Às vezes, ele chora… quase em
silêncio, como a chuva fina de Outono, quando os dias são cinzentos e
melancólicos e as noites são escuras, densas e longas demais. Sua tristeza
parece-me tão lancinante e amarga, que deixa-me sem saber o que fazer para tentar
apaziguar aquela dor. Seu olhar fica distante e as lágrimas rolam, silenciosas,
rosto abaixo.
Aquele sofrimento evidente enche
a minha alma de pesar, como se a sua angústia fosse, também, uma melancolia a
pintar minha alma com tons lúgubres e pardacentos. Ouço seu longo suspiro e
entro no quarto, a fingir que preciso de alguma atenção para abrandar qualquer
medo que me pareça coerente naquela hora.
Ele me toma no colo e pede-me
para acalmar. Eu recosto-me sobre seu peito, fecho os olhos e aquieto-me, finalmente.
Ele, então, beija-me a cabeça, com um carinho triste e, mais sereno, abraça-me
com firmeza, como se tentasse assegurar-se que não vou deixá-lo só.
Mal sabe ele que o que faço é uma
tentativa desajeitada de aplacar-lhe aquela aflição, demonstrando uma calculada
dependência ao seu afecto e à segurança e paz que ele me traz.
Algumas outras vezes, entretanto,
seu pranto vem em torrentes, como os temporais de verão, pesados e ruidosos,
que chegam a assustar os corações mais desavisados. Nestas horas, sou eu quem o
abraça, com meus braços pequenos e, que em silêncio, dá-lhe o peito para que
ele chore, sem vergonha e sem receio de parecer, de alguma maneira, ridículo.
Faço-me de forte, para que ele tenha onde se apoiar.
Aquela tormenta é mais cortante.
É um mistério não revelado, na minha incauta mente. Ele tenta controlar-se,
pede-me desculpas e recompõe-se a procurar algo imediato para fazer e
espairecer, tentando aliviar minha preocupação evidente. Finjo que acredito que
está tudo bem, sabendo que nunca saberei a razão daquele momento em que suas
defesas caem todas por terra.
Às vezes, capto um flagrante
dele, quando observa-me a brincar e vejo tão-somente ternura e leveza na
expressão que sua face amadurecida revela, quase sem querer. São naqueles
momentos em que tenho a certeza absoluta que ele me ama. A sua forma de me
olhar demonstra isso claramente... e comove-me sobremaneira.
Quando os trovões me acordam em
sobressalto e eu choro assustado, no meio da noite, ele me acode, senta-se ao
meu lado e, acariciando-me as costas e a cabeça com suas mãos grandes e fortes,
faz-me sentir seguro com sua presença marcante de super-herói. E ele diz-me ao
ouvido, para não ter medo, que ele está ali a proteger-me e pede-me para ter
coragem. Ele deita-se ao meu lado e espera que eu adormeça, finalmente,
sentindo-me o mais afortunado e protegido ser do universo.
À noite, olho as estrelas e a
lua, sentado à janela do meu quarto, pensando nas histórias que ele me conta,
imaginando como pode alguém ter chegado lá em cima, tão distante daqui… e ainda
caminhado naquele imenso deserto de prata…
Ele disse que somos dois
guerreiros – parceiros de luta... sobreviventes… Eu não sei se percebo bem o
sentido das palavras, mas sinto o que ele quer dizer. Nós enfrentamos, juntos,
o sufocante e imenso escuro do quarto, as noites de tempestades, o frio dos
invernos e uma série de novas aventuras na cozinha e no jardim.
Ele é mesmo um grande guerreiro.
Talvez o maior de todos os tempos. Um herói feito de força e pujança, sentimentos
e ternura, com uma alma generosa e gigantesca.
Ele está sempre atento. Respeita
meus limites e minha individualidade e dá-me tempo para explorar e aprender.
Ensinou-me, também, a prezar por todas as coisas e todos os seres, mesmo os
mais pequeninos – que podem ser, também, os mais indefesos. Acho que este homem
conhece o verdadeiro sentido da palavra amor e da responsabilidade que a mesma
traz. Tudo, nele, é bondade e tolerância – especialmente quando se refere a
mim.
E quando me olha, até mesmo
aquele seu olhar triste e sofrido, de quem já enfrentou tantas lutas, com
tantas vitórias e umas tantas derrotas, torna-se completamente afável e
condescendente. É forte e maduro, como todo grande homem deve ser. É também
delicado e vulnerável, como poucos grandes homens conseguem ser, diante de quem
confiam cegamente.
Eu sou apenas uma criança, mas
tenho plena noção que meu pai sabe que, na minha inocência e fragilidade, eu
dou-lhe toda a energia e o apoio que ele precisa, para ser um homem admirável e
um herói magnífico... um verdadeiro Super-Herói.