imenso oceano. Fiquei imediatamente intrigada com aquela característica de seu olhar. 

Por sermos desconhecidos um do outro, “small talk” começou sobre o assunto comum entre nós: a apreciação pelo espectáculo de acrobacia que acabáramos de assistir e nossa admiração pelo atleta principal. 

Aparentemente não era a única coisa que tínhamos em comum, como pudemos perceber através do curso que nosso diálogo seguiu. Em poucos minutos já conversávamos animadamente como dois amigos de longa data, dada a facilidade e velocidade com que nos tornamos afins. Descobrimos que partilhávamos não somente interesses, mas também histórias similares. Dei-me conta que nossos pensamentos alinhavam-se quase automaticamente, como se fôssemos conhecidos desde há muito tempo. Ao me contar alguns detalhes de sua caminhada, percebi que aquele homem tinha um grande problema pendente com seu passado recente, que precisava resolver logo, antes que fosse demasiadamente tarde. 

Intoxicado por um relacionamento drenante, onde dava mais que recebia e que o tornava vulnerável, não parecia perceber o perigo que corria. Vendo friamente do lado de fora, eu tentei mostrar-lhe os riscos e para onde aquela relação o levaria, se ele não colocasse um ponto final o quanto antes. Já havia passado por situações semelhantes, mais que uma vez, por isso sentia-me confortável em dizer-lhe o que pensava. 

Eu sou perita em relacionamentos que não deram certo. 

Ele pareceu compreender minhas palavras e minha apreensão. Dei-lhe o que pensar, tinha certeza. Sugeri nos encontrarmos novamente, no dia seguinte, para um café. James era cultor do corpo e mente sãos e dispensava cafeína de sua dieta. Sua recusa me fez enrubescer, mas ele sorriu e disse que me acompanhava, de qualquer jeito. Não o condenei, pois há não muito atrás, eu tinha a mesma atitude com meu corpo. 

Sugeri, então, uma boa taça de vinho tinto, que se mostrou ser uma decisão mais acertada e conveniente – talvez até mais elegante. 

Ao invés do dia seguinte, acabamos por seguir nossos instintos e descer até um pequeno restaurante, não longe dali. Não vimos o tempo passar, enquanto a conversa aprofundava o conhecimento entre nós e somente fomos chamados à vida, quando o garção trouxe a conta, para poder fechar o recinto. 

Já na rua, caminhando lado a lado, perguntei-lhe sem levantar os olhos do passeio, como se fosse a coisa mais natural do mundo: 

“Onde estiveste minha vida toda?” 

“Envolvido com pessoas erradas… esperando por ti”, foi a rápida resposta dele, parando em minha frente e olhando-me fixamente nos olhos. 

Fingindo não perceber o gesto espontâneo dele, nem as prováveis intenções e sentindo meus músculos do pescoço ficarem subitamente tensos, dei uma risadinha nervosa e continuei a caminhar. Ele não se deu por vencido. 

“Eu quero te ver – completamente e por inteiro. Tu te mostras a mim, por inteiro? Por Favor...” 

“Então me prometa que o passado fica no passado.” Ele sorriu, meio sem jeito. 

O que eu lhe pedia era um grande sacrifício e ambos sabíamos disto. Seguimos meio sérios demais, a caminho de casa, evitando olharmos um para o outro, durante o resto do trajecto. 


A pouca luz que entrava no aposento não me permitia ver aqueles olhos azuis, que eu passara a admirar, tão logo os vira pela primeira vez. Sabia que ele me estudava em silêncio e tentei esconder o sorriso, achando que passaria despercebido. Ele então segurou-me a mão e sussurrou: 

“Tudo em ti é perfeito para mim... teus cabelos, teus olhos, teu nariz, tua boca... ah, tua boca… teus seios, tua barriga, tua... mmmmmm... tuas nádegas, tuas pernas... tudo, Cass.” 

Ele, ao contrário de mim, evitava usar palavrões quando falava, até mesmo quando se irritava com alguma coisa, como somente fui perceber bem mais tarde. Naquele momento, ele se referia ao cuidado que eu vinha tendo com minha aparência física, nos últimos tempos. Depois de haver perdido algum peso, me recusava a aceitar a idade que se apoderava de mim, em velocidade intolerável e desenfreada. Ele sabia e por isto mesmo costumava dizer o quanto gostava de ver meu corpo, alimentando minha vaidade, para meu deleite. 

Nos poucos dias que se seguiram, inventamos uma rotina nova, que ia evoluindo em intimidade. Muitas vezes não precisávamos falar mais que umas poucas palavras, para nos entender, preferindo usufruir o silêncio dos olhares e a nossa companhia mútua. Outras vezes falávamos sem parar, por horas, compartilhando pequenos segredos que iam nos aproximando cada vez mais


Eu chegara do trabalho e via uma mensagem recebida enquanto eu estava fora, a piscar na tela do computador. Sorri para mim mesma, pensando com meus botões, que James devia querer dizer-me algo interessante ou importante. 

A mensagem era directa, quase seca. Ao ler, fiquei sem saber o que dizer, absolutamente sem reacção... apenas com uma vontade enorme de chorar. Li e reli… uma, duas, três vezes… 

Cass... Eu tenho que me afastar daqui por uns tempos... Tenho uns amigos fora do país que sempre me convidam para visitá-los e agora é a ocasião perfeita para ir. Vou aproveitar esta oportunidade para ficar sozinho e me centrar, num ambiente diferente deste em que me encontro. Se não fosse por ti, nunca teria tido coragem suficiente para enfrentar meus medos. Eu preciso destes momentos sozinho, mais do que nunca... Te digo isto agora, para que possas ter tempo de ler e tentar entender, antes que nos falemos outra vez.” 

Desaparecer por uns tempos - mudar de ambiente, para poder aclarar sua mente… Minha razão temeu que houvesse mais coisas a ter que ficar em suspenso – por prazo indeterminado. 

Ele, afinal, havia ouvido com atenção os conselhos que lhe dera, sobre colocar um ponto final na situação que o deixava vulnerável ao extremo. Eu deveria ficar contente com aquela decisão, mas ao contrário, entristecera, por ter que deixá-lo afastar-se de mim, por um tempo que não sabia precisar. Embora já me sentisse envolvida demais, decidi manter as expectativas baixas, para evitar embarcar em uma viagem perigosa, para quem já tivera tantos dissabores. 

Era a vida repetindo seu drama continuamente. Já passara por aquilo, não somente uma, mas, pelo menos, três vezes. E em todas as vezes anteriores em que fora necessário esperar, as perdas haviam sido inevitavelmente evidentes. 

Quem volta, volta sempre diferente… e meu coração sabia quem perdia… sempre. 

Quando nos encontramos novamente, ele me disse que não fugia de mim, mas daquilo que o fazia sentir-se usado. 

"Eu não estou fugindo, nem me afastando de ti... mas eu preciso me encontrar, antes de me envolver completamente, outra vez, com alguém. Eu não quero sofrer uma recaída, nem te fazer sofrer por minha causa, por não estar totalmente preparado”. 

Eu compreendia que se não lavasse a “alma”, não poderia voltar apto para enfrentar novos desafios. A decisão que ele tomava era séria demais. Talvez tivesse sido levado a aquilo, por querer que o relacionamento desse muito certo entre nós… por me levar mais a sério que outras anteriormente. E eu não podia fazer nada para impedir… tinha mais é que incentivá-lo, ou jamais o teria plenamente livre para fazer parte de minha vida. 


Sentada na praia, observando os movimentos que o jovem homem fazia com a prancha sobre as ondas, deixei meus pensamentos deslizarem soltos, ao som continuado e repetitivo do arrastar das águas do mar sobre as areias. 

O corpo firme, sustentado pelas pernas musculosas, das quais tinha enorme orgulho, fazia manobras cuidadosas, arriscando mostrar-se quase desnecessariamente, mesmo sabendo que eu dava menos importância ao facto e mais ao elemento em si. Acenei-lhe. Sabia que fazia por querer que eu o visse melhor, não por ser naturalmente audaz, embora eu já o admirasse, fosse qual fosse a atitude. 

Não demorou muito a vir caminhando em minha direcção, ofegante, mas com um sorriso encantador me saudando desde ainda certa distância. Fincou a prancha na areia e estirou-se ao meu lado, exalando um longo suspiro, deitando de costas sobre o chão da praia. 

Eu o olhei, sem dizer nada, apenas sorrindo. Muitas vezes preferíamos dividir o silêncio, ao invés de trocar palavras sem objectivo específico. Ele olhou-me nos olhos e disse, baixinho: 

“Oh, eu me sinto tão bem”… 

Eu sabia o que ele queria dizer com aquela frase. Levantei-me e apanhei a mochila que tinha uma toalha seca, que atirei-lhe, brincando. Ele passou a mesma sobre o rosto e os cabelos, dobrou ao meio e entregou-me, em seguida. 

Levantando-se, tomou a prancha sobre o braço e começou a caminhar ao meu lado, sem dizer mais nada. Eu segui chutando a areia, na direcção do carro, sem olhar para o lado, onde ele agora caminhava assobiando uma canção conhecida. 

A caminho de casa ele me perguntou: 

“Está tudo bem?” 

Eu respondi-lhe que garantidamente me sentia muito bem, graças a ele. Ele sorriu e resmungou um “oh…”, sorrindo em seguida, como se fosse um menino que ouvira um segredo que já conhecia… dissimulando surpresa, para não estragar o momento. Soquei-lhe o braço chamando-o de bobo. Ele fingiu que doeu e gritou um “ah”, rindo alto, logo em seguida. 

“Tens fome?” 

Balancei que sim com a cabeça. 

O cd player tocava uma sequência que ambos havíamos escolhido e eu cantarolei junto com a voz ao altifalante, “did you ever know that you’re my hero? You’re everything I would like to be. I can fly higher than an eagle if you are the wind beneath my wings”… (Bette Midler - Wind beneath my wings)

Ele sorriu levemente, sem tirar os olhos da estrada. Era uma de suas canções favoritas. 


A garrafa de vinho, meio cheia sobre a mesa da cozinha, testemunhava o olhar que ele me lançava por trás da taça de cristal, enquanto saboreava seu tinto preferido. Havíamos preparado o jantar a quatro mãos, tornando uma tarefa quase banal em um exercício de cumplicidade. 

Aqueles olhos procuravam os meus, dizendo-me coisas sem falar e fazendo-me enrubescer ao pensar em indecências detectadas automaticamente pelo homem sentado à minha frente. 

O forno apitou, desviando minha atenção e a dele, para o prato que ficava pronto, enquanto Ginger entrava às pressas, esperando ganhar sua porção. 

Quase uma hora mais tarde, uma segunda garrafa havia sido aberta e já ia pela metade. Estávamos ambos sentados confortavelmente no sofá da sala, ouvindo música e acariciando as costas e cabeça do mimado felino, que ronronava alto, deleitando-se de satisfação, com tanta atenção que recebia. 

O álcool provocara um efeito relaxante em nós, colocando um pouco de cor em nossos rostos e dando-nos uma sensação de serenidade. James olhou-me nos olhos e disse, no seu tom tranquilo de voz: 

“Minha cara Cass. Estou tão feliz de estar aqui contigo. Eu me sinto tão afortunado neste momento”… 

Olhei-o com autêntica ternura, compreendendo perfeitamente ao que ele se referia e sentindo-me bem, também, como jamais havia-me sentido antes... 

O vermelho vivo do vinho e o azul profundo de seus olhos me fizeram pensar em outros tempos, quando estas duas cores mexiam com meu equilíbrio. Ele percebeu a luz de meu olhar se tornar baça e meu semblante entristecer. Sabia ler meus movimentos melhor que ninguém, apesar do pouco tempo que estávamos juntos. 

Puxou-me com delicada firmeza e me abraçou com verdadeiro carinho. Movido pela atitude espontânea daquele homem, deixei-me levar pela emoção do momento e chorei em seus braços. Ele apenas sussurrou meu nome, várias vezes, tentando me consolar: 

“Cass, Cass… minha tão doce Cassie”… 

Senti seu corpo responder ao calor do meu, fechei os olhos e abandonei-me. 

Ele pousou seus lábios no alto de minha cabeça e suspirou profundamente, enquanto me mantinha aninhada em seu abraço, como se eu fosse uma criança que teme a tempestade e se conforta na força de quem confia. Então me beijou a testa, as pálpebras, o rosto e os lábios, com gentileza, no começo, depois com ardor, quase com desespero, como se aquele fosse o último dia de nossas vidas. Agarrei-me ao desejo de ser feliz e à paixão exacerbada que se apoderou de nós, sem medo e sem preconceitos, seguindo o curso que o momento tomou, em direcção a um ponto de luz que se movia, para além da distância e do tempo, sem piedade de nós. 


E ele me amou como um grande sedutor faz. Usou todos os sentidos, sem pressa, sem medo, sem reservas. À meia-luz da sala eu apreciei todos os detalhes da beleza daquele homem, bebendo amor de sua boca, aspirando o perfume que emanava de seu corpo, ouvindo seus sussurros e seus gemidos a preencher meus ouvidos, sentindo o calor de sua pele a aquecer meu corpo, vibrando com seu toque em cada pedaço buscado em mim, causando-me arrepios de prazer, em contraste com o fervor do momento. 

Uma mulher precisa se sentir segura e amada. Faz parte da natureza feminina. 

Aquele homem sabia como fazer-me sentir admirada, respeitada e especial. Ele me amou não uma, nem duas, mas três vezes seguidas, insaciavelmente… incansavelmente. Cada vez que acabava de me amar, beijava-me com ardor e me olhava com ternura, provando-me sem parar, iniciando um novo processo de exploração que parecia não ter fim… e nem eu queria que tivesse. Meu ser inteiro respondia aos estímulos dele, como se meus sentidos quisessem mais e mais usufruir de cada detalhe do que ele me proporcionava naquela noite, madrugada a dentro. 

Eu já não pensava: eu somente sentia… tudo – intensamente - e com todos os meus sentidos, com todo meu corpo, com todo meu ser. Quando finalmente adormeci em seus braços, encaixada nele – yin e yang: as duas metades de um todo - complementando-me em meu amante, como se fosse parte essencial do que ele era, ali, naquele momento – e como se ele fosse a parte mais fundamental de mim, senti-me acolhida por um anjo, suspensa entre o céu e a terra. 


O orvalho da manhã escorria pela vidraça quando o sol riscou o horizonte com sua faixa achatada de luz colorida e desenhou sombras alongadas no chão da sala. Olhei o homem que me olhava seriamente nos olhos, enlaçando-me ainda em seu abraço confortante, segurando-me com firmeza, como se tivesse receio que eu lhe pudesse fugir. 

Então, como se trespassado pela seta perniciosa e envenenada de algum demónio determinado a nos afastar, aquele azul intransponível em seu olhar pareceu distanciar-se de mim, sem emitir som algum, à velocidade da luz. Um imenso buraco negro de silêncio estabeleceu-se, instantaneamente, entre nós. Era hora da partida…

A caminho do aeroporto, sentia um peso enorme aniquilar-me a alma. O silêncio da viagem esmagava nossos corpos - agora tensos - e sufocava as palavras que não eram proferidas. Quando ele passou pelo controle de bagagem e olhou-me, acenando discretamente, sorri um sorriso triste e acenei-lhe de volta, sabendo de antemão que, naquela despedida, ele levava todas as minhas esperanças consigo e deixava uma sensação de impotência em relação ao nosso futuro juntos. 

Ao chegar em casa, percebi que havia uma mensagem de Adrian, na caixa de entrada… Li, com cuidado e desliguei o computador, sem responder. 

Deitei-me no sofá, na penumbra da sala, onde há poucas horas partilhava meus últimos momentos junto ao homem que havia partido em busca de si mesmo. Meu coração apertou-se, temendo pelo futuro, que tornava-se uma mancha nebulosa em minha cabeça. 

Ginger aproximou-se de mim, pediu permissão - com um leve grunhido - e aninhou-se sobre meu peito a ronronar, como tantas vezes fazia, quando me via quieta demais ou percebia alguma tristeza no ar. Abracei o animalzinho e deixei as lágrimas fluírem espontaneamente face abaixo. 

Ele me olhou fixamente nos olhos e colocou a pata – delicadamente - no meu rosto, como se tentasse me consolar, diante da angústia que sentia vir de mim, em descontroladas torrentes de choro… 

sábado, 1 de outubro de 2011

Para quem pensa...

...que eu andava parado este tempo em que não publiquei nada...

Estava às voltas com as tintas...

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Pudim de Pão


“Rapazes, um de vocês vá lá em cima e me traga três ovos frescos, que eu quero fazer um pudim de pão.”

O “lá em cima”, a que ela se referia, era um dos vários ninhos, dentro do galinheiro que havia na parte mais alta do terreno contíguo à casa. Eu sabia que a mensagem era dirigida a mim, que estava quase sempre disponível. A simples menção ao pudim, já me fazia exultar, pois tinha uma grande afinidade com doces, naquela época. Não seria esforço nenhum da minha parte fazer o que me era pedido, pois já antecipava a compensação, no final.

A receita que ela usava devia estar na família havia anos. A simplicidade era estupenda, mas o que a fazia peculiar eram os poucos ingredientes usados e a forma com que ela trabalhava a massa do pudim. Na fórmula, nada além de pedaços cortados de pão francês amanhecido, leite, açúcar e alguns ovos. Estes eram batidos com muito vigor, por aqueles braços musculosos, que nunca conheceram cansaço. Não precisava muito mais, além de alguma imaginação, para fazer mais uma das várias iguarias inimitáveis dela.

Era no detalhe que estava a magia do processo. Não usava pão doce para a preparação – somente o francês e o de trigo, como chamávamos – que eram de massa salgada. Este era deixado de molho no leite adocicado com açúcar refinado branco, por algumas horas. Depois de bem amolecida, aquela massa era misturada, energicamente, à mão, por vários minutos, até ficar sem grânulos ou pedaços não dissolvidos. A seguir, era deixada mais um tempo a repousar, para amaciar melhor ainda, num processo que se repetia umas duas ou três vezes, até que ela se desse por satisfeita.

Minha mãe tinha a potência infatigável de uma máquina, sempre pronta a fazer de tudo para nos proporcionar alguma surpresa em termos de culinária. Era um dom que possuía. Tudo que fazia tinha que ser perfeito e quando elogiada, costumava dizer: “claro! Fui eu quem fez!”, dando uma risadinha logo em seguida.

À massa já descansada, ela acrescentava os tais três ovos, previamente batidos e misturava mais um pouco, usando a mesma energia de sempre. Uma pitada de sal, um punhado de cravos, um pouco de coco fresco - ralado à mão - e estava pronta para ser assada em forno pré-aquecido, depois de salpicada com um pouco de açúcar e canela em pó. O processo de cozimento estava terminado quando a bela e atraente côdea ficava dourada, endurecida e quase crocante. Era aquela crosta que eu deixava para comer depois da parte mais suave, pois tinha a mania de deixar o melhor para o fim.

Quem pegasse a parte das bordas tinha vantagem, pois eram mais crocantes que o meio. Como o grande tabuleiro de alumínio tinha apenas quatro cantos, aquelas eram as partes mais concorridas. A disputa era grande quando nós, os três irmãos, estávamos sós. Quando ela estava, porém, distribuía de acordo com o seu próprio critério, com o qual eu não concordava totalmente, mas sua autoridade era inquestionável.

A parte de baixo do pudim ficava consistente e aveludada, com um tom acastanhado suave. Esta contrastava com a firme superfície. Tinha que ser feito de véspera, para estar no seu melhor. Quanto mais frio, mais compacto ficava e podia ser cortado com faca, por isto era preferível ser comido no dia seguinte.

Muitos anos mais tarde, quando fui morar longe e me tornei independente, tentei fazer minha própria versão do pudim, adicionando um pouco de leite condensado, ao invés de leite com açúcar. Também acrescentava uvas passas ao invés de coco, uns cravos-da-índia e erva-doce, para manter parte da identidade original, mas não cheguei a conseguir aquela textura lisa e densa que ela obtinha. Aprendi que em Portugal usa-se somente pão doce na preparação da massa, o que difere bastante da composição que minha mãe fazia. Eles também usam leite condensado ao invés de leite e açúcar, mas além da canela, não encontrei outro tipo de especiarias no pudim de pão português que comi.

Eu era uma espécie de coadjuvante das aventuras culinárias de minha mãe. Ela sabia que podia contar comigo para ajudar, não só na cozinha, mas em qualquer outra actividade. As receitas eram copiadas num caderno especial, que eu devia manter sempre actualizado e com letra bem legível. Também era eu quem a ajudava a bater as massas de bolos e a controlar o tempo de cozimento de receitas novas. Às vezes me pedia para adivinhar qual o ingrediente secreto que ela usava. Era uma espécie de jogo que ela, invariavelmente, vencia, mas eu tinha o privilégio de tomar conhecimento de alguns de seus segredos gastronómicos, que mais tarde passava a adoptar nas minhas próprias proezas na cozinha. Com o tempo fui percebendo que cozinhar tinha uma lógica simples. Uma vez que se aprenda a lidar com as bases, doces ou salgadas, não há muito o que mudar. É a criatividade, aliada à experiência, que faz a diferença. E ela era mestra nisto. Adorava cozinhar e sentia prazer em receber os louvores e os pedidos – sempre atendidos - para repetir a dose.

Guardo belas memórias daquele tempo de inocência. Em algumas ocasiões, à tarde, quando estávamos sozinhos em casa, ela me dizia que estava com vontade de comer “uma coisa boa”. Era um tipo de código entre nós, para que eu fosse à confeitaria, comprar algum doce para o café da tarde.

Recordo-me bem da segurança que ela nos fazia sentir. Era senhora do tempo e das tradições da nossa pequena família. Todos sentados à volta da farta mesa, na ampla e iluminada sala de jantar, muita conversa e bom humor, faziam dos fins-de-semana, mesmo os mais comuns, peculiares por si próprios. Os aniversários das crianças e o almoço de Natal eram ocasiões especiais que uniam o nosso pequeno grupo familiar. Ela era a última a sentar-se e somente o fazia depois de certificar-se que todos estavam bem servidos. Meu pai colocava-se à cabeceira, sempre no mesmo lugar, respeitado por todos e vigiado por ela. A emoção era característica dele. A força, era dela. Os filhos e, mais tarde, as noras e os netos, davam-lhes uma enorme alegria e ela dizia gostar de ver a casa cheia, o que provavelmente trazia-lhe lembranças do tempo de infância, quando o pai e os tantos irmãos e irmãs se reuniam sempre às refeições, respeitosamente. Pelo que eu conseguia tirar das conversas com ela, meu avô era um homem austero e reverenciado pela família, mas era também justo e generoso. A imagem, que ela nos passava dele, era de um homem extremamente sério. Eu não o conheci, todavia - embora ela afirmasse que o “avô Vida” chegara a me conhecer e me dizia, às vezes, que eu tinha muitas semelhanças com o porte físico dele.

O tempo passa depressa demais, sem piedade, apagando algumas memórias, avivando outras. Meus mais que cinco sentidos brincam com meu passado, quase sempre, de forma aleatória, mas coerente com minha história. Eu sempre me impressiono com o cheiro do mar, da terra húmida, das frutas no pomar. Amo o vento sul a soprar com força singular sobre a terra, as pessoas e as construções, a rugir entre as folhas dos cedros e dos chorões, levantando plumas de sementes de dente de leão pelo ar, fazendo redemoinhos à minha volta ou despenteando-me com energia. Aprecio caminhar descalço pela orla ou ficar sentado, por horas, a olhar o movimento das ondas, com os pensamentos soltos na distância. Recordo, com nostalgia, o aroma das laranjeiras em flor, os perfumes da flor roxa e da espirradeira ao anoitecer, da macela-galega dentro dos travesseiros, dos temperos verdes, do cominho e da pimenta-do-reino, da alfavaca no peixe, das ervas no jardim sempre bem cuidado por ela, do alecrim e da arruda, da maçanilha e da melissa, da hortelã e do funcho, do capim-limão e da carqueja.

Sinto saudades daquela época, em que a Páscoa tinha o toque de surpresa e o aroma de canjica, de cravo, canela, erva-doce e coco fresco e também de pão de mel. Dezembro tinha som de cigarras cantando ao levantar do sol e dos “cigarrões” ao crepúsculo ou das de guizo, mais tarde, quando a noite ia adiantada. Dizíamos que o ar tinha cheiro de Natal. Era princípio de verão e o sol avivava o perfume das folhas verdes e do musgo já pela manhã cedo. Em época de férias de fim de ano, ficávamos brincando na rua até tarde, com a turma do morro, a tirarmos vantagem das sombras e da temperatura amena da noite. O vento nordeste sempre trazia o aroma de café torrado no ar. O inverno era marcado pelos pinhões sendo cozidos, lentamente, em panela grande, no fogão à lenha, enquanto um bolo de fubá ia assando no forno e o amendoim torrava na estufa, o compartimento logo abaixo daquele. As partidas de futebol da selecção durante a copa do mundo - quando sentávamos todos sobre a fofa esteira de “taboa”, aberta sobre o chão da sala - eram temperadas com uma grande tigela de pipoca salgada, feita na hora, servidas ainda quentinhas e cujo cheiro enchia a casa.

Hoje sou fascinado por novos aromas, que vou conhecendo aos poucos, nestas andanças de mais de meio século, por terras distantes de onde nasci. A alfazema fresca a crescer nos canteiros, a casca da canela e a fava de baunilha, o café expresso denso e forte, o pão saindo quente do forno, o azeite virgem de oliva, o vinagre balsâmico, o coentro, o alho francês, as pimentas malaguetas, o polvo na brasa e o frango assado na chama, o bacalhau seco, o salmão defumado, as folhas de “maple” caídas no chão de Outono, que me preenchem os sentidos e aguçam-me a imaginação.

***

 “O lugar de vocês é perto de mim.” Aquela mulher pequena, de pouco mais de um metro e meio de altura, que ao me abraçar tinha de fazê-lo por baixo dos meus braços, por não alcançar meu pescoço, me deixara quase sem resposta, apesar da naturalidade com que expressara seu pensamento protector e a preocupação em me ter vivendo fora do país, longe dela já não pela primeira vez. Eu tinha uma vida a viver, uma carreira a seguir, novos desafios a enfrentar e não podia abrir mão de nenhum deles, em função dos medos que ela poderia sentir, todavia. Eu tinha meus próprios riscos a correr. Respeitava o que ela sentia, mas minha independência era meu maior bem, especialmente naquele momento histórico da minha vida. Ela havia seguido sua própria trilha, muitos anos antes de mim, quando deixou o sítio da família pela vida na capital.

Eu não era tão diferente dela, afinal. Meu mundo era, porém, mais amplo que o dela havia sido. Aquele menino franzino, cujos ossos das costelas apareciam, quase perfurando a pele pálida, havia-se tornado um homem – muito mais sólido e independente, que fazia seu voo solo pela segunda vez. Minha rotina, de telefonar-lhe sempre aos domingos, nunca mudou, apesar da distância de um imenso oceano, nos separar fisicamente. Lembro que a última coisa que lhe disse foi: eu ligo na semana que vem.

Embora fizesse todo o possível para pegar o primeiro voo disponível, não cheguei a tempo do funeral e me senti um tanto frustrado com a observação que ouvi, logo ao chegar em casa, de que era “tarde demais”. Eu compreendia a dor, mas aquilo me deixara incomodado, mesmo sabendo que não houve nada que eu pudesse ter feito diferente. Não muito tempo depois, já de volta à minha vida normal, tive um sonho, que mexeu comigo e com aquilo que me importunava a cabeça. Eu via o frágil e pequeno corpo sem vida sendo preparado para o funeral, por umas mulheres conhecidas, sobre um banco de pedra, numa espécie de praça interna, de uma construção de casas. Como não podia fazer mais nada, decidi que era melhor deixá-las sozinhas a concluir o serviço e foi então que lembrei que tinha de sair para pagar uma dívida importante. Ao me dirigir à saída para saldar aquele débito, antes que fosse tarde, meu pai me interceptou e disse: “não tens nenhuma dívida a compensar. Está tudo pago”…

Naquele dia acordei mais leve, como se um grande peso houvesse sido retirado de minhas costas. Enquanto preparava o café da manhã, o pãozinho que jazia no prato, me fez lembrar do pudim de pão. Sentei-me em silêncio, à pequena mesa com tampo de granito escuro. Um aperto no peito me fez recordar dela com imensas saudades… Meus olhos perderam-se na distância, para além da porta aberta da varanda, onde Tiger observava o movimento do pátio, com atenção felina.

Como se percebesse minha angústia, meu pequeno companheiro entrou, sentou-se ao meu lado, dando a tradicional cabeçada em minha perna, chamando atenção para outras necessidades, naquela sua maneira própria de desviar-me, propositadamente, da tristeza momentânea que abraçara meu espírito… Sábio animalzinho...

terça-feira, 9 de agosto de 2011

A Warrior Angel

A blue-eyed angel,
With the smile of a child
And the courage of a warrior,
Comes into my life,
Touches my soul
And warms my heart up,
With words of truth
And sights of beauty,
Which were hidden
Inside an insidious chaos.
This angel bestows me
With broad wings
And teaches me
How to fly
High,
Opening horizons
And sending me
Back
To a world,
Where honesty
Is a light
Shining bright
In the middle of
The shadows
Of deceit
And deception.
His wings glow
In the night
Like the beam
Of a lighthouse,
Leading me on
To safety
Throughout the heaviest storm
And the darkest gloom.
His smile brings me
Comfort
Through the days,
Like the welcome
And warm
Embrace of a friend,
Who comes from a long
And distant journey,
Just to say hello.
This blue-eyed angel
Takes my hands
Tenderly
And tells me
A broken heart
Can always be mended,
 As life is not only made of
One-time cheap emotions
Or sad stories,
But of hope
And bravery,
Which keeps us alive
To face the battles
And the tears
That washed
Our souls and eyes
Away.
My burden becomes lighter,
When this angel
Gives me strength
To let my fears
And pain behind
And to move on
-Ahead-
With my spirit and head
Well hung high…

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Stealing Away...


I wish I could
Once again
Hold you in my arms
And with a single kiss
Steal the sorrow
Away
From your distressed soul.
Trust my heart,
My sweet friend,
To soothe your pain
And agony away;
Let your defenses fall apart,
Let yourself surrender
To my embrace,
And forget any resistance,
Once and for all,
As you will find
Relief,
Comfort
And strength
In the unconditional
And sublime devotion
I have,
Since the beginning,
Offered  you.

domingo, 31 de julho de 2011

Teaser...

There must be a key
That opens a door
-Or, at least, a window-
To cross
The threshold
That leads one
Within that heart
Of steel.
There must be a way
Beyond understanding
That melts
This ice cover away
And shows me
I made no mistake
By fighting my fears
To face the unexpected
Pleasure
Of giving pleasure
To the one I cared for.
There must be indulgence
Beyond silence,
Anxiety and pain,
When I look back in time
And see vestiges
Of the teasing
I used to have
From the one
Who left me with
Nothing else than
Charming memories
Of our sweetest
And most cherished 
Moments together.